Já diria o filósofo grego Heráclito: “nada é permanente, exceto a mudança”. Essa máxima continua tão verdadeira hoje quanto na Grécia Antiga, especialmente para as organizações que desejam se manter competitivas. Em um mundo onde a concorrência é esmagadora, mudanças são o preço da relevância. Toda organização que deseja crescer precisa se adaptar às exigências do mercado e evoluir, seja ajustando sua cultura, renovando o visual ou até redefinindo seu posicionamento. Mas como garantir que os colaboradores enxerguem essas transformações como uma evolução natural, e não como uma ruptura com a narrativa institucional? É diante das mudanças que a comunicação interna bilha ao tornar as transições corporativas mais humanas e menos desgastantes, assegurando a conexão do público interno com o propósito e os valores da empresa em todas as etapas.
Imagine uma organização centenária que, em meio a uma grande mudança de rota, compartilha uma antiga carta assinada por um de seus fundadores, repleta de trechos marcantes sobre os valores que sustentam a empresa até hoje. Essa ação, aparentemente simples, carrega um impacto poderoso: além reforçar o legado da empresa durante a transição, demonstra como a memória organizacional é capaz de conectar passado e futuro de forma estratégica e sensível.
Como destaquei na matéria “Conectando histórias, valores e propósito”, resgatar histórias não é apenas inspirador, mas indispensável para uma evolução cultural bem-sucedida. Mas aqui vale um alerta: iniciativas assim só têm impacto real quando estão alinhadas a um plano estratégico de comunicação que garanta clareza e engajamento ao longo de todo o processo.
Evoluir é um desafio sem fim
A bem da verdade, mudanças demandam mais do que logotipos novos, discursos reformulados, novas cores no uniforme ou um mascote virtual repaginado. Seja qual for a transformação, é fundamental que os colaboradores entendam o motivo por trás dela e o impacto que terá em suas rotinas e na organização como um todo. Essa compreensão, que só uma comunicação interna bem estruturada pode proporcionar, é o que transforma as mudanças de um incômodo inevitável para uma transição compreensível.
Sem dúvida, evoluir faz parte do negócio – significa repensar processos e inovar, algo necessário para a sobrevivência em um mercado em constante transformação. A cada nova demanda, as organizações precisam se adaptar para continuar relevantes, mas a frequência e a velocidade das mudanças tornam esse processo cada vez mais desafiador.
Exemplos de resiliência
No entanto, poucas podem dizer que enfrentaram tantas transformações quanto o Grupo Marista, conhecido por sua atuação em hospitais e escolas. Com mais de 200 anos de história, a instituição enfrentou adaptações culturais, reposicionamentos estratégicos e ajustes de rota, mas sempre mantendo intacto o propósito de servir com empatia e comprometimento. O segredo, se é que podemos falar em fórmula mágica, está em equilibrar a inovação com o legado que carrega desde 1817.
Da mesma forma, a Porto – holding brasileira fundada em 1945 – tem mostrado ao longo de oito décadas como é possível inovar sem abandonar a tradição. Seu maior símbolo, o barco à vela, foi remodelado recentemente para representar essa transformação que culminou na criação de quatro verticais, especializadas em seguros, saúde, finanças e serviços. A Porto Seguro virou Porto, mas sem perder de vista sua essência – ser um porto seguro para as pessoas. Para Patrícia Coimbra, diretora de Gente e Cultura da empresa, esse equilíbrio é crucial. “Ao longo do tempo, evoluímos mantendo nossos valores centrais. Mudanças fazem parte da trajetória e são importantes para garantir que continuemos relevantes para os nossos 18 milhões de clientes, 14 mil colaboradores e 37 mil corretores parceiros. No entanto, toda transformação precisa ser conduzida com respeito à nossa identidade e mantendo viva a cultura do cuidado.”
E tudo isso só foi possível porque a comunicação interna da Porto priorizou a personalização e antecipação de informações – reconhecendo que cada colaborador vivencia as mudanças de maneira única. “Personalizamos as informações de acordo com os públicos, priorizando sempre a antecipação da informação para as pessoas mais impactadas ou envolvidas no processo”, explica Patrícia. A cada etapa, os colaboradores tinham a certeza de que a essência da marca permanecia intacta. Até o EVP (Employee Value Proposition), com o mote “Na Porto, você importa”, foi mais uma peça-chave para reforçar o compromisso bem-estar e aprendizado, mostrando que a cultura da Porto estava evoluindo com respeito a quem faz parte dessa história. A mensagem que ficou é poderosa: as mudanças não apagam a história.
