Inovação

Com mentoria e inovação o RH transforma empresas e pessoas

Ao integrar mentoria e inovação, o RH contribui para o desenvolvimento de talentos, impulsionando as organizações para o futuro

de Priscila Perez em 9 de agosto de 2024
RH, inovação e mentoria Foto: imagem gerada por IA - DALL·E

Ninguém prospera sozinho. Seja na vida pessoal ou no mundo corporativo, compartilhar experiências é tão vital quanto comer ou dormir. Assim como buscar qualificação, aprender com os outros é um dos passos mais naturais dentro do princípio do lifelong learning. No entanto, apesar de ser uma necessidade humana, essa interação não brota naturalmente em ambientes pouco colaborativos ou sobrecarregados de processos, da mesma forma que a inovação depende da cultura organizacional para prosperar. A superação desses desafios vem com a atuação estratégica do RH ao estruturar programas de mentoria que integrem tecnologia, inovação e pessoas, abrindo espaço para experiências enriquecedoras.

Viver sem mentoria é como cair no mar sem saber nadar. Nesse momento, há duas opções: aprender sozinho ou se afogar. Mas se alguém lhe ensinar a dar as primeiras braçadas, suas chances de sobrevivência não só aumentam, como é bem possível que você aprenda diferentes estilos de natação. A analogia é precisa: com a mentoria, o RH consegue acelerar o desenvolvimento profissional dos colaboradores, ao mesmo tempo em que fortalece a inovação na empresa através do compartilhamento de conhecimento e habilidades.

Inovação é cultural

RH, inovação e mentoria
Álvaro Machado Neto

No entanto, para que as mentorias gerem resultados tangíveis, é crucial que exista, antes de tudo, uma cultura de inovação profundamente enraizada em toda a organização. Álvaro Machado Neto, COO do Learning Village, hub de inovação da HSM e da Singularity University Brasil, destaca que não adianta o board da companhia ter uma superestratégia de inovação se a equipe não possui um mindset inovador. “Quem enxerga as oportunidades é a ponta. Da mesma forma, não adianta termos pessoas com esse olhar se a média gerência, que é a liderança direta, trava as oportunidades”, analisa.

Se a inovação faz parte do dia a dia da companhia, certamente seus colaboradores serão mais colaborativos e inclinados à experimentação. Por isso, também é crucial que a empresa saiba identificar os caminhos possíveis para levá-la a um novo patamar – e mentoria é um deles. “Quando estamos em uma empresa, a referência é nosso líder direto, que tem uma visão mais ampla das coisas, mas ainda limitada. Olhar para pessoas de outras áreas e empresas ajuda no direcionamento, na resolução de problemas e no planejamento de carreira”, frisa. Segundo ele, esse processo é fundamental para um desenvolvimento sustentável a longo prazo.

Conexão de valor

Para Bruna Bergamini, professora de pós-graduação na Conquer Business School e head de Pessoas e Cultura na Pipefy, a integração entre mentoria e inovação promove dois elementos indispensáveis para as organizações: a criatividade e adaptabilidade. Ela cita como exemplo a conexão de mentores experientes com profissionais focados em inovação em workshops colaborativos ou hackathons internos. “Isso cria um ambiente onde a troca de ideias é constante e o aprendizado contínuo é incentivado. Benefícios como engajamento e geração de novas ideias para melhorar processos e produtos são palpáveis”, analisa.

RH, inovação e mentoria
Bruna Bergamini

Ao focar na aceleração de competências, a mentoria se torna uma ferramenta indispensável de gestão, voltada para o impulsionamento de talentos e lideranças. Na prática, ao conectar mentor e mentorado, o RH propicia a interação entre pessoas de diferentes áreas e perfis, com trajetórias profissionais variadas e em momentos distintos de suas carreiras. “A orientação personalizada oferece feedback valioso, conselhos de carreira e suporte para enfrentar desafios específicos, acelerando o crescimento profissional e aumentando a confiança”, complementa

Naturalmente, também são desenvolvidas durante as mentorias as habilidades necessárias para a formação de futuros líderes, como bem explica Bruna. Competências como senso de liderança, boa comunicação e resolução de problemas fazem parte do escopo, preparando os colabores para assumirem maiores responsabilidades. “Isso não só beneficia os indivíduos, mas também contribui para o sucesso da organização. Na Conquer, vemos diariamente o impacto positivo desses programas na carreira de nossos alunos e profissionais.”

