No ambiente corporativo, o primeiro mês do ano é atrelado à campanha Janeiro Branco, que tem como objetivo promover ações preventivas em saúde mental e convidar à reflexão sobre o tema. Em 2022, ano em que o Burnout passa a ser mais difundido como fenômeno ocupacional, com atenção da Organização Mundial de Saúde (OMS) e maior detalhamento do quadro no CID 11 (manual internacional de diagnósticos clínicos), especialistas alertam para a necessidade de evidenciar o problema nos projetos de conscientização ligados à data e nos programas de bem-estar da empresa, destacando pontos importantes a serem considerados na abordagem do problema.
Para as fontes consultadas pelo portal Melhor RH
, entre as principais questões a serem esclarecidas e difundidas sobre o burnout estão sua origem, sintomas e impactos nas organizações.
Os especialistas explicam que é preciso ter em mente a causa multifatorial do burnout, nem sempre ligada somente a uma sobrecarga de trabalho ou pressão psicológica impostas pela empresa, como se costuma acreditar. Nível de inteligência emocional, eventualidades familiares, de saúde física ou financeiras, além de predisposição a doenças mentais também estariam diretamente ligados ao seu surgimento.
Estatísticas e sintomas jogando contra
O fato de o burnout não ser descrito como uma doença psiquiátrica, mas como um fenômeno decorrente de exposição crônica e mal gerenciada a stress, capaz de gerar sintomas análogos aos da depressão, da ansiedade, e do pânico, torna necessário considerar a prevalência desses outros problemas no ambiente corporativo para identificar e prevenir corretamente o problema.
Diagnóstico confundido com depressão e ansiedade pode ter subnotificação e dificultar a assertividade das empresas em lidar com o problema. No Brasil a depressão chega a atingir em torno de 10% da população adulta (dados do IBGE), sendo o país o mais ansioso do mundo, atrás dos Estados Unidos, segundo dados da OMS. Estatística que tenderia a se repetir no microcosmo organizacional, fazendo qualquer ponto acima da curva merecer sinal de alerta para uma maior ocorrência de casos de burnout.
O diagnóstico de transtornos depressivos ou ansiosos em lugar do problema, por sua vez, impacta, para fins médicos, trabalhistas e previdenciários, a importante prescrição de tratamentos e terapia e a concessão legal de afastamentos e auxílios financeiros.
Desde 2020, auxílios-doença e aposentadorias por invalidez decorrentes de transtornos mentais e comportamentais vêm batendo recordes. Dados da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho dão conta de mais de 576 mil afastamentos (26% a mais que em 2019).
Embora o crescimento dos auxílios-doença emitidos com o diagnóstico de burnout nos últimos 4 anos – um aumento real de mais de 100% em número de benefícios concedidos –, não havia nem 150 casos de auxílios pagos pelo problema no início de 2021.
Responsabilidades
Além das campanhas de conscientização realizadas por ocasião do Janeiro Branco, Jonas Duarte, sócio-fundador da Warana Treinamentos e Consultoria e especialista em desenvolvimento humano, destaca que é imprescindível criar um ambiente de trabalho saudável para que as pessoas tenham uma melhor convivência. Centrar a atenção no colaborador , seria, para Duarte, algo essencial nesse sentido. “É necessário que os colaboradores tenham abertura para dar ideias do que é preciso”, ressalta.
Já Humera Shahid, vice-presidente de Desenvolvimento de Talentos da Intuit, destaca como ponto de atenção o excesso de comprometimento individual, muitas vezes fonte do stress crônico que contribui para os casos de burnout. “Ele é muitas vezes um resultado direto de não dizer ‘não’ ou de não criar e manter limites saudáveis”, explica a executiva. “Dizer ‘sim’ quando você pode e ‘não’ ou ‘agora não’ quando necessário ajudará a priorizar o que é mais importante de fato”, destaca.
Mas ressalta que a companhia também precisa avaliar as prioridades – e também destaca a necessidade de escuta ativa aos colaboradores. “Acredito naquele velho ditado que diz: Se tudo é urgente, nada é urgente“, entende Humera. “A priorização é um desafio e foi uma das coisas que nossa empresa aprendeu com essa pandemia. À medida em que explorávamos maneiras de melhorar a experiência dos nossos colaboradores, aprendemos com o que estávamos ouvindo de nossa equipe e determinamos o que causaria mais impacto.”
De liderança personalizada a Psicologia Positiva
Para melhorar as relações e criar clima favorável à saúde mental, líderes devem oferecer uma gestão personalizada de suas equipes, avalia, por sua vez Jonas Duarte, da Warana. Os gestores devem levar em conta aptidões e dificuldades individuais para “dosar a pílula” e evitar sobrecargas. “O líder precisa olhar para o funcionário individualmente e entender o ser humano por trás do crachá e, na medida do possível, oferecer uma estrutura personalizada”, explica.
Já para a Head de Treinamento e Desenvolvimento da Warana, Bruna Munhoz, permitir que os profissionais tenham contato com seu propósito, exercendo-o junto à empresa, pode ser a chave contra o Burnout. A executiva cita a adoção de princípios da Psicologia Positiva como forma de promover mais autoconhecimento entre membros da equipe.
“Uma vez que eu trabalho em contato com os meus pontos fortes e talentos [um das propostas da abordagem e que está ligada ao exercício do propósito], naturalmente eu vou estar desenvolvendo algo que me faz bem e que eu gosto de fazer. Então, isso acaba diminuindo um potencial pico de estresse que a pessoa possa ter”, destaca a executiva.
Benefícios poderiam ajudar
Divulgada em setembro deste ano, uma pesquisa da Zenklub, plataforma de saúde emocional, e do Instituto Datafolha, revelou que a falta de acesso a quaisquer benefícios de saúde mental é comum a 64% dos trabalhadores brasileiros. Entre os entrevistados (1.197 profissionais adultos, de 129 municípios do país) 86% reivindicavam benefícios como terapia online e treinamentos, entre outros recursos que poderiam minimizar problemas psicológicos ou psiquiátricos. (O levantamento evidenciou sentimento de sobrecarga em 6 entre 10 profissionais brasileiros nos últimos 12 meses – e estes relataram ter experimentado, no período, sintomas como ansiedade – 66%, exaustão ou cansaço – 61%, insônia ou dificuldade para dormir –54%, e depressão – 26%.)