O papel da comunicação interna nas mudanças
Segundo Anne Maezuka, gerente de Comunicação do Grupo Marista, essa habilidade de evoluir sem romper com os valores fundamentais da empresa é o que sustenta sua continuidade. “Toda mudança foi fundamentada nos valores e virtudes estipulados na fundação da instituição, demonstrando que o novo é uma extensão coerente da missão original”, explicou. No Grupo Marista, um exemplo é a “Jornada de Evolução Cultural”, uma ação estratégica que combina capacitações e campanhas de comunicação interna para apresentar as mudanças como uma continuidade de seu propósito, sempre com clareza e consistência.
A campanha de rebranding do Hospital São Marcelino Champagnat ilustra bem essa abordagem. A inclusão do título “São” reforçou raízes históricas e a unicidade da marca, enquanto a comunicação interna desempenhou um papel crucial no engajamento dos colaboradores. “Desde o início, ele foram envolvidos no processo, entendendo as competências e comportamentos necessários para esse novo momento. Isso não apenas trouxe clareza sobre o propósito das mudanças, mas também criou um forte senso de pertencimento”, destaca Anne.
Ao integrar legado, símbolos históricos como os Irmãos Maristas, ações gamificadas, influenciadores internos e uma linguagem emocional e consistente, o grupo construiu uma base sólida para que os colaboradores percebessem as mudanças como um reflexo natural dos novos tempos. Segundo Anne, uma rede de apoio foi criada para sustentar a nova cultura organizacional, promovendo uma conexão profunda entre passado e presente. “Ao posicionar a inovação como uma extensão natural do legado, a mensagem ganha mais legitimidade e é capaz de construir pontes”, reflete a executiva.
A força da comunicação multicanal
Muitas vezes, comunicar mudanças com clareza e consistência é tão estratégico quanto implementá-las de forma eficiente. É isso que diferencia as organizações que transformam transições em oportunidades de engajamento daquelas que acabam enfrentando algum tipo de resistência. Na Porto, por exemplo, a resposta para esse dilema está na comunicação interna e sua habilidade de traduzir as mudanças as mudanças em mensagens que conectam os colaboradores ao propósito da empresa. “Acreditamos que a chave para isso está na transparência e no envolvimento ativo dos colaboradores em cada etapa do processo. Mudanças fazem parte do crescimento de qualquer companhia, mas, quando bem comunicadas, elas não geram desconexão – pelo contrário, fortalecem ainda mais a cultura e o cuidado”, explica Patrícia Coimbra.
Para atingir esse objetivo, a Porto investe em uma comunicação multicanal que inclui intranet, newsletters, TV corporativa, encontros com lideranças e eventos internos. A ideia é levar as informações de forma clara e acessível, utilizando diferentes formatos para alcançar todos os públicos. Mas não é só sobre informar – é também sobre ouvir. “Criamos também espaços de escuta ativa com colaboradores e lideranças de todos os níveis, em que promovemos conversas abertas sobre os desafios e as oportunidades. Isso ajuda a reduzir ruídos e garantir que todos se sintam pertencentes”, destaca a executiva.
Quando a Porto remodelou seu barco à vela – símbolo da empresa há décadas – para representar os novos tempos, ela também fez questão de reforçar seu compromisso com o passado. É essa mesma coerência entre cultura e história que mantém a identidade da organização intacta em meio às transformações e se tornar um diferencial estratégico. Para Patrícia, mudanças só fazem sentido quando seguem uma lógica evolutiva. “Quando as pessoas estão conscientes do que move essas mudanças, é muito mais natural para todos as compreenderem e se sentirem agentes de transformação por meio delas”, analisa.
Resistência ou oportunidade?
Entretanto, mesmo quando há transparência, as mudanças podem não ser recebidas com entusiasmo pelos colaboradores, especialmente em organizações mais tradicionais – e aqui, mesmo com uma comunicação interna competente, os desafios podem ser significativos. Resistências culturais surgem como um reflexo natural do apego ao que é familiar. É como vestir o mesmo uniforme por anos e, de repente, ele mudar de cor. Não seria surpreendente ouvir comentários como “A tradição está desbotando”, como se uma simples mudança estética fosse suficiente para diluir os valores organizacionais.
Mas, como explica Anne Maezuka, essa resistência ao novo não precisa, necessariamente, se tornar um obstáculo. Conflitos emocionais são comuns e têm a ver com a insegurança que as mudanças geram sobre o futuro. “Muitas vezes, a resistência reflete o desejo de preservar a essência da organização, e isso pode ser usado para direcionar as mensagens.” Com diálogo e empatia, é possível transformar resistências em oportunidades para engajamento coletivo, fortalecendo ainda mais o vínculo com o propósito da empresa.
