Tem sido cada vez mais comum observarmos a expressão previdência privada no rol de benefícios oferecidos em anúncios de emprego, especialmente das grandes organizações. Na opinião dos especialistas ouvidos por MELHOR, esse benefício se tornou corrente entre as corporações, principalmente as multinacionais. Diante da guerra por talentos que as organizações brasileiras têm travado, as pequenas e médias empresas também se viram diante da necessidade de oferecer o benefício para atrair bons profissionais.
E esse é um filão que tem sido observado de perto pelas operadoras de previdência complementar. Afinal, os números desse mercado são impressionantes. Os planos empresariais de entidades abertas que reúnem as modalidades Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) fecharam 2011, segundo dados de uma pesquisa da Mercer, com um patrimônio de 44 bilhões de reais e mais de 3 milhões de contribuintes, o equivalente a 1% do PIB, enquanto que as entidades fechadas formadas por fundos de pensão das próprias empresas, multipatrocinados e de fundo instituidor reuniram um patrimônio de 603 bilhões de reais e mais de 7 milhões de participantes, 14% do PIB.
Lucio Flávio Oliveira, presidente da Bradesco Vida e Previdência, afirma que da carteira de clientes empresariais de pequeno e médio porte do banco, menos de 10% contratam planos coletivos. “A característica desses empreendimentos tradicionalmente é de composição familiar e quando é oferecido o plano corporativo, as pessoas preferem fazer o individual”, comenta.
O executivo revela que essa preferência deve-se ao fato de os planos PGBL ainda serem considerados caros pelos pequenos empresários. “Como esses negócios trabalham no regime de lucro presumido, a vantagem desse produto fica comprometida. Por outro lado, acredito que o mercado ainda é subaproveitado para o potencial que ele tem”, ressalva.
Para Carolina Mazza Wanderley, líder da área de previdência da Mercer, as empresas médias têm estruturado suas áreas de RH e desejam alinhar suas políticas às das maiores, principalmente em função dessa guerra na busca por bons profissionais. “Há um pensamento de que oferecer o benefício em forma de salário custa mais caro e é muito mais vantagem para a empresa, até em termos monetários, oferecer o plano de previdência, pois ele tem um fator adicional de retenção devido às carreiras aceleradas e à rotatividade”, defende. Na opinião da consultora, se o plano de previdência for desenhado como um benefício de longo prazo e for estabelecido um critério de acesso ao recurso que a empresa coloca, isso ajudará a reter profissionais.
Segundo Evandro Oliveira, líder da área de aposentadoria da Towers Watson, no passado, quando um profissional procurava emprego em uma organização de ponta, o questionamento era se a empresa oferecia previdência complementar. Hoje, a pergunta é como é desenhado o plano de previdência. “Esse benefício deixou de ser um diferencial para as empresas top de linha e, agora, os profissionais, principalmente os executivos, comparam se o que é ofertado é melhor do que eles têm”, diz.
Retenção
O mercado de previdência complementar também se adaptou às mudanças relativas à carreira, principalmente com a chegada da geração Y ao mercado de trabalho. Ao contrário dos babies boomers e alguns profissionais da geração X, esses jovens não são afeitos a permanecer em uma única empresa por décadas e as operadoras se viram obrigadas a criar uma modalidade que ficou comum também entre os planos de saúde: a portabilidade.
Carolina, da Mercer, afirma que o percentual de jovens que contribuem para planos de previdência tem crescido substancialmente. “O jovem entre 25 e 30 anos contribui fortemente e, imagino eu, ao casar e ter filhos, o nível de poupança diminui um pouco. Quando chega à idade entre 45 e 50 anos, bate o desespero por não ter acumulado o que precisava e ele acaba maximizando a contribuição”, descreve.
Também para atender a essa demanda de beneficiários que não permanecem na organização por muito tempo, surgiu o modelo de contribuição definida em que a patrocinadora e o participante definem previamente o valor da contribuição, em porcentagem salarial. O cálculo do benefício é feito de acordo com os valores contribuídos e a capitalização desses recursos. Essa modalidade, inclusive, responde por quase 40% dos planos em vigência no país (ver gráfico).
Para Andréa Vivan, superintendente de previdência pessoa jurídica da Itaú Vida e Previdência, a vantagem da portabilidade é a possibilidade de o profissional mudar de emprego várias vezes e levar sua contribuição para o outro plano. “Possivelmente, algumas vezes ele terá de abrir mão da parte do empregador, mas algumas empresas têm regras mais flexíveis que permitem o resgate parcial ou até total”, destaca.
