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A importância da saúde mental no ambiente de trabalho

Não é novidade a obrigação legal do empregador de assegurar um local de trabalho saudável, inclusive a cargo das micro e pequenas empresas. Saúde mental, porém, ganha novo amparo de lei

de Tadeu Henrique Machado em 14 de março de 2025
PCH Vector, via Freepik.com

De acordo com o Sebrae, as micro e pequenas empresas são responsáveis por 70% das novas vagas de trabalho criadas e por 30% do PIB brasileiro, de modo que a inequívoca abrangência desse perfil de empregador no mercado de trabalho nacional, possui um risco potencial de afetar um número significante de trabalhadores.

Por isso, e para assegurar que tais empregadores estejam em consonância com boas práticas e princípios corporativos mais sólidos, cabe a eles adotarem uma visão mais moderna e sustentável no que tange às relações laborais, e que lhes poderão servir de iniciativas positivas para um ambiente de trabalho mais sadio e seguro.

Um dos marcadores para avaliação mais ampla e qualificada das relações de trabalho, deve ser a saúde mental dos trabalhadores, e exige uma ação e um endereçamento global e não individualizado, sob pena de entender a saúde mental como dependente do indivíduo e não também do ambiente onde ele esteja inserido.

A avaliação baseada nesse marcador provoca uma mudança de paradigma ao garantir governança e segurança contra lesões, doenças físicas ou mentais nos ambientes corporativos, e com isso, maior produtividade da empresa.

Não é novidade a obrigação legal do empregador de assegurar um local de trabalho saudável, inclusive a cargo das micro e pequenas empresas, com obediência a todas as normas de saúde e segurança.

Por esse motivo, e tendo em vista um cenário produtivo mais competitivo, de maior flexibilização, fragmentação da cadeia, de automação, e de atomização de times de empregados, entre outros motivos, fica evidente que todo esse caldo de cultura pode impactar diretamente a saúde mental dos trabalhadores.

Nesse ponto, visando prestigiar a implementação de boas práticas pelas empresas no que tange a saúde mental no ambiente de trabalho, foi promulgada a Lei 14.831, em 27 de março de 2024, que instituiu o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental.

A implementação de programas de promoção de saúde mental no trabalho, a oferta de acesso a recursos de apoio psicológico ou psiquiátrico ao quadro de empregados, a conscientização sobre o valor da saúde mental, a capacitação da liderança, e o combate à discriminação e ao assédio em todas as suas formas, são algumas das boas práticas especificadas pela lei, e que servirão para demonstrar as intenções das empresas que busquem a certificação.

Apesar de a certificação ser facultativa, a nova Lei sinaliza um estímulo do Estado às empresas que aderem boas práticas de mercado. A possibilidade de elas poderem utilizar o certificado em suas comunicações internas ou em materiais promocionais durante o prazo de até dois anos de sua validade, mas com isso, exigindo que elas passem a revisar ou criar normativas internas mais sólidas e eficientes do ponto de vista de medicina e segurança do trabalho, traz consigo um potencial de melhorias, como aumentar as chances de reter e atrair talentos, melhorar consideravelmente a reputação corporativa, evitar períodos de absenteísmo ou turnover recorrente, além de evitar a judicialização de conflitos.

Por outro lado, recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu pela reintegração de uma reclamante demitida da empresa por ter transtorno bipolar, dado o caráter de estigma da doença e da conduta empresarial inadequada. Apesar de a reclamada ter apontado que a dispensa se deu por motivos econômicos, o Tribunal entendeu ter havido abuso de poder diretivo, segundo a decisão, pois os meios de dispensa discriminatória não são ostensivos, ao contrário, são “sutis, revestidos de superficiais formalidades, marcados pela utilização de expedientes que aproveitam determinadas situações para dispensar trabalhadores com problemas de saúde”.

