Gestão

Preparar o terreno

de Patricia Sperandio em 14 de setembro de 2009

Investir na comunicação transparente e estimular cada funcionário a se posicionar como um empreendedor parece ter sido a fórmula encontrada pela Caterpillar para ser eleita a melhor empresa para trabalhar no Brasil e na América Latina pelo Great Place to Work (GPTW). Mesmo no período em que enfrenta a pior crise de seus 55 anos de história em terras brasileiras, reflexo da crise mundial, a fabricante de maquinário pesado ostenta um dos melhores índices de engajamento de seus funcionários – 95%, segundo um questionário interno – e vê seus valores disseminados em todos os setores de sua sede em Piracicaba, interior de São Paulo.

“Acredito que o que nos destaca é a transparência em passar informações e em compartilhar com os empregados o que a empresa vive, suas ansiedades e expectativas”, diz a diretora de RH da Caterpillar, Suely Aparecida Toka Agostinho. Para ela, essa facilidade em transmitir a estratégia da companhia, aliada a uma política de incentivo pessoal, colabora para manter a tranquilidade em meio à crise, que neste ano já provocou uma onda de demissões e diminuição do faturamento da empresa (veja mais no quadro da página 44). Apesar do mau momento, Suely sustenta que a empresa continua pautada pelo respeito ao ser humano, postura que proporcionou uma boa avaliação de seus colaboradores ainda que muitos colegas estivessem sendo demitidos. “A preocupação com o bem-estar das pessoas já faz parte da nossa forma de conviver dentro da empresa, que tem valores claros e líderes bem preparados, o que facilita o trabalho”, afirma.

Para colocar em prática essa política de comunicação clara, a Caterpillar atua em diversas frentes: divulga boletins eletrônicos, circula periódicos internos e mantém os chamados Espaços de Comunicação em diversos pontos da fábrica, locais onde, além de tomar café e conversar, os funcionários podem acompanhar e monitorar resultados da empresa – inclusive aqueles que terão impacto direto no bolso, como o Plano de Participação nos Lucros e Resultados (PLR). Nesses espaços também é possível obter informações sobre o andamento do STIP – Short Term Incentive Plan (plano de incentivo em curto prazo), uma prática de reconhecimento monetário da companhia que, em 2008, chegou a pagar o equivalente a dois salários em alguns setores.

Na visão da diretora de RH, falar abertamente com o funcionário inclui também orientá-lo sobre o desenvolvimento da carreira e posicioná-lo a respeito de seu futuro dentro da empresa. Isso quer dizer que não só informações sobre a rotina de trabalho devem ser divulgadas com clareza, mas também o que a organização espera de seus trabalhadores. “O colaborador deve ter um espírito empreendedor e entender aonde a empresa quer chegar, ver o trabalho como se fosse o próprio negócio”, aponta Suely. Uma dessas práticas de incentivo ao desenvolvimento é o Programa de Orientação de Carreira (POC), que funciona como um banco de talentos que podem se candidatar para vagas abertas em outros setores – ou em posições mais elevadas. No entanto, mais do que apenas direcionar a ocupação de vagas, o POC procura avaliar o desempenho dos candidatos como se fosse um recrutador externo, mostrando a ele a realidade do mercado e dando dicas para melhorar sua performance. Deste modo, não só a empresa passa a ter conhecimento mais profundo sobre seus talentos como, em contrapartida, os próprios funcionários recebem um treinamento com valor de coaching.

Foco nas pessoas
Outra ferramenta pioneira na Caterpillar, criada e implantada em 2001 na fábrica brasileira, é o PMP (Performance Management Program, ou processo de gestão de desempenho). O sistema é dividido em três etapas: a primeira estabelece metas entre gestor e subordinado; a segunda acompanha o desenvolvimento com base no feedback e na autoavaliação; e, finalmente, a avaliação de desempenho em relação aos objetivos, quando o profissional pode receber reconhecimento salarial. Todas essas etapas podem ser acompanhadas pela intranet da empresa, que proporciona transparência e
rapidez ao processo.

