Quando o economista francês François Quesnay cunhou o termo “produtividade” em plena Revolução Industrial no século 18, certamente ele não imaginava a quantidade de voltas que o mundo daria até chegar em 2021. Em plena era tecnológica, o conceito que tanto se fez valer ao longo dos anos pede uma nova roupagem: precisa se despir das amarras de
outras épocas para se encaixar com maestria às necessidades dos novos
tempos. Home office, gestão à distância e a mudança no comportamento
das gerações desenham novas relações de trabalho, em um movimento que
não quer mais ver a produtividade como um fardo, mas como uma
consequência da paixão e do estímulo pelo trabalho.
Ao contrário de décadas atrás, as pessoas estão sucumbindo às
pressões, entendendo que não há por que ter medo ou vergonha de expor
suas fragilidades e impor limites. Nos Jogos Olímpicos, a maior
ginasta norte-americana de todos os tempos, Simone Biles, cedeu em
frente a milhões de pessoas. Abandonou as disputas por medalhas porque
ser produtiva já não bastava. A pressão pela perfeição pesava nos
ombros, machucava a mente e cuidar da saúde emocional fazia brilhar
mais os olhos da atleta do que qualquer possível medalha de ouro.
O que Biles compartilhou com o mundo vem acontecendo com recorrência
também fora dos holofotes. Profissionais de todas as áreas se mostram
cada vez mais estafados com a ideia de perseguir uma produtividade
inatingível, tóxica, com efeitos negativos para corpo, mente e, claro, para o próprio desempenho. Uma pesquisa da Robert Half mostrou que 38% dos colaboradores brasileiros acreditam que, durante o período de pandemia, houve piora em sua saúde mental e no bem-estar.
Produtividade artificial
Ainda que o isolamento social forçado tenha rompido uma barreira em
relação à presença física como sinônimo de produtividade, atuar dentro
de casa aumentou o ritmo – já frenético – de atividades. Outro
levantamento realizado pela Robert Half mostrou que 52% dos
profissionais acreditam estar trabalhando mais horas em casa do que
antes. Com todo o aparato tecnológico e a facilidade de conexão,
mensagens fora do horário de trabalho, dezenas de reuniões online,
prazos cada vez mais apertados e quantidades gigantescas de demanda se tornaram frequentes.
Segundo estudo da Fundação Instituto de Administração (FIA), 94% das empresas brasileiras dizem ter atingido ou superado as expectativas de resultados com o home office, com metade delas estimando que a produtividade média da equipe aumentou. O fato, porém, é que grande parte dessa percepção advém justamente no maior número de horas trabalhadas e da falta de limites entre trabalho e vida pessoal.
Ser produtivo é ser presente
Muito antes da discussão sobre o home office e a pandemia, o
brasileiro já era um dos mais afetados por doenças como ansiedade e
depressão. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) já apontavam o
Brasil como o país mais ansioso do mundo e, também, com a maior
incidência de depressão da América Latina. Quando o assunto é
estresse, também estamos no topo da lista: 70% da população ativa já
apresentou ou possui sintomas de estresse, de acordo com estudo feito
em 2017 pela Isma-BR (Associação Internacional de Gerenciamento de Estresse Brasil).
Lidar com prazos, entregas e uma agenda apertada deixa pouco tempo para as emoções. E esse é um tema que ganha cada vez mais espaço no ambiente corporativo. Aos poucos, as empresas estão começando a entender que produtividade, de fato, é estar presente de corpo, alma e
coração, centrado em fazer suas atividades com paixão. Não se trata de
cumprir números ou tabela. Um profissional com performance acima da
média só existe quando há por trás uma pessoa acima da média, bem
resolvida com sua saúde física, mental e emocional.
Não à toa, centenas de corporações ao redor do mundo tem instituído ou ampliado seus programas de atenção à saúde e bem-estar dos colaboradores.
Líderes estão sendo treinados para desenvolver habilidades até então esquecidas, como a escuta ativa e o olhar atento. Os gestores também estão sendo capacitados para perceber as sutilezas nos comportamentos, e se mostrar mais presentes, ajudando a reverter quadros de ansiedade, estafa e desgaste. Como afirma Simon Sinek, autor best-seller mundial e palestrante inspiracional, grandes líderes da atualidade não são
aqueles que possuem as chamadas Soft Skills, mas sim os que têm Human
Skills para criar um ambiente de alta confiança e alta performance.
Rompendo a próxima barreira
Aproximar na distância não é uma tarefa simples, mas é uma atividade
que vale a pena. Como pontuou o futurista Bob Johansen, em sua obra
The New Leadership Literacies: Thriving in a Future of Extreme
Disruption and Distributed Everything (“A Literatura das Novas
Lideranças: Prosperar Em Um Futuro de Extrema Disrupção e Distribuição
de Tudo”, em tradução livre), uma das habilidades mais essenciais para
os líderes do futuro será inspirar clareza e confiança por meios
digitais. Mesmo por meio de telas, aplicativos e tecnologia, ainda é
possível reacender a chama do outro com uma iniciativa acolhedora. Só basta querer.
Estar presente, independente do canal, é acompanhar e incentivar as trocas de aprendizado, oferecer apoio, garantir inclusão e integração. É enxergar e valorizar pessoas muito além de porcentagens de entrega e relatórios de performance. Alinhando expectativas, fortalezas e fragilidades, podemos, juntos, construir um novo significado para a produtividade e um futuro muito mais saudável tanto para os profissionais como para os negócios.