Eles cresceram em um mundo extremamente dinâmico. Acostumados ao universo digital, são inquietos e têm pressa em ver as coisas à sua volta acontecer – quando entram em uma empresa, sentem necessidade de respostas rápidas, por isso construir carreira é algo difícil para eles. Julgados muitas vezes como individualistas, os jovens da geração Y têm um forte desejo pelo empreendedorismo e por criar algo com a cara deles, o que explica o boom de startups nos últimos anos, principalmente no setor de tecnologia. Diante desse cenário, empresas e RHs devem estar atentos ao que podem oferecer e o que esperam desses jovens profissionais que estão entrando no mercado de trabalho.
Autora do livro Geração Y e a busca de sentido na modernidade líquida: eles não são todos iguais e estão mudando as relações de trabalho (Ed. Juruá), a coach e professora da Universidade São Judas Tadeu Taynã Malaspina aponta que existe um choque entre o que é idealizado pelos jovens e a realidade. Parte dos resultados de uma pesquisa qualitativa desenvolvida para sua dissertação de mestrado em Psicologia Social mostra o cenário de insatisfação vivido por esses jovens, que buscam o trabalho como forma de expressão do conceito “faça o que você ama”, contudo experienciam no mercado o formato tradicional de emprego.
Na opinião da coach, cada vez mais o jovem chega à universidade com uma baixa percepção de si. “A formação apenas para o vestibular acaba deixando alguns gargalos no caminho. O jovem não tem noção do que gosta, de quais são os talentos dele”, observa. Soma-se a isso a angústia diante do excesso de possibilidades e temos uma geração com pouca clareza do que quer para seu futuro e dificuldade para traçar seus primeiros passos. Por isso, Taynã destaca a importância desse jovem entender quais são seus valores, crenças e medos. “Escolher um caminho sem ter uma noção maior de si pode gerar uma trajetória de carreira que lá na frente vai frustrar. Ter esse autoconhecimento faz total diferença para traçar uma visão de futuro”, acredita.
Ajudar o profissional a desenvolver esse autoconhecimento é um dos objetivos do programa de estágio da Deal, empresa brasileira com atuação internacional provedora de serviços especializados em outsourcing, consultoria e tecnologia. “Nós temos buscado mostrar que eles precisam investir no autodesenvolvimento, que passa pelo autoconhecimento, maturidade e, portanto, a escolha do caminho que ele quer fazer”, explica Vilma Guilherme, diretora de RH da empresa.
Para a diretora, é necessário questionar o que o jovem quer para que fique claro para a empresa o que é possível cumprir. “Isso é um trabalho muito constante. Por mais que a gente tenha processos de avaliação periódicos, todo dia eles estão olhando pela janela e parece que lá fora existe alguma coisa mais interessante. Precisamos o tempo todo ajudá-los a enxergar as possibilidades que eles têm dentro da empresa e no trabalho que estão desenvolvendo”, afirma.
Por isso, além da capacitação técnica, a Deal busca dar aos estagiários uma visibilidade de carreira e mostrar as possibilidades de crescimento. Outro ponto importante é o trabalho de feedback, que já começa no processo seletivo. Já selecionados, os estagiários passam por avaliações trimestrais em relação a desempenho, atitudes, comportamentos e expectativas. “Nosso projeto tem duas vias: tanto ele recebe, como dá feedback. Nossa intenção é que isso provoque uma comunicação contínua no dia a dia da empresa”, ressalta Vilma.
Empresas que têm políticas de feedback estruturadas são bem vistas pelos jovens da geração Y, que, segundo Taynã, precisam saber se estão indo bem ou não. Ela aponta também que além do salário, existem outras moedas de troca como aprendizagem, desafio e reconhecimento.
Ensinar na prática é o que pretende a FALCONI, consultoria de gestão, com seu Programa de Estágio e Jovens Consultores. O programa é destinado a jovens talentos que se identifiquem com uma cultura organizacional de valorização da meritocracia e busca por resultados. A promessa da empresa é desenvolver consultores com múltiplos conhecimentos para atuar em gestão para que, em um futuro breve, eles possam assumir papel de liderança em projetos e um dia se tornarem sócios da consultoria.
A consultoria, que se define como uma empresa escola, também oferece cursos ministrados pelos próprios consultores da FALCONI. “Nosso objetivo é buscar jovens que tenham paixão por desafios e gostem de trabalhar num ambiente bastante dinâmico, onde se aprende fazendo”, afirma Bruno Turra, diretor de Gente da FALCONI.
Empreendedorismo
Segundo Taynã Malaspina, o desejo do jovem pelo empreendedorismo ficou evidente em sua pesquisa. Na opinião da coach e professora, muitos desses jovens viram seus pais trabalharem a vida inteira em uma empresa e depois serem demitidos em cortes, gerando uma frustração por terem se dedicado a algo que não era deles. “Esse jovem tem uma relação bem menos apegada com a empresa, a fidelidade é diferente”, diz. “Durante minha pesquisa para o mestrado uma menina questionou o que era lealdade a uma empresa. Se era ficar lá acomodado anos só por causa de um salário ou ficar enquanto você realmente vê sentido, tem prazer e se dedica”, relembra.
Para Vilma Guilherme, diretora de RH da Deal, é importante incentivar que as pessoas busquem seus sonhos. “Se meu objetivo é só mantê-lo na empresa, ele vai sair muito mais rápido, além de não exercer toda a sua capacidade no período em que estiver aqui. Eu prefiro que ele seja pleno enquanto trabalhar na empresa e perceba uma oportunidade de realização e aprendizado. Se o desejo dele é percorrer esse caminho que é a Deal e amanhã abrir uma empresa, onde ele realmente exerça seu poder de sonhar e executar, nós incentivamos”.
Adaptar o perfil
Taynã comenta que algumas pesquisas sobre as empresas mais desejadas pelos profissionais revelam perfis distintos, como Google, mais flexível e inovadora, e a Petrobras, com perfil mais tradicional. Por isso, ela defende que não devemos estereotipar a geração Y como uma instância homogênea. “Muito do que se fala sobre a geração Y é com base em estudos americanos e de uma classe A/B. Temos jovens, principalmente da classe C, que buscam estabilidade e seguem um caminho mais tradicional”, analisa.
Para a coach, alguns segmentos não vão conseguir se adaptar ao perfil dessa geração, mas há espaço para empresas mais tradicionais. No entanto, nas empresas onde o diferencial é o capital humano, a criatividade e a inovação, ela acredita que é fundamental uma readequação de formato de trabalho para reter talentos com um perfil mais inquieto. “O modelo tradicional já não supre essas necessidades. Por isso também tem crescido novas formas de trabalho. As próprias startups adotam formato de RH bem diferente, com pacote de benefícios flexível de acordo com o que é mais aderente ao profissional”, acrescenta.
Leia mais sobre o jovem no mercado de trabalho na matéria Cartas na mesa, na edição de abril da Revista Melhor RH.