São práticas como essas que evidenciam a importância da gestão de pessoas dentro da organização. “O RH, dentro da Caterpillar, está no mesmo patamar estratégico das outras áreas, ou seja, participa de todas as ações, discute e alinha os procedimentos”, afirma Suely. Para ela, a primeira colocação na pesquisa do GPTW é resultado direto dessa filosofia de colocar as pessoas em primeiro lugar. “Um dos objetivos da nossa estratégia de gestão é fazer com que as pessoas se sintam em suas próprias casas. A empresa que pensa apenas no lucro ou só em obter o maior resultado de seus profissionais, sem dar nada em troca, tem vida curta”, ressalta.

Além dos incentivos para a carreira – dentro ou fora da empresa – a Caterpillar procura manter uma política consistente de benefícios, o que inclui a preocupação com a saúde e o bem-estar dos colaboradores. Somente em 2008, investiu cerca de 32 milhões de reais na saúde dos trabalhadores, em ações como o programa Viva Bem, que reúne ambulatórios médicos internos, programas de prevenção a doenças, monitoramento de doenças crônicas e a Vila Saúde, que acompanha casos mais complexos e promove atendimento periódico às mulheres e crianças. Essa gestão abrangente é capaz de identificar, por exemplo, quais as doenças que mais afetam os funcionários e como elas podem ser evitadas.
A Caterpillar possui, ainda, algumas características particulares: está localizada em uma cidade do interior, numa área de 164 mil metros quadrados, com uma população interna maior que a de muitos municípios brasileiros e com grande parte dos funcionários há muitos anos na empresa. Fatores como esses favorecem a proximidade do RH com seu público, e direcionam a área a tomar decisões que interferem até mesmo na vida pessoal dos funcionários, como o planejamento da aposentadoria, a administração da renda familiar e o tratamento de questões delicadas, como o abuso de drogas. No ano passado, por exemplo, um programa interno chamado Mais Família atendeu quase uma centena de casais para lidar com temas, como o próprio nome diz, familiares. Na opinião de Suely, a preocupação com a esfera privada do trabalhador faz parte dos valores da companhia – e de quem a comanda. “Para mim, o líder ideal é o que gosta de pessoas. Essa é a primeira competência”, ressalta. (Patrícia Sperandio)

Pacote generoso

Benefícios incluem empréstimo pessoal a juro zero e kits escolares para os filhos

A julgar pelas práticas de transparência e pela preocupação em inspirar o empreendedorismo em seus funcionários, a área de recursos humanos da Caterpillar busca fugir do lugar-comum. Ainda assim, o trabalho de base é levado a sério. O pacote de benefícios é destacado como um dos mais completos – e os salários são apontados como maiores que a média da região de Piracicaba, onde a empresa está instalada. Os benefícios e programas para a gestão de pessoas da Caterpillar incluem:

– Dois planos de saúde a escolher e médicos disponíveis 24 horas diárias, além de atendimento odontológico e monitoramento de doenças crônicas;
– Estrutura de pequenos serviços, como postos bancários e farmácia, assim como convênios para descontos em despachantes, seguradoras, escolas particulares e até fabricantes de computadores;
– Empréstimos especiais para situações de emergência, parcelados em até dez vezes, e parcerias com bancos para empréstimos consignados em folha com juros abaixo do mercado;
– Transporte coletivo para municípios da
região, restaurante subsidiado, cesta-básica e tíquete-alimentação;
– Horário flexível para o pessoal
administrativo e banco de horas para conciliar trabalho com eventualidades domésticas e compromissos pessoais;
– Clube para os funcionários, com piscina, quadras, estrutura de lazer e calendário esportivo e cultural;
– Campanhas de reciclagem: no ano passado, 3,4 mil toneladas de materiais recicláveis foram vendidas, com o valor revertido para a compra de kits escolares para filhos de funcionários.

 

Crise provocou demissão em massa

Há 55 anos no Brasil, a Caterpillar atravessa um de seus momentos mais difíceis, com milhares de demissões pelo mundo em decorrência da crise econômica mundial. Somente na fábrica brasileira, instalada em Piracicaba (SP), diante da queda acentuada no volume de produção e estimativa de faturamento menor que a metade do ano anterior, a empresa demitiu cerca de mil funcionários e afastou temporariamente outros mil, que aguardam em casa, sem receber salários, a volta dos pedidos. No total, a Caterpillar mantém hoje cerca de 4,6 mil trabalhadores e promete recontratar, preferencialmente, ex-funcionários. A Caterpillar Inc., fundada em 1925 nos EUA, é uma das líderes mundiais na fabricação de maquinário pesado, como retroescavadeiras, tratores e motoniveladoras.

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