Apesar de a diversidade ser um tema cada vez mais presente no discurso empresarial, o apoio efetivo à população LGBTQIAPN+ no Brasil continua restrito e muitas vezes simbólico. O Censo GIFE 2022-2023 revela que apenas 19% dos investidores sociais atuam diretamente com essa causa, enquanto a maioria (49%) a trata de forma transversal, sem iniciativas específicas. Uma parcela ainda menor sequer considera o tema prioritário.
Rogério de Oliveira, presidente da OSC Casarão Brasil e coordenador do Centro de Cidadania LGBTI Cláudia Wonder, chama atenção para a superficialidade de muitos apoios empresariais. “As empresas privadas, em sua maioria, buscam apoiar ações LGBTI por se tratar de um mês festivo e que proporcionará visibilidade ampliada para seus produtos e serviços”, afirma. Segundo ele, o foco tende a se concentrar no Mês do Orgulho, deixando de lado a necessidade de um engajamento contínuo. “Há, também, uma agenda interna específica de comitês internos que abrange diversidade e inclusão. Então, esse apoio, neste sentido, é bem atrativo”, complementa.
Rogério acredita que esse quadro só mudará quando os setores de diversidade e inclusão, junto aos times de responsabilidade social, passarem a enxergar que o apoio à população LGBTQIAPN+ deve ser permanente. “Nosso foco, enquanto OSC, que trabalha prioritariamente com essa população, é dar vazão às necessidades básicas de nossos assistidos, derrubar qualquer tipo de barreira e mostrar, com dados, que é uma população que adere, sim, a serviços de saúde, educação e que busca outros horizontes e novos olhares para sobreviver e, também, viver suas vidas em plenitude, com respeito e visibilidade”, destaca.
Empresas ainda enfrentam entraves internos
Levantamentos realizados pelo Pacto Global da ONU, pela Rede Brasil e pelo Centro de Estudos de Trabalho e Desigualdades mostram que 60% das empresas têm dificuldades para implementar políticas de diversidade efetivas. O principal obstáculo apontado é a desinformação, que afeta 57% das organizações.
Rogério reforça que uma política inclusiva precisa ir além de ações simbólicas ou temporárias. “A criação de ambientes diversos é importante para a criatividade e busca de soluções fora da caixa. Muitas pesquisas e levantamentos de dados em todo o mundo demonstram que, quanto mais diverso for um ambiente de trabalho, com diferentes experiências de vida e processos, mais ele contribui para um espaço mais saudável e proativo”, argumenta.
Para o presidente da Casarão Brasil, o caminho passa por criar ações contínuas, com planejamento de longo prazo e parcerias sólidas. “A medida concreta é transformar planos pontuais em ações permanentes, trabalhando em conjunto com as OSCs e ONGs que atuam com a população LGBTI+ ao longo de todo o ano. Além disso, é essencial desenvolver planos estratégicos que incluam campanhas e doações ao longo dos 12 meses”, finaliza.
Brasil na contramão de movimentos internacionais
Nos Estados Unidos, grandes companhias como Meta, Amazon e Google reduziram investimentos em diversidade, incluindo cortes em vagas afirmativas, conforme levantamento do site Investing.com. Essa reorientação estratégica, motivada por pressões políticas e econômicas, já impacta subsidiárias e redes de negócios ao redor do mundo.
No entanto, o cenário brasileiro caminha em sentido oposto. De acordo com o Instituto Ethos, 80% das empresas no país consideram a diversidade uma estratégia essencial para a inovação e competitividade. Ao invés de recuar, o mercado nacional parece reforçar a importância de políticas inclusivas.
Oportunidade para liderar
Para Laura Salles, fundadora e CEO da PlurieBR — plataforma dedicada à gestão de dados em tempo real sobre diversidade, equidade, inclusão e pertencimento (DEIP) —, o momento é estratégico para o Brasil. “Empresas com forte presença internacional precisam equilibrar suas práticas entre as diretrizes de suas matrizes e as expectativas do mercado brasileiro, onde consumidores e investidores valorizam iniciativas de diversidade”, pontua.
Ela observa que, mesmo diante de um contexto global de revisão dessas políticas, o Brasil segue valorizando a inclusão. “A diversidade não pode ser tratada como uma tendência passageira ou uma questão ideológica. Ela tem um impacto real no desempenho organizacional e na capacidade de inovação das empresas. No Brasil, vemos um movimento de fortalecimento das práticas de DEIP, independentemente das revisões estratégicas que ocorrem em outros mercados”, ressalta Laura.
Diversidade com impacto: tendência para 2025
O futuro próximo aponta para um amadurecimento das políticas de diversidade, com foco em resultados concretos. Segundo Laura, atrelar as ações de inclusão às metas de desempenho corporativo será um passo essencial em 2025. “O sucesso das ações de diversidade depende da capacidade das empresas de medir e demonstrar seus resultados. Quando bem implementadas, essas iniciativas trazem ganhos concretos, como maior engajamento dos colaboradores e melhoria na reputação corporativa”, explica.
Na Europa, por exemplo, a Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Corporativa (CSRD), em vigor desde 2024, estabelece que empresas publiquem dados detalhados sobre suas ações em diversidade e equidade, exigindo uma postura mais transparente e comprometida com a inclusão.
Nesse contexto, especialistas acreditam que as empresas brasileiras têm uma chance valiosa de se destacar globalmente. “Com esse cenário em evidência, as empresas brasileiras que reforçarem suas estratégias de diversidade poderão se destacar no mercado e consolidar a inclusão como um pilar fundamental de suas culturas organizacionais”, conclui Laura.