Gestão

Habilidades certas

de Regina Giannetti D. Pereira em 2 de junho de 2017

Um estudo realizado pela Universidade de Harvard, nos EUA, mostra que entre 70% e 90% do tempo de trabalho de um líder é dedicado a alguma forma de comunicação. Pensando bem, nem seria preciso citar estatísticas para admitirmos que o líder de uma equipe de trabalho passa a maior parte de seu tempo comunicando-se com alguém, seja na conversa presencial, no telefonema, na reunião, por e-mail ou na apresentação corporativa. Para liderar, é preciso comunicar. Paradoxalmente, os problemas de comunicação estão entre as principais causas dos conflitos entre líder e colaborador, comprometendo o desempenho das equipes. Quantas vezes ouvimos um líder se queixar que o colaborador não compreendeu o que era para fazer – e o colaborador reclamar que não é compreendido pelo chefe? Se formos averiguar, muitos mal-entendidos se originam de briefings vagos, e-mails confusos, feedbacks desastrados ou da dificuldade do líder em ouvir atentamente o que o colaborador tem a lhe dizer, entre outros fatores.

Por isso é que no mundo corporativo de hoje, em que o papel do líder é desenvolver, agregar e influenciar pessoas, o aprimoramento das habilidades de comunicação está na ordem do dia. Afinal, é um mundo de ideias complexas, e trocar essas ideias requer mais atenção, percepção e traquejo do que estamos habituados a usar no cotidiano. Para quem está interessado em ser um líder comunicativo, seguem três habilidades que considero essenciais e dicas para começar a desenvolvê-las.

Escutar de forma ativa
Se você é um líder multitarefa, que assina papéis e checa e-mails enquanto ouve seu colaborador, ou é do tipo adivinho, que no meio da conversa já sabe aonde ele quer chegar, você não está praticando essa habilidade. Escutar ativamente é ouvir com toda atenção, sem julgamento e com a intenção genuína de entender a pessoa que fala. Para começar, evite distrações e interrupções durante conversas importantes: deixe o computador de lado, desvie as chamadas de seu ramal para a secretária e silencie o celular. Essas medidas tão simples permitirão que você fique mais focado na conversa e sinalizarão ao colaborador que você se importa com o que ele tem a dizer.

Conforme o colaborador fala, de tempos em tempos, faça um resumo do que ele disse, usando as mesmas palavras que usou. Algo como: “Deixa ver se entendi. Você está me dizendo que…”. Em coaching, chamamos essa prática de espelhamento; ela permite alinhar o dito com o entendido e cria sintonia entre as pessoas que conversam. Como o propósito da escuta ativa é entender o que o outro pensa, como age ou o que está acontecendo, não deixe que certas informações fiquem vagas ou abstratas. Peça ao colaborador para dar exemplos das situações e lhe contar qual é a atitude que toma, para você saber se cabe uma orientação. Independentemente de ele estar ou não com a razão, procure validar alguma coisa em sua atitude. Se, por exemplo, ele estiver agindo certo, diga algo como “em seu lugar, eu faria a mesma coisa”, o que é um reforço positivo. Porém, se ele estiver agindo inadequadamente, diga que compreende seus motivos, mas será preciso encontrar outra forma de lidar com a situação.

Congruência
É a harmonia entre o que dizemos, demonstramos e fazemos. Um estudo feito por neurolinguistas mostra que, em uma conversa presencial, damos mais crédito ao que nosso interlocutor transmite pela expressão corporal (55%), depois pelo tom de voz (38%) e, por último, pelas palavras (7%). Sendo assim, quando existe congruência, a comunicação é mais eficaz, pois nossa expressão não verbal reforça o que dizemos. Porém, quando o não verbal contradiz nossas palavras, a comunicação não tem o efeito desejado.

