ENTREVISTA com Vânia Bueno | Edição 341 (Abril/2016)
Para especialista, boa comunicação é aquela que é consequente
Dois temas vêm ganhando destaque nas empresas, ultimamente: diálogo e relacionamento. No entanto, há sempre um abismo entre aquilo que é e aquilo que se imagina ser e, de fato, se pratica. Em muitas organizações, vários gestores acreditam que sabem dialogar; e muitas empresas pensam que sabem se relacionar com seus stakeholders, principalmente com seus funcionários. Como aproximar esses mundos e visões diferentes? Para ajudar nessa resposta, conversei com Vânia Bueno. Ela é jornalista com pós-graduação em comunicação empresarial e mestrado em desenvolvimento organizacional pela Case Western Reserve/EUA. É sócia-fundadora da Anima Comunicação e Desenvolvimento, empresa que durante 20 anos atuou no mercado de comunicação integrada, e nos últimos sete anos presta consultoria em comunicação para o desenvolvimento organizacional.
Vânia não titubeia em falar o que é fazer uma boa comunicação. Para ela, não é uma tarefa impossível, basta ter os ingredientes certos que, neste caso, são: coerência, verdade, credibilidade, confiança e transparência. “Você precisa mais de virtudes do que de competências”, diz.
Falar em comunicação, agora, é falar em uma disciplina nova?
As disciplinas não são novas, mas a forma como compreendemos e aplicamos a comunicação mudou drasticamente. Isso acontece também com outras áreas do saber. A realidade complexa nos convida a caminhar da superespecialização, foco dos métodos positivistas, para a integração de saberes. Concordo com a visão do sociólogo e antropólogo Edgar Morin que defende a superação do padrão científico que separou o conhecimento em caixinhas, como se a realidade fosse assim, porque, na verdade, tudo está integrado.
Retirar viseiras que nós mesmos colocamos…
Exatamente. O método científico gerou um grande desenvolvimento para a humanidade, mas este modelo mental agora nos deixa o grande desafio de remover os obstáculos que criamos nesse processo de separação. Comunicação tem tudo a ver com reintegrar o saber e a ação humana. Neste sentido, quando pensamos no desenvolvimento de líderes e organizações, o processo comunicativo deixa de ser uma ação imediata, voltada para resultados técnicos e parciais, e ganha uma abordagem mais abrangente e profunda; portanto, de mais longo prazo e de maior impacto estratégico.
Sobre resultados: hoje, no mundo corporativo, tudo tem de ser mensurável, é preciso calcular o retorno do investimento. Com a comunicação também?
Esse é um ponto muito discutido. Os mecanismos de mensuração de retorno sobre os investimentos em comunicação evoluíram muito nos últimos anos. Contamos com um bom conjunto de indicadores sobre o tema, e isso é muito positivo. Hoje é possível medir o impacto de uma campanha nas vendas de um produto ou sua preferência frente à concorrência. Porém, alguns aspectos da comunicação são muito subjetivos. Como mensurar percepção? Como avaliar impactos emocionais, afetivos, relacionais? A corrente que questiona o padrão de gestão americano, baseado na mensuração permanente, ganhou espaço ao propor a consideração do valor intangível. O mundo corporativo se abriu para essa proposta, mas a preponderância da visão numérica e financeira segue cobrando dos profissionais de comunicação uma resposta conceitualmente conflituosa: tangibilizar o intangível.
O problema é que estamos acostumados a entender comunicação como sinônimo de ferramentas de comunicação. Talvez por culpa dos próprios profissionais da área ao imaginar que a função deles seja, apenas, produzir e manter veículos de comunicação?
Uma visão mais estratégica da comunicação vem mudando esse padrão, pouco a pouco, mas a formação do profissional de comunicação e as práticas do mercado apontam prioritariamente para ferramentas e mais ferramentas. Aqui se percebe também a influência do positivismo, a comunicação ficou em uma “caixinha”, compartimentada.
Como comunicadora, minha visão sobre o assunto mudou drasticamente quando conheci a teoria da nova comunicação da Escola de Palo Alto. Essa teoria surge como alternativa do entendimento matemático da comunicação que se baseia na visão linear emissor-receptor-mensagem-meio, para uma leitura mais orgânica, complexa e humana. Nasce de uma reflexão arrojada que reuniu antropólogos, sociólogos, historiadores, psiquiatras, matemáticos e linguistas, dentre outros. Sua definição é simples e ao mesmo tempo bastante impactante: comunicação é comportamento. Essa resposta me ajudou a esclarecer muitas de minhas intuições e inquietações profissionais. Me fez compreender que tudo o que você faz, ou não faz, diz ao mundo quem você é. Que, da mesma forma que não é possível “não se comportar”, também não é possível “não se comunicar”. Comunicação não se limita ao momento em que você intencionalmente se manifesta. Ela é parte de toda a interação humana.
