Gestão

A onda dos Startups

de Caroline de Freitas em 25 de janeiro de 2014

Em janeiro deste ano, a executiva de RH Fabiana Bellinatti decidiu apostar em um novo modelo de negócios, no qual pudesse acompanhar de perto o desenvolvimento dos funcionários e criar práticas de gestão de pessoas desde o começo e de maneira customizada. “Fiquei sete anos em uma companhia com quase três mil pessoas, queria uma gestão mais próxima”, diz. Fabiana aceitou, então, o desafio de tocar a área de pessoas da Juv Acessórios, startup de venda direta de acessórios de moda pela internet.

Com o desafio de ter a flexibilidade de estar próximo da estratégia, junto aos diretores, e ao mesmo tempo de olho nos processos operacionais, a executiva se diz confiante em sua decisão. “Numa startup, você não é ´´mais um´´ e pode cuidar de todos os processos – dos mais estratégicos aos mais operacionais”, ressalta. De acordo com Fabiana, a primeira ação que precisou ser feita foi a estruturação dos processos básicos de administração de pessoal, recrutamento e seleção e comunicação interna. “Agora estamos trabalhando na construção da cultura da empresa e na definição das competências essenciais dos futuros profissionais”, diz. De acordo com a executiva, isso será construído com base na estratégia da empresa, missão, visão e valores, considerando também as metas de curto, médio e longo prazos. A mesma receita de um RH de uma grande empresa, mas feita de maneira mais próxima e customizada. “Construir isso é gratificante”, conta.

Casos como o de Fabiana são cada vez mais comuns. Há muitos executivos aproveitando a vasta experiência em grandes empresas para apostar nas startups, negócios baseados em uma ideia pouco convencional, que pode gerar lucro a partir de pouco investimento, mas que exige gestão de altos riscos. Elas são projetadas desde o início para se tornarem um negócio de crescimento rápido, com margens de lucro grandes e custos fixos pequenos. Segundo dados da Aceleradora, empresa que apoia a criação de startups no Brasil, existem hoje no país cerca de três mil empresas desse tipo. E a tendência é que esse número aumente nos próximos anos. Uma boa razão para isso é o interesse de muitos empresários em investir em novos projetos, como explica Yuri Gitahy, fundador da Aceleradora. “Vemos muitos empresários, hoje, interessados em investir em bons projetos”, diz. Com isso, o crescimento dessas empresas passa a ser mais rápido e muitas delas começam a atentar para a importância de contratar profissionais de RH.

ROTATIVIDADE DE PESSOAS
Apesar de não haver um número concreto desse movimento, percebe-se uma crescente preocupação por parte dos fundadores dessas empresas em adotar estruturas de pessoas condizentes com as necessidades de momento e futuras do negócio. “Já vemos startups que enfrentam problemas em seus quadros de pessoal, com grande rotatividade, por negligenciarem o fator capital humano”, afirma Luana Bichuetti, consultora do escritório da Booz & Company, em Nova York.

No Peixe Urbano, site de compras coletivas, a área de RH existe desde o lançamento da startup, em 2010. De acordo com Julio Vasconcellos, fundador da empresa, investir no RH foi prioridade desde o começo, já que a base do negócio está nas pessoas. “São elas que melhoram a qualidade do serviço e a experiência de nossos usuários e parceiros”, diz. Ele acredita que parte do sucesso da empresa – que passou de cinco funcionários em 2010 para mais de mil em 2013 – se deva a isso. Segundo ele, com a ajuda do RH foi possível pensar mais estrategicamente em uma estrutura e selecionar um time de qualidade, eficiente e com boa dinâmica e direcionamento. Para isso, a área desenvolveu a gestão de remuneração e de processos de administração de pessoal, implantou programas de desenvolvimento e gestão do clima, além de ter feito o mapeamento e disseminação da cultura organizacional e desenvolvimento das lideranças. “Isso sustentou o crescimento da empresa”, diz Anderson Valverde, responsável pela área de gestão e gente do Peixe Urbano. De acordo com ele, a principal diferença de atuar em uma startup é a questão processual. “Em uma empresa consolidada, você geralmente refaz ou cria novos processos a partir de um modelo testado, que não está atendendo às necessidades ou não se mostrou eficaz a longo prazo. Já em uma startup, o desafio é criar processos e procedimentos novos, sem referências”, diz.