RH, mentoria e a inovação

São trocas poderosas, como bem define Sandra Poltronieri, diretora de Gestão de Pessoas da Artplan e do Grupo Dreamers, referência em comunicação e entretenimento no país. “Programas de mentoria são espaços muito ricos que trazem diversas possibilidades, como transferência de conhecimento, troca de experiências, ampliação de perspectivas e abordagens, expansão do networking, suporte emocional e feedback”, analisa a especialista.

RH, inovação e mentoria
Sandra Poltronieri

No papel de “agente provocador”, o RH pode incitar mudanças positivas nas empresas por meio dessas fortalezas, conectando não apenas ideias, mas pessoas. Não à toa, programas de mentoria bem estruturados são capazes de transformar a cultura organizacional radicalmente ao estimular a experimentação, o aprendizado e a superação de obstáculos.

Desatando os nós

Segundo Sandra, além desses ganhos notáveis, a organização também pode utilizar a mentoria para desatar alguns nós organizacionais, incluindo a aceleração de carreira de colaboradores de grupos sub-representados. “E este olhar é essencial quando falamos em inovação”, observa. A importância disso está intrinsecamente ligada a um dos fundamentos mais básicos da gestão de pessoas: a diversidade. Indivíduos com experiências e perspectivas semelhantes tendem a gerar resultados previsíveis, enquanto a pluralidade de ideias enriquece o ambiente de trabalho e promove a criatividade.

Não à toa, essa abordagem tem sido uma constante no Grupo Dreamers desde o princípio. Nas primeiras três edições, o programa mirou nos colaboradores negros. Este ano, o programa cresceu para englobar pessoas LGBT+, com deficiência e neurodivergentes. Até agora, 92 colaboradores já participaram da iniciativa e a tendência é que cada vez mais gente participe. “Das três edições que tivemos, o projeto apresentou uma taxa de 17% de movimentação de carreira entre os participantes e promoveu mudanças internas, como promoções, efetivações, mudanças de equipes e entre empresas”, destaca a diretora de Gestão de Pessoas.

Além da diversidade, outros fatores são fundamentais na hora de estruturar a mentoria. No Grupo Dreamers, isso inclui processos de avaliação de desempenho, feedback entre pares, engajamento dos profissionais em ações de treinamento e a atenção da liderança em relação a seus times. Esses elementos combinados garantem que a mentoria seja abrangente e alinhada aos objetivos estratégicos da empresa.

Engajamento

Embora seja um processo estratégico na gestão de pessoas, a mentoria requer um esforço adicional da organização para ser bem-sucedida. Todo ambiente é potencialmente colaborativo, desde que a cultura sustente valores como confiança, diálogo e apoio mútuo. Entretanto, mesmo em organizações mais inovadoras, engajar os colaboradores para que participem espontaneamente dos programas de mentoria pode representar um verdadeiro desafio para o RH. A participação não pode ser forçada: é essencial que mentor e mentorado estejam verdadeiramente comprometidos para que a iniciativa seja produtiva.

RH, inovação e mentoria
Foto: imagem gerada por IA – DALL·E

Uma forma de encorajar profissionais experientes a se tornarem mentores é conferir a eles o devido reconhecimento na organização. Álvaro Machado Neto, COO do Learning Village, hub de inovação da HSM e da Singularity University Brasil, acredita que essa valorização, além de ser positiva e motivadora, também gera um maior compromisso com a mentoria. “Você cria uma vontade de participar que acaba resultando em retornos positivos para o programa como um todo”, complementa.

Deu match

Mas, afinal, o que deve ser levado em conta para garantir um match perfeito entre as pessoas? Segundo Álvaro, embora não exista uma receita de bolo, o RH tem alguns caminhos a seguir. O primeiro deles é evitar uma abordagem “top down”, como se a mentoria fosse um serviço a ser contratado ou prestado. Em vez disso, deve-se estimular a colaboração entre mentores e mentorados, com base em interesses comuns ou complementares.

Por isso, a seleção também precisa ser muito bem-feita para evitar combinações desinteressantes. Como especialista em pessoas, cabe ao RH identificar os perfis mais adequados para o programa de mentoria e engajá-los nessa missão – afinal, é a diversidade que alimenta a inovação. “Não adianta ter apenas pessoas ocupando vice-presidências técnicas, por exemplo. É essencial trazer pessoas de vários níveis e diferentes áreas para compor o quadro de mentores e poder conversar com os mentorados”, explica o COO.

Uma questão de afinidade e preparo

Bruna Bergamini, professora da Conquer Business School e head de Pessoas e Cultura na Pipefy, complementa a fórmula citando quatro fatores fundamentais para um match perfeito: competências técnicas, características pessoais, interesses e afinidade. Sim, mentoria também é uma questão de afinidade, pois uma parceria bem-sucedida tamém depende de uma relação saudável. “A afinidade entre ambos é crucial para o sucesso da mentoria, pois facilita a comunicação e o engajamento, criando um ambiente onde o aprendizado e a inovação florescem”, acrescenta.

