Em um mercado competitivo como nunca, a palavra de ordem no mundo corporativo é liderança: as companhias estão cada vez mais atentas à formação de líderes do presente e do futuro, capazes de enxergar o negócio de forma holística e com talento para gestão de pessoas. Para auxiliá-las nessa tarefa, muitas empresas têm recorrido a cursos de MBA. Um exemplo é a Gonow, consultoria e especialista em outsourcing em tecnologia. No plano estratégico de gestão de pessoas da empresa, sob o comando do seu novo diretor de recursos humanos, Benedito Pontes, no cargo há cerca de dois meses, a Gonow pretende garantir a formação das pessoas antes que assumam cargos de liderança, além de treinar os que já estão nessas posições. O executivo conta que as grandes empresas têm processos de formação “fantásticos”, enquanto nas pequenas e médias empresas as pessoas com boa formação técnica são colocadas em cargos de liderança sem a formação necessária em gestão de pessoas. “E normalmente, depois, as empresas correm atrás do prejuízo”, diz.
Para preparar e capacitar os futuros e atuais líderes, a Gonow aposta que o principal caminho será incentivar a participação em MBAs e cursos de curta duração. “Vamos pagar uma grande parte dessa formação, inclusive porque funciona como retenção dos talentos”, diz. Cerca de 30 pessoas da empresa, que tem 150 colaboradores, devem ser beneficiadas com o projeto. Na visão de Pontes, a grande vantagem desses cursos é a convivência com colegas e professores de outros setores, além do aprendizado formal de outras áreas do conhecimento, como marketing, finanças, RH e gestão de pessoas. Outro benefício é a convivência com alunos de diferentes idades, o que melhora o relacionamento entre diferentes gerações dentro da empresa. Quem também incentiva a participação de funcionários em programas de MBA é a rede MegaMatte. A gerente de recursos humanos Julyana Felicia conta que a rede de relacionamentos é o mais importante nesse tipo de curso, uma vez que permite a troca de experiências e o aprendizado sobre situações difíceis com clientes e fornecedores. “Esse tipo de curso abre portas dentro e fora da empresa”, avalia.
Mercado doméstico
Diante da necessidade de cuidar dos currículos atuais e, sobretudo, traçar o caminho da futura liderança, muitas escolas de negócios têm adaptado seus cursos de MBA a essa demanda. Enquanto algumas instituições, como a FGV, partiram para a criação de um curso focado nesse público (no caso da fundação trata-se do High Potential Leader), outras têm promovido mudanças nas grades curriculares, nas dinâmicas das aulas e até mesmo nas avaliações dos alunos para entregar ao mercado líderes competentes e não apenas gestores. O aquecimento do mercado doméstico foi um dos responsáveis por essa mudança, pois provocou uma disputa por talentos. Nesse cenário, a retenção de bons profissionais virou uma grande preocupação das empresas. “Como o gestor é muitas vezes visto como motivo para o colaborador ficar ou deixar a empresa, surgiu a necessidade de transformar esse gestor em um líder inspirador”, afirma Carlos Longo, diretor executivo da HSM Educação.
O choque de gerações provocado pelo aumento da expectativa de vida é outro agente dessa transformação, pois hoje é preciso lidar com trabalhadores de gerações e velocidades distintas. “O paradigma da hierarquia e da gestão por poder mudou com a geração Y”, diz. Todas essas mudanças já se traduzem em inovações nos cursos de MBA. O diretor da HSM conta que a instituição substituiu a monografia do trabalho de conclusão de curso por um estudo de caso. Antes, o aluno fazia uma pesquisa acadêmica, mas agora o projeto trata de um caso real, muitas vezes da empresa em que trabalha. Com isso, o estudante tem uma visão mais holística, pois precisa analisar a gestão, o marketing, os resultados financeiros e a liderança da companhia. Segundo Longo, a HSM tem uma metodologia centrada no aluno, que precisa discutir casos, liderar e ser liderado durante as aulas. “Assim ele desenvolve competências do líder moderno, que não ganha pela autoridade, mas por saber ouvir e convencer os seus seguidores”, explica. Outra característica importante desse profissional, de acordo com o diretor, é conhecer diferentes áreas da empresa, como tecnologia, tributação e contratos, pois assim ele poderá definir boas estratégias e negociar com fornecedores e clientes. “O mercado está mais generalista e dinâmico.” O Grupo Ibmec tem feito várias mudanças nos seus cursos de MBA desde 2009, quando começou o processo de certificação pela Association of MBAs, associação global da área.
