Gestão

É sempre um risco

de Karin Hetschko em 6 de dezembro de 2013

Sabe aquela cena rotineira de comer algo rápido, em geral nada saudável, sentado no sofá? Pois bem, ela ganhou novo cenário. Saíram o sofá e a TV e entraram o computador e a mesa do escritório. Sim, a rotina de alguns brasileiros é responder um e-mail e outro enquanto almoçam prostrados em frente à tela do computador. Essa foi uma das conclusões de uma pesquisa encomendada pela empresa de delivery de comida on-line RestauranteWeb.

O estudo, conduzido com cerca de mil brasileiros, mostra que 42% fazem suas refeições todos os dias no local de trabalho. Por vezes, eles comem rápido no ambiente corporativo destinado a essas refeições, em outras, preferem não desligar do batente e acabam comendo na frente do inseparável PC ou notebook. A pesquisa ainda indica que, além daqueles que têm como hábito degustar suas refeições diariamente na empresa, 30% dos entrevistados afirmaram fazê-lo normalmente de duas a quatro vezes na semana.

E por que os profissionais assumiram esse hábito? A desculpa na ponta da língua é a economia de tempo (69%). “Hoje, passamos a maior parte do tempo dentro do escritório. É natural que, seja pela correria, para conseguir sair no horário, ou mesmo para não perder o almoço em um dia de muitas reuniões, as pessoas acabem pedindo comida fora”, afirma Juliana Barbiero, diretora de marketing do RestauranteWeb.

Política corporativa
A correria do dia a dia pode ser uma desculpa ideal para o hábito, contudo, nem todos ficam contentes com a situação. Sem detalhar em números, a pesquisa destacou que boa parte dos entrevistados mostrou-se incomodada ao ter um colega de trabalho comendo no mesmo ambiente em que outros estão tentando se concentrar no exercício da profissão. A principal reclamação é sobre o cheiro das refeições, seguido da limpeza do local.

E como se posicionam as empresas no meio dessa contenda entre aqueles a favor do fast-food corporativo e os contra essa situação? Boa parte delas é contra o cenário e tentam desconstruí-lo por meio de políticas educativas. Esse é o caso do programa Bem Estar da Elavon, empresa do setor de aquisição e processamento de cartões de crédito, débito e meios eletrônicos de pagamento. 

O projeto congrega uma série de iniciativas cujo objetivo é proporcionar a manutenção de um nível elevado de qualidade de vida no ambiente de trabalho. Entre as principais ações se destacam a participação em corridas de rua e a reeducação alimentar, com forte incentivo ao consumo de frutas. O executivo da área de recursos humanos, Guilherme Vanin Filho, comenta que a proposta estabelece uma nova dimensão nas relações de trabalho, visando o bem-estar físico e mental dos colaboradores. “Atividades físicas, cuidados com a saúde e alimentação adequada contribuem para reduzir o impacto das pressões normais do trabalho”, completa.

Os colaboradores são orientados a consumir pelo menos duas frutas ao longo do dia. Responsável por colocar o plano em prática, Alvaro Teno tem 65 anos e trabalha com tecnologia da informação, mais especificamente no setor de controle de custos. Ele informa que o objetivo desse incentivo é trabalhar com reeducação alimentar de forma que haja cinco refeições ao longo do dia. “Uma fruta antes do almoço e outra depois resolvem essa equação”, afirma.

E pelos números apresentados pela Elavon os colaboradores entenderam o recado: só em 2012, 4.612 quilos de frutas foram consumidos por 120 funcionários da companhia.

Ajustando os fusos
A prática acabou contribuindo para a adaptação da equipe brasileira da Elavon na interlocução com os profissionais da empresa nos EUA e na Europa. “Muitas vezes, os executivos de outros países marcam conferências justamente no horário de almoço dos brasileiros. Nesses momentos, as frutas são também muito bem-vindas”, afirma Alvaro.

As frutas estão em alta nos programas de qualidade de vida. Outra empresa que aposta nelas é a Akna, do segmento de soluções inteligentes para relacionamento digital. A companhia passou a distribuir porções individuais de frutas, duas vezes ao dia (manhã e tarde) a todos os funcionários. “Na correria do dia a dia, acabamos deixando a nossa saúde de lado. É bom trabalhar em uma empresa que nos dá essa oportunidade”, afirma Vagner Pereira, coordenador de marketing da Akna.