E para garantir que as mudanças sejam bem-vindas, a comunicação interna precisa agir estrategicamente, superando inseguranças e corrigindo informações equivocadas. É essencial monitorar canais internos, mapear dúvidas e compreender as preocupações que alimentam esses receios. Além disso, ferramentas de cocriação – como workshops, pesquisas e fóruns abertos – também fazem toda a diferença, pois permitem que os colaboradores participem do processo e contribuam ativamente. “Isso não só valida as mudanças, mas também os transforma em defensores das iniciativas”, reforça Anne.
Incluindo as pessoas na narrativa
Em outras palavras, fica claro – mais uma vez – que comunicação é uma via de mão dupla, em que escutar é tão importante quanto comunicar. Na Porto, isso significa criar espaços onde vozes diversas se encontram e novas ideias ganham vida. “Uma identidade organizacional forte é construída de forma colaborativa.
Para isso, investimos em iniciativas que promovem a troca de conhecimento e a inclusão de diferentes perfis dentro da empresa”, explica a diretora de Gente e Cultura, destacando a mentoria reversa como exemplo, em que profissionais mais jovens compartilham suas perspectivas e experiências com executivos e lideranças. Além disso, os diversos grupos de afinidade da Porto garantem que essas vozes façam parte da narrativa institucional, promovendo a diversidade, a inclusão e o fortalecimento da cultura.
Storytelling
Se uma boa história conecta pessoas, no ambiente corporativo ela também pode conectar gerações. O storytelling, uma ferramenta indispensável na comunicação interna, foi essencial para humanizar as mudanças vividas pelo Grupo Marista, como bem destaca Anne Maezuka. “Relatos emocionantes, como as vivências dos líderes nos locais originários da história da organização, reforçaram a conexão emocional com o propósito e o legado.” Segundo a gerente de Comunicação, essas narrativas não só engajam, mas ajudam a construir uma ponte entre o que a organização foi e o que ela aspira ser. “Ao carregar elementos do legado e trazer à tona histórias reais, ele reforça o senso de pertencimento e humaniza a transição
No caso do Marista, os relatos autênticos de fundadores, colaboradores, estudantes e pacientes mostraram, de maneira sensível e prática, que valores como ética e solidariedade continuam inabaláveis. Ao colocá-los como protagonistas desse processo, a comunicação interna foi além de apenas informar, gerando confiança no futuro e maior identificação com a organização – mesmo diante das mudanças. “Boas histórias têm esse poder: elas não apenas explicam, mas envolvem e inspiram, mostrando que o que define a organização permanece constante”, afirma Anne. A memória organizacional, aqui, é um recurso vivo, capaz de guiar as transições com empatia e sensibilidade.
A importância de formar líderes
No meio disso tudo, é claro que nenhuma mudança acontece sozinha. A comunicação interna pode até pavimentar o caminho, mas, sem lideranças que inspirem e guiem os colaboradores durante as transformações, a resistência ao novo tem mais chances de prevalecer. No Grupo Marista, a formação de lideranças foi fundamental para garantir que as transformações culturais estivessem, de fato, alinhadas aos valores históricos da organização. Anne Maezuka destaca o impacto do Programa Liderança Profética e Servidora, que capacitou mais de 400 líderes a enfrentar desafios contemporâneos sem perder de vista os ensinamentos de Marcelino Champagnat, fundador do grupo. “Essa iniciativa gerou uma transformação significativa na cultura organizacional, fortalecendo a conexão entre líderes e colaboradores.”
Já na Porto, essa lógica se reflete na criação de canais que conectam líderes e colaboradores de forma próxima e constante. “Boas histórias conectam pessoas e resgatam o senso de pertencimento, por isso incentivamos nossos líderes a manterem um diálogo próximo com os colaboradores”, afirma Patrícia Coimbra. A troca de experiências é estimulada por iniciativas como o “Café com Líderes”, fórum mensal onde lideranças alinham expectativas e compartilham desafios, e o “Bate-Papo com o CEO”, que ocorre trimestralmente para apresentar resultados e discutir estratégias. Lives mensais também garantem um canal aberto entre o CEO e a equipe, enquanto a Carta de Navegação, informativo semanal assinado pelo CEO, mantém todos atualizados sobre os rumos da empresa.
Mais do que transmitir informações, essas iniciativas mostram que liderar é sobre inspirar, escutar e construir confiança. E é aqui que a comunicação interna assume seu papel indispensável na gestão das mudanças: conectar estratégias a pessoas, traduzir propósitos em ações e transformar desafios em oportunidades. Só assim as organizações evoluem coletivamente.
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