Fernanda, da Multirede: captar os jovens talentos e treinálos para serem os líderes do futuro |
Uma estruturação interna fez a Multirede, empresa de médio porte de soluções integradas em networking, consultoria e treinamento em tecnologia, dobrar o volume de negócios em 2010. Com o crescimento acelerado e previsões otimistas, a companhia precisou ampliar o quadro de funcionários que hoje conta com 130 pessoas. Para tanto, evitou apenas suprir as necessidades imediatas e, pensando no futuro, estruturou um programa de trainee em sua unidade do Rio de Janeiro e um de estágio em São Paulo. A ideia, de acordo com Fernanda Domiciano, uma das responsáveis pela área de recursos humanos da organização, é captar os jovens talentos e treiná-los para serem os líderes do futuro. A empresa não é a única a pensar dessa forma. Com a estabilidade econômica, pequenas e médias companhias ganham mais espaço e estão ávidas para chegar a outro patamar. Preparando-se para aproveitar as oportunidades que surgem, elas perceberam a importância de formar um quadro composto por profissionais formados dentro de casa. “Elas estão preocupadas em ter pessoas que assumam a gestão das organizações e sabem que se não investirem agora, ficarão sem líderes no futuro”, explica Manoela Costa, gerente da Page Talent, unidade especializada na estruturação de processos de estágios e trainees da Page Personnel, empresa de recrutamento. A especialista explica que a preocupação é fruto do cenário atual, no qual as empresas brigam por talento pelo fato de não terem investido em seus quadros antes de crescerem. A questão é que elas foram surpreendidas pela nova dinâmica do mercado. “As pequenas empresas estão tendo um ritmo de crescimento para o qual não estavam preparadas”, avalia Sandra Cabral, diretora de desenvolvimento da DMRH, consultoria de RH especializada em seleção e retenção de talentos.
Com o crescimento rápido, as empresas aceleram a evolução dos seus funcionários, promovendo-os cada vez mais rapidamente. “A fila tem de andar, mas não tem gente o suficiente para que isso aconteça”, afirma Sandra. Diante desse cenário, empresas veem no estágio e no trainee a solução dos seus problemas futuros. Para se ter ideia da importância que o tema ganhou, das 5 mil empresas que recorreram ao Núcleo Brasileiro de Estágios (Nube) nos últimos 13 anos para formatar a seleção de estudantes, 66% são de micro e pequeno portes, 26% são médias e as grandes somam 8% das negociações. “A empresa molda o jovem, forma seus futuros gestores e o ciclo se fecha”, afirma Eduardo Oliveira, superintendente de operações do Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee). A preocupação com o direcionamento dos negócios fez com que as companhias mudassem até o modo como enxergam os estudantes, acredita Oliveira. “Uma parcela do empresariado via o estagiário como mão de obra barata. Mas o estágio é uma atividade educacional e a maioria das empresas sabe disso hoje”, afirma.
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Estruturando um programa
Entre contratar estudantes conforme as necessidades da empresa e promover um programa de estágio e de trainee há um longo caminho a percorrer e diferenças de objetivos a serem observadas. Empresas que apenas contratam sob demanda estão interessadas no agora e, normalmente, não conseguem reter os estudantes por muito tempo, porque não apresentam a eles possibilidades futuras. As que pensam em programas estruturados também estão preocupadas com o agora, mas principalmente com o futuro. Analisar o negócio e projetar metas de médio e longo prazos são os primeiros passos para ter um programa de sucesso e eficiente. E esses objetivos devem estar alinhados com a estrutura da companhia. “São vários os sinais que mostram para as empresas quando elas têm de estruturar um programa”, avalia Carlos Da Costa, CEO do Institute of Performance and Leadership (IPL). Crescimento rápido é o principal deles.