A empresa ainda criou a Akna Health, uma espécie de hospital da prevenção, em que os funcionários recebem orientações sobre o consumo dos alimentos e a correta postura. Nesse escopo de trabalho, uma das primeiras medidas do programa adotadas foi trazer à empresa um profissional de ergonomia para avaliar as condições do ambiente, a qualidade do ar e a postura dos colaboradores. As próximas ações serão promover exercícios laborais ao longo do expediente e oferecer salas com massagem antiestresse.

“Acreditamos que um bom trabalho começa com a preocupação com nossos funcionários. Uma empresa com pessoas felizes transmite isso aos clientes por meio do bom atendimento”, afirma Lucio Boracchini, sócio-diretor da Akna.

Sobrepeso
Longe de ser um problema exclusivo dos americanos, o sobrepeso também já está no radar do Ministério da Saúde brasileiro. Recentemente, o ministro Alexandre Padilha assinou portaria que cria a Linha de Cuidados Prioritários do Sobrepeso e da Obesidade no Sistema Único de Saúde (SUS), que define como criar uma cultura da perda de peso (veja mais na pág. 100).

Levantamentos mostram que o excesso de peso e a obesidade têm crescido no Brasil. De acordo com dados do Ministério da Saúde, a proporção de pessoas acima do peso avançou de 42,7%, em 2006, para 48,5%, em 2011. No mesmo período, o percentual de obesos subiu de 11,4% para 15,8%.

O resultado do crescimento da população acima do peso dói no bolso. Estimativas do ministério revelam que o SUS gasta anualmente 488 milhões de reais com o tratamento de doenças associadas à obesidade. Não é apenas o governo que gasta com a doença, as empresas também sentem no orçamento os efeitos nocivos do sobrepeso, seja pelo aumento da sinistralidade do convênio médico, seja com a ausência do funcionário em virtude de problemas de saúde relacionados com o tema.

Perfil nutricional e antropométrico
Nesse contexto, iniciativas de prevenção e educação alimentar são muito bem vistas por todos os públicos. Além dos exemplos já mencionados da Akna e da Elavon, uma iniciativa da MHA Engenharia chama a atenção. Trata-se de uma parceria entre a companhia e a Universidade São Camilo, que propõe uma análise do perfil nutricional e antropométrico dos colaboradores. A partir desses dados, há uma avaliação da qualidade do consumo alimentar individual, provendo subsídios para que os nutricionistas orientem e acompanhem a rotina gastronômica de cada funcionário.

O programa está aberto para todas as áreas da MHA e, de acordo com a idealizadora da proposta, Maria José Rodrigues, técnica em segurança da construtora, tem tido boa adesão por parte dos colaboradores. “Após o início do projeto, pudemos observar claramente uma preocupação maior dos participantes com a alimentação, com o consumo de água e com a prática de atividades físicas”, completa Maria José.

Outra ferramenta no combate aos quilinhos a mais são as palestras semanais de orientação dos hábitos alimentares. A escolha dos temas das oficinas é criteriosa e focada de acordo com a análise dos dados dos funcionários. “Procuramos promover as palestras semanais com temas baseados no diagnóstico da avaliação nutricional, e também divulgamos dicas nutricionais curtas via intranet da empresa”, explica.
Após essa maratona nutricional, os participantes serão submetidos a uma nova reavaliação com coleta de dados sobre peso, porcentagem de gordura, circunferência abdominal e dados dos valores nutricionais. Os números do antes e depois do programa serão comparados para verificar se o projeto foi eficaz na melhoria de qualidade de vida dos colaboradores.


 

Vales e cestas nos pacotes
Quais os itens relacionados à alimentação que são mais frequentes nos pacotes de benefícios das empresas? Para responder a essa questão, vale uma consulta a recente pesquisa divulgada pela Aon Hewitt, feita junto a 260 companhias no Brasil. Encabeçam a lista três itens ligados à saúde: assistência médica (com 99,23% de prevalência nos pacotes), seguro de vida (90,04%), e assistência odontológica (86,97%). Na quarta posição, aparece o vale-refeição (72,03%) e, na sétima, o vale alimentação, (57,09%).