O diretor de negócios do Grupo Ibmec Educacional no Rio de Janeiro, José Luiz Trinta, conta que os cursos eram mais concentrados em matérias densas e específicas, formando gestores com conhecimento técnico. Agora, existe maior preocupação em formar diretores e presidentes de empresas. “O curso deixou de ser focado na parte técnica para trabalhar questões mais amplas, como disciplinas comportamentais de liderança e responsabilidade social”, afirma. A avaliação na Ibmec é feita pelo grupo de alunos, em uma avaliação 360 graus feita nos moldes do que ocorre nas grandes empresas. Para isso, a instituição desenvolveu um software que cruza as notas dadas pelos colegas. Em seguida, o professor faz uma análise dos resultados e entrega para o aluno avaliado. A escola também modificou o tipo de experiência internacional proporcionada aos seus alunos. No passado, o estudante do MBA passava seis meses a um ano estudando em instituições parceiras nos EUA ou na Europa. No entanto, o Ibmec percebeu que os alunos queriam experiências mais curtas e votadas para a vida prática. No ano passado, a escola iniciou uma parceria com a universidade de empreendedorismo norte-americana Babson College, em Boston. Agora, o aluno passa uma a duas semanas participando de cursos, palestras e dinâmicas. “Ele não vai mais para ler livro e fazer avaliações, mas para ser um líder e se colocar à prova”, explica Trinta. O diretor conta que uma das atividades é convencer um empreendedor milionário a comprar um produto em um a três minutos. No momento, o Ibmec procura outras instituições internacionais para fazer parcerias desse tipo, focados mais no lado comportamental do que em teoria.
O aprendizado em áreas que vão além da especialidade do aluno também é uma preocupação da faculdade de tecnologia Fiap. O diretor acadêmico do centro de pós-graduação da escola, Francisco Amaral, acredita que o papel do líder de TI não é apenas sistematizar ou automatizar tarefas, mas criar novos modelos de negócio e ajudar a empresa a se diferenciar pela implementação de novos processos e tecnologia. “O gestor de TI deve ser um agente de mudança e não vítima dela”, diz. Para atender a essa necessidade, a Fiap incluiu nos cursos de MBA disciplinas de gestão ligadas a estratégia e inovação. Na opinião do diretor, os alunos procuram esse tipo de curso justamente para ter uma visão mais estratégica do negócio. Por isso, os estudantes vibram mais pela prática do que pela teoria durante as aulas. “Temos incentivado os professores a usarem mais cases, situações reais e filmes, além de trazer executivos de empresas para fazer palestras. Tudo para conectar o curso com a realidade.” A escola também procura estimular os alunos a trabalhar de forma colaborativa. Um exemplo foi a construção de uma torre Eiffel com palitos de fósforo, em que cada parte era construída por um grupo diferente. No final, as turmas se uniram para conectar as partes. Por serem pessoas mais introspectivas, os alunos de TI também aprendem técnicas de apresentação, gestão de pessoas e gestão de mudança. A ideia é mostrar que só a tecnologia não resolve os problemas de um líder da área. No momento, a faculdade está buscando parcerias com universidades norte-americanas interessadas em conhecer o Brasil e outras economias emergentes. O objetivo é preparar os alunos para trabalhar de forma globalizada e colaborativa.
A mudança que ocorre a olhos vistos nos MBAs brasileiros acompanha uma tendência mundial. O diretor-geral da Fundação Instituto de Administração (FIA), Maurício Queiroz, conta que escolas dos EUA e da Europa têm tido maior interesse em viagens e projetos de alunos com empresas de países emergentes, como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. “Existe maior preocupação em entender a realidade das empresas que atuam nesses mercados”, conta. Também existe um apetite crescente por discussões sobre ética e gestão de riscos, especialmente após a crise financeira que assolou os EUA. Temas como responsabilidade social e ambiental também estão mais presentes nas estruturas curriculares, segundo Queiroz. Ele conta que a FIA também tem a preocupação de incorporar a responsabilidade social, ambiental e ética nos seus cursos de MBA. “Muito se fala sobre a corrupção no governo, mas por outro lado existe o corruptor”, afirma, destacando que ainda existem muitas melhorias a ocorrer no mundo corporativo. Na FIA, a ética já fazia parte do currículo de MBA, mas nos últimos cinco anos a responsabilidade social e ambiental passou a fazer parte de vários cursos.
Cuidados na escolha
Apesar das inegáveis vantagens de fazer cursos deste tipo, os especialistas alertam para os riscos que existem nesta escolha. Além dos tradicionais MBAs que seguem os padrões internacionais, existem muitas pós-graduações que levam o mesmo nome sem alcançar esse nível, que prevê o mínimo de 500 horas de aula e disciplinas sobre negócios, como estratégia, marketing, operações e finanças. Outro critério é o aluno ter experiência executiva. O coordenador dos programas de MBA Executivo do Insper, Silvio Laban, afirma que existe uma confusão muito grande no mercado, o que dificulta uma tomada de decisão consciente por parte dos alunos. “Muitas vezes, o nome do curso não traduz a realidade e cria confusão no mercado”, diz. Antes de decidir, vale observar se a instituição é associada à associação nacional Anamba ou à associação internacional, além de avaliar rankings de MBAs e conversar com ex-alunos da instituição em que se pretende estudar.