Então, o ficar quieto é um comportamento e também uma forma de comunicação?
Sim, imagine: você está em um elevador, olhando para o display de andares. Muitas pessoas entram, e você mantém o olhar para o alto. Essa sua atitude diz às pessoas que você não quer conversa. O outros entendem e, ao não conversarem com você, expressam que captaram a sua mensagem. Esse diálogo silencioso é tão ou mais eficiente do uma discussão acalorada. Outro exemplo é quantas mensagens podemos decodificar somente a partir da vestimenta das pessoas, ou ao observar os itens que carregam no carrinho de supermercado. Tudo comunica, entende?
Por essa razão, o tema da comunicação não pode mais estar restrito ou ser apenas responsabilidade das agências ou áreas formais de comunicação. É responsabilidade de todos, especialmente no mundo conectado. No livro que estou escrevendo sobre convivência produtiva, uso o termo “comunicantes” para definir esse novo papel.
O que seria comunicante?
Comunicante é todo aquele que se comunica. Todos somos comunicantes. Alguns comunicantes estudam técnicas e ferramentas de comunicação e tornam-se também comunicadores. Vale ressaltar, porém, que ótimos comunicadores podem ser péssimos comunicantes. Isto porque o universo do comunicador tem se restringido aos aspectos técnicos e operacionais, enquanto o comunicante atua no espaço das relações. Na minha carreira conheci excelentes gestores de comunicação, que criam campanhas maravilhosas, mas não sabem ouvir, se relacionam muito mal com as pessoas ou são pouco flexíveis. Isto pode não diminuir sua competência tática, mas seguramente vai influir no seu sucesso pessoal e profissional.
Um bom gestor sabe usar bem a comunicação?
Vamos colocar assim: para ser um gestor eficaz, métodos e processos são fundamentais. Mas, para exercer liderança, é essencial ser um bom comunicante. Isso porque, para liderar, cada vez mais, é preciso exercer influência. Quando o líder não se comunica bem, a liderança fica comprometida. Uma evidência do que estamos falando são os estudos que a agência internacional Ketchum realiza para analisar a percepção sobre as lideranças no mundo. Em 2014, por exemplo, depois de ouvir 6.000 pessoas em todo o mundo, os dados apontam que, para 75% dos entrevistados, a comunicação é um atributo muito importante. Outros 24% consideram uma competência importante, chegando à quase unanimidade sobre a grande relevância do tema. Agora veja, a mesma pesquisa aponta que apenas em torno de 30% dos líderes atendem a essa expectativa. Um gap de 70%. Então vem a pergunta: se nunca tivemos tantas ferramentas e meios de comunicação, por que esta deficiência tão significativa?
E como se fala em comunicação, hoje! Da mesma forma como se fala em gestão de pessoas, que o principal ativo das empresas é o ser humano. Mas ainda há uma distância entre o discurso e a prática.
Você tocou no ponto. Sabe quais foram os aspectos mais desejados e valorizados pelos respondentes da mesma pesquisa? “Liderar pelo exemplo”, com 63%, “Comunicação aberta e transparente”, com 62% e “Admitir erros”, com 61% das respostas. Chama também atenção, na pesquisa, o fato de o aspecto com menor indicação ter sido a “Retórica inspiradora” (34%). Isso é um importante contraponto à percepção geral de que problemas de comunicação se resolvem com cursos de oratória. O que está sendo pedido são mais ações-chaves do que mensagens-chaves. Este é o campo da comunicação pragmática. Da comunicação que é comportamento.
Por que tem de existir coerência entre o discurso e a prática?