Oliveira, da Towers Watson, afirma que as empresas devem estabelecer regras de vesting – conjunto de cláusulas que o participante é obrigado a cumprir para ter acesso aos recursos das provisões decorrentes das contribuições pagas pelo estipulante-instituidor – para tornar a previdência complementar uma ferramenta de retenção mais eficiente.
E se a organização calibrar bem as regras de vesting e de custeio, ela consegue tornar o plano atrativo inclusive para os jovens que não pretendem ficar muitos anos na empresa. “Nossa experiência tem sido muito positiva com os planos de contribuição definida e a adesão supera os 90% dos colaboradores, independentemente da faixa etária”, revela Mauro Guadagnoli, superintendente comercial da Brasilprev.
Um aspecto que também atrai os jovens para a previdência complementar é a aplicação dos recursos. Como os planos de previdência são ancorados em aplicações financeiras, a queda nas taxas de juros nos últimos anos tem levado as operadoras a diversificarem os investimentos para garantir a melhor rentabilidade aos planos. “Até cinco anos atrás, o setor aplicava em renda fixa, alguns fundos de renda variável e grande parte da captação acabava acontecendo nos fundos atrelados aos Certificados de Depósito Interbancário (CDI) e não havia muita variação”, detalha Andréa, do Itaú.
Ela comenta que atualmente o leque foi ampliado e até orientação sobre educação financeira tem sido oferecida aos beneficiários. “Oferecemos um material bastante detalhado que possibilita ao cliente entender qual é o seu perfil e analisar, com base em seus objetivos de curto e longo prazo, qual a melhor alternativa. Também temos aplicado em fundos de renda fixa atrelados a índices de inflação, ativos de longo prazo, papéis que tenham o Ibovespa como benchmark e outros fundos com gestão ativa”, complementa.
Comunicação é fundamental
Com a evolução do mercado de previdência complementar, o profissional de gestão de pessoas também buscou se atualizar e hoje já tem um bom domínio do funcionamento do produto. Entretanto, na opinião de Evandro Oliveira, da Towers Watson, algumas empresas não estão tirando maior proveito do investimento que fazem no benefício. “Não é feita uma campanha de comunicação mais efetiva para ajudar as pessoas a fazerem uma poupança adequada ou mesmo evidenciar a quantidade de dinheiro que a empresa coloca nesse benefício. Há um espaço muito grande para as organizações melhorarem a percepção do seu pacote de benefício comunicando melhor sobre os planos de aposentadoria”, exemplifica.
Andréa, do Itaú, também defende o investimento em comunicação para um melhor esclarecimento sobre o plano aos colaboradores. “O produto em si é simples, mas as questões tributárias podem gerar dúvidas. Por exemplo: existem dois regimes de tributação e nessas questões, apesar de a informação estar disponível, o consumidor pode ficar em dúvida sobre qual é o mais adequado para fazer uma escolha mais assertiva, por exemplo, qual o mais vantajoso na hora da Declaração de Ajuste Anual à Receita Federal”, pondera.
PGBL e VGBL da Saúde
Depois de cinco anos de estudos e discussões entre a Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), Superintendência Nacional de Seguros Privados (Susep) e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), ainda este ano devem ser lançados os planos PGBL e VGBL voltados para a aplicação exclusiva à saúde dos beneficiários.
Lucio Flávio Oliveira, presidente da Bradesco Vida e Previdência e vice-presidente da Fenaprevi, afirma que normalmente as empresas custeiam a assistência médica até a aposentadoria e depois que o funcionário se aposenta, perde o direito ao plano de saúde e fica com uma despesa elevada com medicamentos e tratamentos. “A ideia é permitir à empresa e ao participante construir uma reserva financeira para ser utilizada no tratamento de saúde depois da aposentadoria.”
Ele ainda salienta que a legislação que cria esses novos planos não vai mudar os direitos garantidos pela Lei 9.656/98, em cujo artigo 30 há previsão de que quando o contrato de trabalho for rescindido sem motivo, o empregado terá direito à manutenção do benefício do plano de saúde nas mesmas condições de cobertura de que gozava quando vigorava seu acordo laboral, por um período que pode variar de seis meses a dois anos, tendo como condição que assuma o pagamento integral das mensalidades.