Com os planos da empresa em mãos, é preciso preparar os departamentos, arrumar a casa e analisar qual perfil corresponde a essas metas – estagiário ou trainee. A escolha pela linha a ser seguida será definida pelo ritmo ditado pela empresa para atingir as metas. “Se ela pode esperar, o estágio é a melhor opção porque não haverá tanto conflito interno, como ocorre com o trainee”, afirma Sandra, da DMRH. Um trainee, diz, envolve mais investimento e mobiliza mais a empresa. E a própria proposta, de crescimento mais acelerado, gera impacto entre outros funcionários. O tamanho da empresa deve ser levado em conta, afinal, segundo os especialistas é preciso ter um mínimo de escala. “Não faz sentido fazer um programa para contratar dois ou três trainees”, avalia Da Costa. Investimentos e tempo a serem despendidos com o detalhamento do programa, que deve ser feito junto aos gestores, explicam o cuidado com o tamanho. O custo pode variar de 100 mil reais a 1 milhão de reais, segundo Sandra. “O número de estudantes vai depender do tamanho da empresa, mas é melhor começar pequeno e não ultrapassar os oito ou dez trainees. Isso porque para cada um é preciso um gestor engajado. Se começar a envolver muita gente pode haver um desalinhamento”, afirma. A Multirede começou com dez trainees no Rio de Janeiro e dez estagiários em São Paulo. “Até o momento, o investimento com a área de desenvolvimento soma 130 mil reais. Esse custo refere-se ao plano de capacitação [cursos dentro da grade proposta]”, explica Fernanda, da área de RH da companhia. O esqueleto do programa dará o norte para que os executivos tracem estratégias de atração dos jovens. “Esses programas devem estar ligados aos valores da empresa”, analisa Sandra. Nessa fase, algumas perguntas devem ser feitas: qual é o objetivo desse programa? O que ele vai agregar para a empresa? O que ela quer do estudante? O que ela precisa deles? O que vai oferecer a eles? Junto Í s respostas, os executivos envolvidos devem traçar o perfil de quem eles querem.
Concorrendo com as grandes
No laboratório Zambon, da área farmacêutica, o maior investimento na estruturação do programa foi em tempo. “O trabalho todo foi feito por nós e envolveu os diretores da empresa e toda a área de RH”, conta Talita Cordeiro, gerente do setor. O resultado foi a criação de um programa de estágio rotativo, pelo qual já passaram cinco estudantes. O tamanho mais enxuto, diz Talita, está relacionado ao tamanho e ao objetivo da empresa, que é acompanhar os estudantes de perto, verificar as potencialidades de cada um para traçar estratégias de desenvolvimento mais individuais. O formato rotativo, explica, por outro lado, é ferramenta para concorrer com as grandes empresas, que já têm know-how nessa empreitada e acabam chamando mais a atenção dos jovens. “É difícil concorrer com as grandes. Não temos um nome conhecido entre os estudantes. Então, é uma maneira de atrair quem quer se desenvolver”, explica a executiva.
Mercado competitivo
Competir com grandes companhias pelos melhores estudantes é uma das principais preocupações dos pequenos empresários. Em um mercado competitivo, um nome forte, programa atraente e boa remuneração são os elementos que faltam a eles. “A pequena empresa não pode estar muito fora do que o mercado está oferecendo, mas ela precisa focar o desenvolvimento em vez de ela ter uma política agressiva de remuneração”, recomenda Manoela Costa, da Page Talent. Focar o desenvolvimento significa dar aos estudantes o que eles querem. “Oportunidade de ascensão de carreira mais acelerada e participação nos processos decisórios são os diferenciais”, atesta Eduardo Oliveira, do Ciee. A escolha do estudante também contribui para que as ferramentas disponíveis sejam atraentes. “O perfil do aluno determina a escolha dele. O jovem que quer uma multinacional não vai para uma pequena empresa. Se ele quer um desafio técnico, a pequena pode lhe possibilitar isso”, acredita Luiz Rubião, presidente da Radix, empresa de engenharia e tecnologia. A companhia começa agora a estruturar seu programa de estágio. A estratégia inicial é aproximar-se dos estudantes e “entrar na cabeça deles”. Para isso, a Radix tem parceria com universidades para promover eventos. “Vimos que quando entramos no mundo deles, a coisa flui com certa facilidade. É um trabalho de formiguinha”, afirma Rubião. E um trabalho cuidadoso requer tempo e paciência, dois atributos que muitas empresas esquecem e que podem colocar em risco tudo o que investiram ao longo do processo. “Querer resultados imediatos atrapalha”, ressalta Oliveira. “O principal erro é não se preocupar com a repercussão do futuro e se preocupar apenas em tapar buracos”, completa Manoela Costa. Ao deixar a pressa de lado e evitar modelos prontos, as empresas atraem o perfil certo para suas necessidades. “Desde que a companhia é criada existe a pretensão de expandi-la. Por isso, é interessante ter alguém do mundo acadêmico trazendo novas ideias e agregando conhecimentos. Quem começa assim já começa bem”, analisa.
Pontos básicos | |
Como estruturar um programa de trainee ou estágio |
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