Por outro lado, a afinidade sozinha não basta para fazer dar certo. Nesse cenário desafiador, o RH precisa garantir que o profissional escolhido para a mentoria esteja preparado para lidar com toda a inovação que poderá surgir dessa interação com o mentorado. Para Sandra Poltronieri, do Grupo Dreamers, o mentor também precisa passar por um processo de formação para que possa se comprometer genuinamente com o programa, de forma a oferecer as orientações necessárias. E o que isso significa? Sandra responde: “é oferecer trocas ancoradas em orientação de carreira, ampliação de network, aquisição de conhecimentos e habilidades, aumento da confiança, autoestima e motivação para crescer em suas carreiras”.

Foto: Reprodução/Freepik

Mentoria reversa

Entretanto, aqui vale um adendo importante. Quando falamos em troca, pressupõe-se que ambos os indivíduos estejam compartilhando saberes e vivências. Em outras palavras, a figura do “sábio” não existe, pois o aprendizado é valioso tanto para o mentor quanto para o mentorado, principalmente quando há uma diferença geracional envolvida. Segundo Sandra, a chamada “mentoria reversa”, que estimula essa interação intergeracional, vai além da transmissão de conhecimentos sobre tecnologias e tendências. Ela engaja as novas gerações a compartilharem sua visão de mundo, fazendo com que se sintam valorizadas. “Essa prática contribui para quebrar estereótipos sobre as novas gerações, ampliando a cultura inclusiva e diversificada e reduzindo as barreiras geracionais”, explica a porta-voz do Grupo Dreamers.

Na verdade, o que ocorre é um intercâmbio de saberes que ajuda os veteranos a lidar melhor com novas ferramentas digitais, ao mesmo tempo que amplia o repertório dos mais jovens. Bruna Bergamini, da Conquer Business School, acredita que esse tipo de mentoria é extremamente valiosa, pois beneficia a todos. “Esse intercâmbio não só fortalece a inovação, mas também cria uma cultura de aprendizado e respeito mútuo. É uma maneira eficaz de manter a organização atualizada e competitiva, além de promover um ambiente de trabalho inclusivo e colaborativo, onde todos se sentem valorizados e ouvidos”, afirma Bruna.

Foto: imagem gerada por IA – DALL·E

Perfil inovador

Em corporações com milhares de colaboradores e outras centenas de líderes, a escolha do mentor e do mentorado pode ser desafiadora. Mas, com uma seleção criteriosa, é possível identificar com clareza as qualidades almejadas em ambos. Segundo o porta-voz do Learning Village, o perfil ideal se destaca por ser alguém inquieto, questionador e trazer provocações constantes para a empresa. Pessoas que perguntam “por que é assim?” ou “podemos fazer diferente?” têm elementos de um comportamento inovador. “Elas têm um grande potencial para fomentar a inovação em cada área da empresa. Passar pela mentoria é fundamental tanto para a organização quanto para o crescimento pessoal e profissional delas.”

Uma das estratégias do Learning Village para identificar e atrair talentos é o fomento ao intraempreendedorismo. Através de concursos de ideias, os colaboradores são incentivados a propor soluções para desafios específicos e aplicá-las à realidade da empresa, caso sejam viáveis. Segundo Álvaro, esse tipo de iniciativa permite ao RH avaliar o potencial dos participantes e descobrir talentos ocultos, que muitas vezes permanecem escondidos em áreas onde a liderança não lhes dá visibilidade.

Inovação aberta

Se a mentoria já é capaz de alavancar soluções criativas e desenvolver potenciais líderes inovadores, imagine o valor que a troca com o mercado pode trazer para as organizações. Nenhuma empresa é autossuficiente; até as mais inovadoras precisam se conectar com o ecossistema para buscar novas soluções e conhecimentos. Esse conceito, chamado “inovação aberta,” funciona de maneira semelhante à mentoria, promovendo a troca de ideias e experiências para o crescimento mútuo, como bem explica Álvaro Machado, do Learning Village. “Quanto mais adotamos a inovação aberta e trocamos com pessoas de outras empresas, mais percebemos que os desafios são os mesmos.”

E, de novo, o RH tem um papel fundamental dentro da cultura de inovação, sendo um dos catalizadores dos programas de mentoria. Segundo o COO, essa troca de experiências entre pessoas que não estão necessariamente na mesma área, empresa ou posição é extremamente valiosa para o desenvolvimento tanto da companhia quanto dos indivíduos.


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