Diversidade

Cotas para negros em empresas são caminho para inclusão e diversidade

Organizações vêm adotando programas para aumentar número de pessoas negras em seus quadros

O Brasil chega ao Dia Nacional da Consciência Negra com um enorme passivo histórico em relação à população negra. Embora ela represente a maior parte da sociedade brasileira (53,9%), os negros (pretos ou pardos) representam apenas 17,4% da parcela mais rica do país, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

No mundo do trabalho, embora avanços venham ocorrendo, o abismo ainda é grande. No estado de São Paulo, apenas 3,68% dos profissionais contratados para cargos de liderança em 2019 eram negros, de acordo com informações do Caged (Cadastro Geral de Empregado e Desempregados).

O Atlas do Desenvolvimento Humano mostra que no mercado de trabalho formal, o rendimento médio do trabalhador negro é menor: R$ 1,28 mil, valor 42% menor do que o de brancos (R$ 1,82 mil). No quesito educacional, o levantamento aponta que 11% dos negros são analfabetos, enquanto entre os brancos esse índice é de 6%.

Andressa Paz. Crédito: divulgação.

Para Andressa Paz, membro do escritório Aparecido Inácio e Pereira Advogados Associados e pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Mackenzie, a diversidade nas empresas é mínima. Segundo ela, isso acontece porque as vagas de trabalho exigem requisitos que não abrangem a maior parte da população.

Um exemplo disso é a exigência de experiência. De acordo com a especialista, a maioria dos negros pobres e periféricos precisa conciliar o estudo com o trabalho e não possui condições de concorrer a vagas que exigem mais experiência ou que dificultem os estudos por exigirem uma carga horária elevada.

O domínio da língua inglesa também é outro obstáculo. Para Paz, devido ao fato de que a educação pública básica, de maneira geral, é precária e não instrumentaliza os estudantes de forma adequada, torna-se mais difícil que candidatos de baixa renda sejam bem-sucedidos em processos seletivos que exijam o domínio da língua.

“As empresas refletem a realidade da sociedade e não estão à margem”, afirma Lúcia Torres, gestora de carreira que atua há mais de 20 anos com gerência e reorganização de departamentos. Para ela, é preciso criar dentro das companhias lideranças conscientes que possam identificar e lutar contra a discriminação. “É papel delas e do setor de RH serem exemplos”, diz.

“É preciso que haja direcionamento das lideranças e também dos departamentos de Recursos Humanos, que precisam servir de exemplos, selecionando pardos e negros para cargos de direção, além de mulheres e pessoas acima de 40 anos”, defende.

Torres afirma que os colaboradores precisam ter liberdade para denunciar posturas racistas sem medo. Para isso, é necessário que a gestão dê abertura para os funcionários e gere consciência neles.

O papel das cotas

Paz defende a criação de sistemas de cotas para incluir pessoas negras nas organizações. Ela se apoia na decisão do STF que declarou a constitucionalidade da Lei de Cotas (12.990/2014). A legislação determina a reserva de 20% das vagas para negros em concursos públicos para cargos na administração pública federal.

“O princípio da isonomia é amparado pela constituição. Seu significado é tratar igualmente os iguais e desigualmente as situações desiguais. O Brasil ratificou a Convenção Internacional 111 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que tem como proposta a promoção de igualdade contra discriminação em matéria de emprego e ocupação”, destaca.

“Ações ou políticas afirmativas são alternativas temporárias e necessárias adotadas pelo Estado para eliminar as desigualdades historicamente acumuladas por um grupo”, esclarece. Atualmente, essas ações também vêm sendo colocadas em prática pelo setor privado.

Em setembro deste ano, a rede varejista Magazine Luiza decidiu direcionar seu programa de trainees 2021 apenas a candidatos negros. A iniciativa encontrou apoio e críticas nas redes sociais.

Esse tipo de ação, entretanto, tem avançado entre empresas que tentam aumentar o número de executivos pretos e pardos em seu corpo de funcionários. A Bayer também lançou no mesmo mês um programa inédito de trainee com vagas exclusivas para profissionais negros.

Andressa lembra ainda que a inclusão precisa ser completa. “Não é só colocar o negro dentro da empresa, mas é preciso dar suporte para ele com cursos, treinamentos e promover uma política de inclusão efetiva para que ele não seja o único em meio a uma equipe”, reforça. (por Raul Galhardi)

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