Quando falamos entre a distância entre o discurso e a prática, tocamos o campo da ética e, pelo enfoque da comunicação, pensamos em reputação. Se a imagem é a percepção do discurso, a reputação é a constatação da atitude. Este sempre foi um tema importante e delicado, mas na era da transparência ganhou ainda mais relevância. Até a década de 90, antes do surgimento da internet, o que prevalecia era a macronarrativa, isto é, o discurso oficial, gerido e distribuído por centrais de comunicação (públicas e privadas) que, por ingerência política, social ou econômica, definiam o que deveria ser divulgado, quando e para quem. A revolução tecnológica marca a distribuição do poder de influência e permite que a micronarrativa, as mensagens e versões criadas pelos indivíduos, ganhe magnitude e supere fronteiras, com cada vez menos mecanismos de controle. Isso possibilita que a versão oficial de um fato dada por uma empresa X, ou um político Y, seja desmentida ou requalificada instantes depois. O poder de influência agora não é mais centralizado, permitindo que, por exemplo, um anônimo brasileiro faça cair o valor da ação de uma empresa americana na bolsa de Tóquio. Imagine o quanto isso impacta o trabalho do profissional de comunicação. Se antes era possível seguir planejamentos e metas claras, hoje navegamos no imponderável. Uma questão importante é: como comunicadores e comunicantes, fomos preparados para esta realidade? Estamos conscientes do poder e das responsabilidades a que esta nova condição nos expõe?
E as pessoas tendem a levar muito mais em consideração a opinião de um conhecido do que o que está em um veículo oficial…
É verdade, e sempre foi assim. A velha rádio-peão, mesmo restrita e atuando na periferia, sempre foi observada e, de certa forma temida, pelos gestores. As pessoas tendem a confiar mais na opinião de seus pares. A questão é que hoje vivemos na grande rede-peão. O indivíduo ocupa o centro do palco. E esse palco é o mundo.
Daí vem a pergunta dentro da empresa: “Para que tanto veículo se a comunicação não funcionou?” É uma espécie de autossabotagem.
Veja, 10 entre 10 empresas apresentam em suas pesquisas de clima algum problema de comunicação. E quando isso acontece, a manifestação mais comum é “ah, isso é um problema do departamento de comunicação” ou “precisamos trocar de agência”. Vem, então, um comunicador, focado em soluções instrumentais, e quase sempre propõe mais uma newsletter, uma campanha, um banner, um site. Isso está, em muitos casos, só piorando a situação. As pessoas não conseguem mais absorver tanta informação ou responder a tantos estímulos. O ponto é que, como falamos antes, os desafios da comunicação não vivem e não se resolvem mais dentro dos cercadinhos dos comunicadores; comunicação é um problema de todos os comunicantes. E, voltando à pesquisa, as pessoas querem mais atitude e menos conversa.
Por exemplo: “Somos a favor da inovação”, mas, na prática, não se toleram erros.
Vamos pensar nesse seu exemplo. Quase todas as empresas falam hoje em inovação. Porém, mais do que uma palavra ou um desejo, transformar uma cultura conservadora em um espaço criativo exige novos modelos mentais, novos comportamentos e muito aprendizado. É um desafio e tanto. Pode levar anos e exige um processo de desenvolvimento organizacional intenso. Uma distorção importante, e que precisa mudar, é acreditar que a comunicação possa produzir transformações instantâneas. O comunicador recebe a demanda e produz uma campanha elaborada, com mascote, banner, folder, portal, tudo impecável. Todos investem tempo, dinheiro e energia fazendo o seu melhor. Mas na realidade da empresa não existem condições para o novo. Cria-se um tipo de “esquizofrenia”, um estado de contradição interna, que pode gerar grandes perdas. Sem cumprir as etapas necessárias, é natural que o resultado esperado da campanha não se concretize, e a conclusão será que a comunicação fracassou. Isso me faz lembrar o ponto de virada na minha carreira, quando, depois de 15 anos desenvolvendo projetos de comunicação, um cliente me disse na reunião de briefing: “Queremos ser percebidos no mercado como uma empresa de ponta, confiável e inovadora”. Ao que respondi assertivamente: “Para cumprir seu objetivo, nós precisamos de uma coisa: Seja”. Perdi o contrato, decidi fazer um sabático e, desde então, tenho focado minha contribuição para que líderes e empresas sejam e não apenas pareçam.
O contexto atual exige do profissional de comunicação uma consciência mais sistêmica e de longo prazo. Se antes versões incongruentes levavam anos ou décadas para serem questionadas, sustentando uma imagem irreal, hoje podem se desfazer na velocidade de um clique. Neste caso, utilizar ferramentas de comunicação para disseminar discursos voláteis pode significar um desserviço para quem contrata e para quem executa. Todos perdem no quesito reputação.