PERFIL DIFERENCIADO
Mas aproveitar esse nicho de mercado exige perfil. Não é qualquer profissional de RH que se dá bem nessas empresas. “Startups não são lugares para pessoas que não se sintam confortáveis em um ambiente de trabalho instável ou de alto risco”, explica Yuri. Segundo ele, quem busca estabilidade no trabalho, e gosta de processos bem estruturados, deve pensar duas vezes antes de aceitar o convite de trabalhar em uma companhia assim. De acordo com especialistas ouvidos pela Melhor RH, três características são essenciais: empreendedorismo, influência e resiliência. Empreendedorismo, pois para conseguir estruturar boas práticas de gestão, o profissional precisa compartilhar do sonho do fundador, de sua ideia de negócio. “É isso que vai sustentar as ações”, diz Fernanda Reis, consultora da DMRH, consultoria em recursos humanos. Influência, pois o profissional vai trabalhar diretamente com o dono da empresa, pensando em estratégias que deem resultado ao negócio; e resiliência, já que em uma startup tudo muda muito rápido e é preciso trabalhar em todas as frentes. Segundo Fernanda, o executivo tem de transitar entre o tático e o estratégico muito rápido. “Ele deve ter muita energia e criatividade, pois muitas vezes terá de criar ações com poucos recursos”, afirma.

Mas todo esse trabalho tem recompensa. Quem opta por esse desafio tende a ter uma perspectiva de crescimento em um prazo menor do que se estivesse em uma companhia mais sólida e estruturada e há regras nessas empresas que permitem, até, que o colaborador se torne sócio à medida que ele atinge metas de produção e tempo de empresa. Para aqueles que gostam de desafios e têm um perfil empreendedor, essas empresas são um bom negócio. Segundo Priscila Salgado, diretora da Orthus HR, consultoria de recrutamento especializada unicamente em posições de RH, as vantagens são a capacidade de envolvimento com todas as áreas de negócios, a construção do DNA da empresa e atuar como tomador de decisão em maior escala, desde o momento de sua concepção. “Isso enriquece muito o currículo”, diz.
Em linhas gerais, é o perfil de alguém que busca ter mais impacto, que quer prazer e satisfação, e quer ter a certeza de que ajudou a criar negócio, que sua contribuição foi decisiva. Numa startup é preciso ser muito flexível para cooperar na resolução dos diferentes problemas que surgem, e gostar do desafio de ter de procurar informações diferentes para resolvê-los.  Para quem tem esse perfil, a hora de começar é essa.


 A voz deles

Os desafios de atuar no RH de uma startup

“Em uma startup não é comum ter estruturas e procedimentos definidos. O mais importante é fazer acontecer e esse é o maior desafio, criar um conceito de RH e fazer parte ativa na estruturação da empresa”

Andrezza Prestes, gerente de RH da Mobly, empresa de e-commerce do segmento de móveis, decoração e acessórios (sede em SP)

“O desafio é a necessidade de desenvolver todas as políticas do zero, sem regenciais, e de maneira rápida e objetiva, sempre focando a sustentação do negócio”.

Anderson Valverde, gerente de desenvolvimento de RH do Peixe Urbano, site de compras coletivas (sede no RJ)

“Ter a flexibilidade de estar próximo da estratégia junto aos diretores e ao mesmo tempo cuidando do operacional, o que exige conhecimento generalista de RH”

Fabiana Bellinatti, gerente de gente da Juv Acessórios, e-commerce de venda direta de acessórios de moda pela internet (sede em SP)

“O RH de uma startup é ágil e as equipes são enxutas. Isso exige que você tome decisões e se adeque às situações rapidamente para atender às novas e constantes necessidades da organização”

Becky Cantieri, vice-presidente de RH da  SurveyMonkey, empresa de pesquisa on-line, com sede em Palo Alto, Califórnia

 

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