Segundo Humberto Torloni Filho, vice-presidente técnico da área de benefícios da Aon Hewitt, a tendência é que as empresas continuem oferecendo os benefícios em grupo, como assistência médica e odontológica, vale-refeição e vale-alimentação. Já os refeitórios industriais e as cestas básicas aparecem com uma prevalência abaixo de 50% (49,43% e 21,07%, respectivamente). Segundo alguns especialistas, o índice relativamente baixo para as cestas se justifica pelo maior uso dos cartões alimentação, que prometem maior comodidade; ao mesmo tempo, conforme os entrevistados, esse uso pode ser desvirtuado com a compra de outros produtos que não os de alimentação.

Pelo fato de ser pontual, outro benefício não aparece em boa parte das pesquisas: as cestas de Natal. Para muitas empresas, esse item funciona como uma ferramenta de valorização dos colaboradores. O profissional de RH interessado em oferecer esse tipo de presente no fim do ano deve ficar atento aos prazos para fechamento dos pedidos (em geral, até o fim de novembro) e a outras informações como confiabilidade da marca, qualidade dos produtos e se há reclamações sobre atrasos na entrega.


 

O peso do prato (no bolso)
O preço médio da refeição no Brasil é 27,40 reais, segundo pesquisa da Associação das Empresas de Refeição e Alimentação Convênio para o Trabalhador (Assert), que mostra que a combinação arroz com feijão segue como preferência nacional, apesar da diminuição do seu consumo. O levantamento avaliou os preços das refeições compostas por prato principal, bebida não alcoólica, sobremesa e cafezinho em diferentes ofertas ou tipos de refeição, como prato feito ou comercial, autosserviço (refeição a quilo/preço fixo), prato executivo e “à la carte”. Ao todo foram 4,4 mil estabelecimentos entrevistados em mais de 40 cidades brasileiras.


 

Linha do cuidado
A obesidade é um fator de risco para a saúde e tem forte relação com altos níveis de gordura e açúcar no sangue. Problemas cardíacos e diabetes são algumas das doenças que podem ser causadas por maus hábitos alimentares. Nessa esteira, o governo federal lançou em março deste ano o programa Linha de Cuidados Prioritários do Sobrepeso e da Obesidade no Sistema Único de Saúde (SUS). “Esse é o momento de o Brasil agir em todas as áreas, prevenção e tratamento, atuando com todas as faixas etárias e classes sociais, com um reforço para quem tem obesidade grave”, ressaltou o ministro Alexandre Padilha, durante a apresentação do programa.

A portaria prevê atividades desde a atenção básica para o cuidado do excesso de peso e outros fatores de risco que estão associados ao sobrepeso até o atendimento em serviços especializados. A pessoa com sobrepeso (IMC igual ou superior a 25) poderá ser encaminhada a um polo da Academia da Saúde para realização de atividades físicas e a um Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf) para receber orientações para uma alimentação saudável e balanceada.

Para frear a obesidade e o sedentarismo e promover hábitos de vida mais saudáveis, o Ministério da Saúde também prevê uma série de iniciativas no Plano de Ação para Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), por meio de parcerias com o setor privado e outras pastas do governo.
Outra iniciativa para melhorar a dieta dos brasileiros e qualidade de vida do Ministério da Saúde foi o acordo firmado com a indústria alimentícia que prevê a redução gradual do teor de sódio em 16 categorias de alimentos. A previsão é de que, até 2020, estejam fora das prateleiras mais de 20 mil toneladas de sódio.

Após esgotadas todas as alternativas anteriores, o governo concederá subsídios para a cirurgia bariátrica. Ademais, a portaria do Ministério da Saúde também reduz de 18 para 16 anos a idade mínima para realizar o procedimento, em casos em que há risco ao paciente. A iniciativa foi tomada com base em estudos que apontam o aumento crescente da obesidade entre os adolescentes. Da faixa de 10 a 19 anos, o percentual de 21,7% dos brasileiros apresenta excesso de peso – em 1970, este índice estava em 3,7%.

 

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