Ela não desenvolveu a cultura da empresa, investiu na “venda” da imagem.
Exato. É importante deixar claro que esta é a forma como aprendemos a resolver as questões de comunicação por muitas décadas. Na maioria dos casos, não há má-fé ou incompetência, o que acontece é um descompasso entre os modelos do passado frente à revolução que estamos vivendo. Vamos precisar reaprender para podermos nos adaptar. É nesse ponto que a comunicação cria uma conexão estratégica com o desenvolvimento organizacional, a ciência que trabalha com processos de longo prazo para criar a transformação desejada. Uma coisa é certa: sem comunicação não há desenvolvimento.
Uma área reforça a outra.
Sim, especialmente no que diz respeito às ações de alinhamento, envolvimento e motivação do time. Costumo dizer que engajamento é a comunicação que deu certo. É quando as pessoas respondem, da forma esperada, ao estímulo que foi dado. É preciso assumir que tudo o que fazemos gera impacto, assim como somos impactados por tudo o que acontece à nossa volta.
É a comunicação consequente?
Isso. A comunicação consequente deve ir além da entrega do resultado imediato, do atendimento do briefing do cliente, interno ou externo. Ela considera os desdobramentos e consequências das intervenções. Pensando ainda no exemplo da campanha de inovação, cabe ao profissional de comunicação questionar se a empresa pode, de fato, corresponder às expectativas que a comunicação irá criar. Se as pessoas respondem ao chamado, buscando a inovação, mas seus líderes não agem de forma coerente, o esforço servirá para aumentar a desconfiança na gestão e o descrédito no trabalho de comunicação em si. É difícil assumir isso, mas a verdade é que muitos funcionários sequer abrem comunicados e peças de comunicação de suas empresas porque perderam a crença de que sejam úteis ou verdadeiros.
Vamos falar um pouco da competência de comunicação da liderança. Você vê uma preocupação das empresas em desenvolver essa competência?
Acredito que as empresas já se deram conta de que o assunto é importante. Várias pesquisas apontam a comunicação como uma competência essencial, especialmente para os cargos de alta liderança. O assunto já está na pauta dos sites, newsletters e eventos que cada vez mais citam e dão destaque para o relacionamento e o diálogo. Mas sabemos o que é diálogo? Fomos formados para gerir a dinâmica complexa das relações? Infelizmente, não. Muitas pessoas pensam que o diálogo se restringe à comunicação face a face, mas diálogo exige muito mais do que isso.
Exige escuta ativa…
…empatia, abertura para considerar o ponto de vista que é diverso do seu, valorizar a diversidade, ter tolerância. Gosto muito da definição da Sarita Chanila que diz que “diálogo não é apenas falarmos uns com os outros. Mais que falar, é uma maneira especial de ouvirmos aos outros – ouvir sem resistência – é ouvir de um ponto onde estamos dispostos a ser influenciados.” Muito mais do que apenas estar diante do outro.
…tem portas abertas…
Outro grande obstáculo para o diálogo é que ele pressupõe uma flexibilização da hierarquia. O diálogo parte do pressuposto de que o que você diz é tão importante quanto o que o outro traz. Além de abrir portas ou remover divisórias, relacionamentos saudáveis pedem respeito, equanimidade e acolhimento.
Não importa o cargo.
Não importa o cargo. Vemos hoje muitas experiências em que a solução para um problema de alto impacto nos resultados nasce de sugestões de quem trabalha no chão de fábrica, no serviço de logística, no almoxarifado. E, mais uma vez, se aproximam os desafios da comunicação aos modelos de gestão e de liderança. Esbarramos no modelo mental não só dessa ou daquela companhia, desse ou daquele profissional, mas do mundo. É preciso inserir a reflexão que fizemos até aqui no contexto de profundas mudanças que estamos vivendo. Entender que estamos em um estado de transição ou, para ser mais precisa, de macrotransição: momentos raros da história da humanidade em que todos os níveis do sistema estão mudando de forma simultânea, profunda e irreversível. Tudo o que conhecíamos como fórmula, modelos, padrões está sendo questionado. E a comunicação é um eixo central nesse processo.
Nessa macrotransição temos o avanço da tecnologia. Como o líder vai criar uma relação tão próxima com os outros a distância?