Suponhamos que o colaborador esteja contando um problema a seu líder. Este pratica a escuta ativa, mostra-se atento à conversa e não emite julgamento – mas ora franze a testa, ora abana a cabeça para os lados, ora aperta os lábios. Ou seja, embora o líder não esteja dizendo nada, suas expressões são de desaprovação, o que inibe o colaborador a continuar a conversa, e lá se vai a escuta ativa… É natural que nós, como seres humanos, demonstremos nossas emoções por meio da expressão corporal e do tom de voz. Quando elas enfatizam a mensagem que desejamos transmitir, ótimo, vamos demonstrá-las abertamente. Mas quando não servem aos nossos objetivos, como no exemplo acima, precisamos ser capazes de disfarçá-las.

A congruência tem ainda outra dimensão que é a do discurso e da prática, ou seja, entre o que se diz e o que se faz. De nada adianta um líder pregar valores elevados, orientar os colaboradores a fazer determinadas coisas e cobrar-lhes certas atitudes quando ele próprio não faz nada disso. Afinal, se as palavras têm um peso de apenas 7% na comunicação, o que é mais poderoso: discurso ou prática? O líder deve zelar pela congruência entre o que fala e faz, pois comunica muito mais eficazmente pelos exemplos que dá aos colaboradores.

Desconstrução
Desconstruir palavras é traduzi-las em ações observáveis, de modo que o outro entenda o que temos em mente. O significado de uma palavra é algo que cada pessoa constrói a partir de suas experiências de vida. Peça para 10 pessoas escreverem uma relação de palavras que associam à palavra “casa” e você terá listas completamente diferentes, com itens que se repetem em várias listas, enquanto outros só aparecem uma vez. Por exemplo, algumas pessoas associam casa à família; uma associa a anão de jardim, outra à hipoteca, outra à alvenaria e assim por diante. Conclusão: os significados da palavra casa variam de pessoa para pessoa. Agora, se variações de significado acontecem até com uma palavra concreta e universal como casa, imagine o que ocorre com palavras abstratas como paradigma, sinérgico, sustentabilidade, redirecionar, transparência e outras tantas que circulam no meio corporativo. Esses são exemplos de palavras grávidas de significados, que cada um entende à sua maneira, e é das diferenças de significados que surgem muitos problemas de comunicação nas empresas.

Eis que então o líder diz ao colaborador para ser mais proativo no atendimento a um cliente. O que ele tem em mente é que o colaborador antecipe os problemas que o cliente pode ter e planeje o que irá fazer caso os problemas ocorram, de modo a solucioná-los prontamente. O colaborador, por sua vez, entende que ser proativo é ser rápido e dinâmico; continuará a ser pego de surpresa quando os problemas acontecerem porque não os antecipou, mas tentará resolvê-los da forma mais rápida possível…

Assim, para garantir que o colaborador entenda o que se espera dele, o líder deve desconstruir o significado das palavras, traduzindo-a em ações observáveis. A fórmula da desconstrução é dizer “o que uma pessoa X faz” ou “X é fazer o quê”, sendo X a palavra que se quer desconstruir. No exemplo acima, a fala do líder ficaria assim: “Fulano, você precisa ser mais proativo no atendimento a esse cliente. A pessoa proativa antecipa os problemas que podem acontecer e planeja o que irá fazer caso os problemas ocorram”. Pronto, agora o liderado sabe o que se espera que ele faça! Para completar, o chefe pede que o colaborador lhe diga como fará para ser proativo no atendimento àquele cliente, para certificar-se de que a instrução foi bem compreendida.

Praticando a escuta ativa, a congruência e a desconstrução, o líder poderá experimentar uma sensível melhora na qualidade de sua comunicação. É bem verdade que há outras habilidades e que, para desenvolvê-las, o líder deve estar consciente de seu papel como facilitador do desempenho de sua equipe. De qualquer forma, saber ouvir, saber dizer claramente o que quer e manter a congruência entre palavras e ações são um excelente começo.

Regina Giannetti D. Pereira é coach e educadora corporativa com foco em liderança, comunicação e inteligência emocional. Dirige a Atingir Coaching e Treinamentos

 

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