Sexta-feira, 9h30 da manhã. Valentina sabe que há uma restrição crítica de estoque e, com agilidade, elabora um plano de ação alinhado às prioridades da empresa. Mas o Sr. Edson centraliza as decisões, embora seja um profissional experiente, referência neste tipo de análise e filtro final das decisões críticas.
Valentina envia a proposta para aprovação por e-mail às 11h30. Nenhuma resposta. O limite será às 14h00, mas o plano está parado, e com ele, o dia de Valentina. Às 12h20 ela recorre à sua líder, Mariana.
Em home office, Mariana visualiza a mensagem. Imediatamente silencia sua videoconferência, fecha a câmera e liga para o Sr. Edson. O Sr. Edson escuta o relato de Mariana sem entender o motivo de Valentina não ir diretamente a ele comunicar pessoalmente a urgência e solicitar a aprovação. Afinal, ele está apenas um andar acima de Valentina.
Às 12h32, a resposta: “Ok”. Plano aprovado. Sem ajustes. Sem feedback.
Mariana se pergunta se esse modelo é sustentável: sua colaboradora aguardou por mais de 3 horas uma resposta eletrônica que, se fosse pessoalmente, não demoraria tanto. O Sr. Edson, por sua vez, volta à sua rotina, sem notar que sua ausência digital foi sentida como mais uma ocorrência estressante em um time com altos índices de ansiedade e desgaste emocional produzidos por excesso de trabalho e falta de feedback.
O episódio de Valentina não é isolado. Reflete ruídos causados por diferenças de estilo, expectativas e ferramentas entre gerações. Enquanto os mais jovens priorizam agilidade digital, os mais velhos ainda valorizam a comunicação direta e presencial. A falta de alinhamento — e de escuta — gera frustração, estresse e ineficiência.
Torre de Babel comunicacional
Em uma sala, física ou virtual, um Baby Boomer discute estratégia e troca olhares com o time, um Geração X busca eficiência objetiva em tópicos de e-mail, um Millennial colabora via chat esperando feedback rápido, e um Geração Z obtém insights para o projeto assistindo a um vídeo curto. Bem-vindo ao escritório, ou metaverso corporativo, no qual se espera eficiência, modernidade e um ambiente vibrante, com equipes em que até cinco gerações — dos Tradicionalistas aos Zs, com a (sexta) Geração Alfa batendo à porta — precisam não apenas coexistir, mas colaborar intensamente. Essa riqueza de perspectivas é um ativo de valor inegável, mas lança um desafio central à gestão de pessoas: como transformar a potencial “Torre de Babel” comunicacional em uma sinfonia produtiva?
Instigados por essa situação, como parte de nossos estudos no programa Executive MBA da FGV-EAESP, pesquisamos as percepções sobre a comunicação intergeracional no ambiente de trabalho. Mediante a adaptação da escala WICS (Workplace Intergenerational Climate Scale) proposta por King e Bryant (2017) e inclusão de questões qualitativas próprias, ouvimos mais de 80 profissionais de diversas empresas, níveis hierárquicos e faixas etárias, atuantes em diferentes segmentos.
Os resultados: há uma percepção generalizada de que a comunicação flui com maior dificuldade entre gerações distintas; os mais experientes valorizam o contato pessoal ou telefônico, e as gerações mais novas navegam com naturalidade e ansiedade entre e-mails, reuniões virtuais e mensagens instantâneas.
O ponto mais curioso é o espelho distorcido da autoavaliação: mais de 70% dos entrevistados consideram-se comunicadores excelentes, independentemente da idade. O problema reside sempre no “outro”, “que não sabe se comunicar”. Essa percepção mascara uma necessidade de autoanálise e adaptação mútua, comum a todas as gerações.
Como lidar com esses desafios? Conflitos são naturais em organizações que reúnem múltiplas gerações. A chave está em promover conexões genuínas e uma comunicação adaptativa.
Para isso, propomos cinco frentes de ação:
• Recrutamento consciente: alinhar valores e expectativas desde a entrada evita desalinhamentos futuros.
• Projetos-pontes e mentorias reversas: criar espaços em que gerações troquem experiências de forma estruturada.
• Espaços informais multigeracionais: atividades sociais que favorecem vínculos além do trabalho.
• Escuta ativa e guias de comunicação: promover empatia e clareza nos canais e estilos utilizados.
• Empoderamento dos times: autonomia e confiança são fundamentais para reduzir microgestão e ansiedade.
Conexão genuína não é apenas técnica, é cultura. Vai além de saber escrever bem ou responder rápido: é criar ambientes onde o diálogo é claro, respeitoso e efetivo. As empresas que investem nisso transformam atrito em colaboração, e diversidade etária em vantagem competitiva.
Artigo baseado em pesquisa do Executive MBA da FGV EAESP. Identidades foram preservadas
![]() | Andréia Gomes da Silva: bacharel em Engenharia de Produção, profissional de Supply Chain especialista em planejamento de demanda e materiais. |
![]() | Eduardo C. Lazarine é Diretor Administrativo no CQA Laboratórios, Engenheiro de Computação pela UNICAMP. |
![]() | Ellen Padovese é advogada e turismóloga, especialista em execução de eventos corporativos e consultora em excelência no atendimento. |
![]() | Emerson de Paula Silva é COO da ARTEB, formado em Administração e cursando Executive MBA pela FGV. Com mais de 30 anos de experiência no setor automotivo, atua na liderança com foco em eficiência, inovação e desenvolvimento de pessoas. |
![]() | Karolyne de Sousa Santos é head de Pessoas e Cultura na Sallve, especialista em liderança, cultura organizacional e desenvolvimento de talentos. |
![]() | Nelson Gilmar Tavelin Filho é Executivo Jurídico no Banco Sofisa e professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie nos cursos de Pós-Graduação Lato Sensu. Mestre em Direito. |