Com esse exemplo pode-se observar que a Justiça do Trabalho tem demonstrado maior atenção e preparo para pautas como a da saúde mental, tanto do ponto de vista médico e do seu impacto na segurança do trabalhador, como também do caráter estigmatizante, exigindo, assim, mais conscientização e preparação dos envolvidos. Isso contempla a capacitação da liderança, a implementação de um canal mais aberto de comunicação entre gestores e subordinados, além de uma análise multidisciplinar da empresa, com a participação de mais de uma área, como RH, SESMT e Jurídico, com o fim de assegurar um olhar amplo e mais assertivo na resolução de problemas internos.

Não bastante a Lei 14.831, no ano passado também foi promulgada a Portaria MTE nº 1.419, que alterou alguns dispositivos da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-01), que estabelece as disposições gerais sobre segurança e saúde no trabalho, e cujas alterações passarão a ser obrigatórias a partir de maio de 2025.

As mudanças visam melhorar o gerenciamento de riscos ocupacionais, ampliar a abordagem sobre saúde mental no trabalho e reforçar as práticas de prevenção e comunicação. A seguir, são detalhadas parte das alterações que as empresas deverão adotar para atender às novas exigências.

1. Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (NR-01, item 1.5)

Traz uma nova diretriz que estabelece a implementação de um processo contínuo e sistemático para identificar, avaliar e controlar os riscos ocupacionais. Esse processo deve abranger não apenas os riscos físicos, químicos e biológicos, mas também os ergonômicos e, agora, os riscos psicossociais. A exigência de que as empresas adotem um Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) está mais detalhada, incluindo a análise de riscos de acidentes, lesões e impactos à saúde relacionados ao trabalho.

2. Riscos Psicossociais (NR-01, subitem 1.5.3)

Os riscos psicossociais envolvem fatores como estresse excessivo, assédio moral, violência no ambiente de trabalho e pressões psicológicas que afetam a saúde mental e emocional dos trabalhadores. As empresas deverão identificar tais riscos, avaliá-los e implementar medidas preventivas, como programas de apoio psicológico, políticas antiassédio e práticas de liderança saudável.

3. Avaliação de Riscos (NR-01, subitem 1.5.4)

A NR-01 também detalha o processo de avaliação de riscos, que deve ser realizado de forma contínua e sistemática. As empresas deverão classificar os riscos de acordo com a severidade e a probabilidade de ocorrência, garantindo que as medidas de controle sejam proporcionais aos riscos identificados. Este procedimento é essencial para determinar as ações preventivas adequadas a cada risco.

4. Direito de Recusa (NR-01, item 1.4.3)

A atualização da NR-01 fortalece o direito de recusa do trabalhador, que agora pode interromper suas atividades quando identificar um risco grave e iminente à sua saúde ou segurança, inclusive do ponto de vista mental ou psicossocial, por exemplo. A norma assegura que o trabalhador tenha autonomia para tomar essa decisão sem temer represálias. O empregador, por sua vez, deve adotar medidas corretivas para eliminar ou minimizar o risco antes de autorizar o retorno das atividades.

5. Comunicação de Riscos (NR-01, subitem 1.4.3.3)

A comunicação eficaz dos riscos entre trabalhadores e empregadores também foi abordada pela NR-01. As empresas devem estabelecer canais claros e eficazes para que os trabalhadores possam informar imediatamente sobre situações de risco aos seus superiores hierárquicos, garantindo uma resposta rápida e eficiente para eliminar os perigos identificados.

Verifica-se, então, um padrão de estímulo ao cuidado com a saúde mental, seja por meio da Lei 14.831, de ordem facultativa, como em decorrência da Portaria do MTE, cuja norma é cogente e aplicável a todos os empregadores, inclusive os de micro e pequeno porte, aliás, cujas fragilidades seriam maiores, e, portanto, mais sujeitas a fiscalizações, inclusive.

Por fim, vale mencionar que a Portaria 1.419 do MTE previa o prazo de 270 dias após a data de vigência, para que as empresas se adequassem às novas normativas da NR-1. Como o prazo finda em maio de 2025, abre-se uma janela de oportunidade para as empresas revisarem as suas práticas de segurança e saúde no trabalho, implementando as mudanças necessárias para garantir um ambiente mais seguro e saudável para todos os colaboradores, inclusive sob a perspectiva da saúde mental.

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Tadeu Henrique Machado

Sócio da área trabalhista da Cascione Advogados.