Problema histórico no Brasil, a violência doméstica contra a mulher está, infelizmente, longe de uma solução. A Lei Maria da Penha (11.340/2006) completou 17 anos nesse mês de agosto, mas, apesar da proteção legal, não há motivos para comemorar: 245.713 casos de violência doméstica foram registrados em 2022, mas um levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública estima que o número real é muito maior: a violência doméstica atingiu pelo menos 18,6 milhões de mulheres no ano passado. Por medo do agressor, a subnotificação de casos infelizmente é uma realidade.
O tema ainda é tabu em muitas empresas. Algumas usam o argumento de “não poder interferir” na vida privada dos funcionários, para não se posicionar claramente sobre o assunto. O fato é que mulheres que sofrem violência doméstica vão encontrar justamente no trabalho a independência financeira necessária para sair daquele ciclo de violência e seguir em frente.
Assim como as escolas atuam na rede de proteção infanto-juvenil, é este também o papel que as empresas devem ocupar, como rede de proteção das mulheres vítimas de violência. Não é mais possível lavar as mãos para essa responsabilidade corporativa e social.
Por quais outros motivos sua empresa precisa se posicionar a respeito do tema?
– Para dar a segurança e o acolhimento necessários à colaboradora vítima de violência doméstica.
– Para ajudar na conscientização e educação sobre o problema. Muitas pessoas acreditam que violência doméstica é apenas agressão física, quando na verdade são cinco os tipos de ameaças previstas na Lei: além da física, existem as violências psicológica, moral, sexual e patrimonial. Em todos os casos, a vítima precisa lidar com transtornos de ordem moral e emocional.
– Para reforçar o posicionamento contra a violência doméstica perante a sociedade, os funcionários, clientes, fornecedores e todos os atores envolvidos na cadeia. Lembrando que esse posicionamento deve ser autêntico e consistente com os valores e princípios e as práticas do dia a dia.
– Para acolher os funcionários que são vítimas diretas ou indiretas da situação. É claro que ter uma colega de equipe passando por um processo desses é algo que atinge diretamente todas as outras pessoas do time. Além disso, ao se posicionar de forma clara sobre o tema, o ambiente de trabalho torna-se mais solidário e seguro, o que afeta positivamente o bem-estar e a segurança psicológica de todos.
– Para exercer sua cidadania corporativa, se engajando em questões sociais e contribuindo para a solução desse problema.
– Para atuar como um agente catalisador de políticas públicas, fazendo por exemplo advocacia para promover mudanças sociais.
Agora que entendemos os motivos pelos quais sua empresa deve se posicionar, vamos revelar alguns passos sobre como ela deve fazer isso:
– Pra início de conversa, é essencial contar com o apoio da alta liderança, idealmente da pessoa que ocupa o cargo de CEO ou presidente. Um posicionamento claro do(a) próprio(a) líder da organização contra a violência doméstica tem um efeito em cascata positivo nos gestores, líderes e em todas as equipes.
– É vital iniciar o letramento dos funcionários, por meio de campanhas de comunicação de diversos tipos: workshops, palestras, comunicação interna. Mas lembre-se: a comunicação deve ser exaustiva. Um só treinamento não esgota o assunto.
– Pela criação de um canal de denúncias, com processos claros para receber e apurar denúncias, seja da vítima, ou também de colegas e do gestor. É comum a vítima se sentir intimidada e insegura para fazer isso sozinha.
– Fornecendo recursos e informações para apoiar a vítima, seja com a indicação de organizações locais especializadas em violência doméstica ou serviços de aconselhamento.
– Oferecendo apoio financeiro direto às mulheres que estejam enfrentando essa situação, como auxílio para tratamento médico, atendimento psicológico, ou apoio jurídico. É vital dar a garantia de que a pessoa continuará empregada, pois a independência financeira é uma das condições fundamentais para que ela possa encontrar uma saída sustentável para a situação.
Para finalizar, é importante lembrar que um posicionamento claro a respeito dessa pauta abre espaço para a discussão e resolução de outros problemas corporativos, como o assédio sexual contra as mulheres ou o assédio moral de uma maneira mais ampla.