Alexandre Garcia: cuidado com a burocracia disfarçada de complexidade / Crédito: Divulgação |
Criar um ambiente favorável à inovação e à criatividade não é um bicho de sete cabeças. Para atingir esse resultado, as empresas devem ter em mente a simplicidade como balizadora. Duas ações nesse sentido ajudam a organização a se transformar em um espaço inovador, conforme relata o consultor e professor nos temas relacionados à inovação, criatividade, estratégia e gestão do conhecimento Alexandre Garcia. Uma delas é reduzir os níveis hierárquicos. “Ao fazer isso, a empresa contribui para a aproximação das pessoas, fazendo com que a conversa flua mais e, assim, as ideias criativas tenham mais chances de se transformar em inovação”, diz.
Um segundo ponto muito importante refere-se ao método. “É muito difícil termos inovação contínua sem método, que não necessariamente precisa ser complexo. Estamos falando de algo que selecione as melhores ideias, transforme algumas em projetos e que faça com que esses projetos sejam desenvolvidos, prototipados para, por fim, a empresa possa colher os resultados [produto, serviço, processo]”, conta. A simplicidade aumenta a possibilidade de as pessoas participarem. “Sei que esse exemplo não pode ser aplicado em larga escala, mas conheço uma empresa que possui um método ‘no papel’, com bloquinhos anotados à mão. Para essa empresa, esse método funciona e não sei se ela precisa de um super software”, acrescenta. Muito provavelmente, essa não seja uma solução que sirva para empresas de porte maior, mas o que Garcia quer dizer é que antes de implantar um método é preciso analisar se ele é simples, se entrega o que a companhia precisa e não o que o “vendedor software” tem para oferecer.
Mas se é preciso buscar a simplicidade para inovar, isso significa que a complexidade atrapalha esse processo? Garcia diz que não. “Vejo que a complexidade do mundo atual puxa, estimula e até força as empresas a buscarem a inovação. E entendo a gestão do conhecimento como matéria-prima para a inovação. Por outro lado, olhando para dentro da empresa, temos de ter cuidado com a burocracia disfarçada de complexidade, o que é muito diferente”, explica. A burocracia, ele lembra, é por origem algo positivo que teve seu sentido convertido para algo ruim. “Mas o que ocorre é que às vezes as empresas ao buscarem a inovação não conseguem ser simples.” E por que isso ocorre? Ele acredita na existência de diversos motivos, mas cita apenas um: há um senso comum em que quem fala simples não é tachado de inteligente, e o contrário ocorre com quem fala complexo. “Ou seja, muitas vezes, as soluções são simples, os executivos é que as complicam para passarem a impressão de eruditismo.”
Pensar o estratégico
E como a simplicidade pode ajudar na sobrevivência dos negócios? “Essa é a grande questão do CONGREGARH!”, diz Garcia, que fará a palestra A simplicidade com inovação e gestão do conhecimento, no dia 5 de setembro. Ele acredita que existam diversas frentes que precisam ser pautadas pela simplicidade. E, por essa razão, é preciso analisar todas as ações (internas e externas) de uma empresa para buscar simplificar com eficiência e melhorar os resultados. “Não vamos ser ingênuos de achar que basta simplificar os processos; isso pode trazer problemas graves. Em suma, imagino uma empresa confeccionando um grande painel com a palavra ‘simplicidade’ e a partir daquele dia todas as ações devem ser aprovadas ou reprovadas em função da aderência a esse conceito. Acredito que assim sobraria mais tempo para o pensar estratégico, que é o que pode fazer o negócio prosperar.”
#Q#
E para fazer o negócio prosperar é preciso que a empresa tenha em mente que a informação e o conhecimento são fatores diferenciais para a competitividade. Garcia acredita, quanto à informação as empresas estão atentas e preocupadas. Já no que se refere à transformação da informação em conhecimento… é algo que ele não tem tanta certeza. “Penso que há algumas barreiras para o gestor ocidental que de certa forma atrapalham esse processo como, por exemplo, a utilização de metáforas, a redundância e a aceitação do risco. As informações nos ajudam até certo ponto; a partir daí o que vale é o conhecimento gerado pela associação das informações com outras ideias e variáveis, que não necessariamente precisam ser cartesianas.”
Ele acrescenta que há certo preconceito em tentar fazer as coisas de forma mais fluida e isso acaba barrando a consolidação do conhecimento e a inovação. “Veja o caso da Honda que, no início dos anos 1980, lançou o carro que revolucionou a indústria automobilística a partir de uma grande metáfora: a Honda queria ‘a evolução do automóvel’. Então, foi utilizado o pensamento de que ‘se o automóvel fosse um ser vivo, como ele evoluiria?’ Surge o Honda City, um carro alto, curto e completamente diferente do status quo da época. Imagine algo desse tipo acontecendo em nossas empresas!”
Para Garcia, tanto a inovação quanto o processo de gestão do conhecimento precisam de mudanças na cultura organizacional. A pergunta que fica é: quem na organização estará preocupado, disposto e tem conhecimento necessário para mudar a cultura? “Temos algumas opções: o pessoal da logística, da controladoria, TI, contabilidade, comercial, engenharia? Parece que a resposta mais adequada seria o RH, que foi treinado para gerir gente e cultura”, diz Garcia. Sendo assim, o papel da área é mostrar para a alta cúpula da empresa a importância da gestão mais participativa, os ganhos que a empresa pode ter com a diversidade, os benefícios da objetividade, a necessidade de se aceitar riscos, além de outros temas vinculados. “Porém, de nada adianta a ‘voz do RH’ falando se os líderes não estiverem dispostos a ouvir. Dessa forma, tudo passa por uma reflexão no que se refere à cultura necessária caso a empresa esteja precisando inovar e, acredito, todas elas estão.”