Não sei. Não sabemos ainda. Esta é a resposta mais sincera que podemos dar em momentos como este. Vamos precisar experimentar novos caminhos. Testar hipóteses e ir cocriando possibilidades no fluxo da própria mudança. Tenho conversado muito sobre essas inquietações com o professor Massimo Di Felice [coordenador do Centro de Pesquisa Atopos, palavra de origem grega que significa lugar paradoxal, estranho, indefinido, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP)], um especialista no tema. Ele é muito otimista e acredita que a rede tem uma capacidade de autogestão, de autoadaptação. O que precisamos é resistir à tendência de aplicar o velho padrão de comando e controle, que nunca mais voltará a funcionar como foi um dia.
Mas como você vê o líder nesse cenário?
Na minha experiência em comunicação e desenvolvimento organizacional encontrei um ponto em comum que dá sentido para meu aprendizado. Meu trabalho atualmente está focado no que chamo de convivência produtiva. Sabemos que viver em sociedade é condição, mas a convivência produtiva é uma escolha. Em ambientes corporativos, cada vez mais competitivos e com alto grau de “toxinas” físicas, mentais e emocionais, é preciso resgatar condições em que possamos, juntos, produzir mais e melhor. As pesquisas de clima e de performance nas companhias demonstram que as estratégias baseadas na pressão, no conflito e na competição estão chegando ao limite. As pessoas estão adoecendo. As empresas estão doentes. É preciso encontrar uma outra forma de mobilizar as pessoas e seu poder criativo.
Durante o mestrado na Case Western Reserve conheci a Investigação Apreciativa (IA), uma metodologia inovadora criada pelo Prof. David Cooperrider, que tem se provado uma ótima alternativa. A grande diferença da I.A. em relação às práticas convencionais é a substituição do foco no que “falta” pela observação e desenvolvimento do potencial que existe nas pessoas e nas organizações. Uma postura que, segundo Peter Drucker, contribui para que o líder desenvolva o potencial de sua equipe a ponto de suas fraquezas se tornarem irrelevantes. Enquanto passarmos a maior parte do tempo resolvendo problemas, não haverá tempo e energia para cocriar o novo, para fazer o melhor. Richard Boyatzis, outro professor da Case e parceiro de Daniel Goleman nas descobertas da inteligência emocional, reforça essa visão baseado em pesquisas da neurociência que revelam que os seres humanos mudam impulsionados, basicamente, por dois sentimentos: medo ou esperança. Enquanto o padrão usualmente escolhido pelas organizações é o da mudança movida pelo medo, as pesquisas revelaram que quando inspiradas pela esperança e pelo sonho, a transformação é mais rápida, eficaz e prazerosa. A I.A. parte da criação de um sonho mobilizador para operar a mudança. Não se trata, porém, de uma postura de “Poliana”; os obstáculos e gaps serão identificados, mas farão parte do processo, ao invés de serem o foco do processo. Enfrentamos o problema, sem tirar os olhos do sonho. Centenas de empresas, algumas cidades e iniciativas como o Global Compact da ONU já provaram que este é um caminho que pode dar certo.
Que competências são mais importantes para o líder a partir dessa visão? (As competências são necessárias para vencer alguns obstáculos, mas para a realização do sonho as virtudes também são importantes.)
No meu entendimento, o ponto de partida para uma convivência mais produtiva e apreciativa é uma boa comunicação consigo mesmo. Trilhar o caminho do autodesenvolvimento e da consciência. Como estou me sentindo fazendo o que faço? Estou seguindo meus valores, reavaliando constantemente minhas crenças? Estou fazendo o meu melhor para mim e para os demais? Muito de nossas insatisfações e fraquezas está diretamente relacionado à forma como gerimos nosso próprio potencial e ao sentido que damos ao que fazemos. Liderar pelo exemplo, o atributo mais desejado segundo a pesquisa que citamos, é resultado da coerência, da verdade e da integridade interna. São essas virtudes, mais do que competências técnicas, que garantem a credibilidade e a confiança de que o líder precisa para envolver suas equipes e parceiros. Claro que competências são essenciais para a execução de tarefas e metas, mas estas já são superdemandadas pelas organizações, o que tem nos levado a investir tanto no “como fazemos”, deixando de dar a atenção devida ao “quem somos”.
Como defensora da cultura do “e”, acredito no caminho do meio, na busca do equilíbrio que contempla o individual e o coletivo, o lucro e a responsabilidade, o racional e o intangível. Estou segura de que na medida em que o líder se transforma em uma pessoa mais aberta, confiável e justa, maior será o seu poder de influência.