BlogaRH

Intimidade artificial cresce nas relações de trabalho

Comportamento faz com que evitemos conflitos e conversas difíceis, mas também cria barreiras para aceitar pensamentos diversos e divergentes

de Maria Eduarda Silveira em 12 de abril de 2023
PCH Vector, via Freepik.com

Recentemente, participei da SXSW, maior feira de inovação e tecnologia do mundo que acontece todos os anos em Austin, no Texas. Sou curiosa, adoro sentir frio na barriga e beber da fonte quando o assunto é desenvolvimento, negócios, inovações e temas que podem aprimorar a minha vida profissional e pessoal. O que eu não esperava é que para muito além do conteúdo dos painéis, eu seria tão impactada pela fonte de energia vinda de outras pessoas, de diferentes lugares do mundo, com backgrounds diversos, executivos, empreendedores, pesquisadores, futuristas, terapeutas, chefes de cozinha, etc.

Se engana quem pensa que na SXSW só se fala sobre tecnologia. Muito foi abordado sobre seres humanos e o que nos torna únicos. Fui surpreendida pela palestra da psicoterapeuta e professora da Universidade de Nova York, Esther Perel, onde ela fala sobre a intimidade artificial que estamos vivendo. Relacionamentos criados e mantidos por meio de tecnologia e a ansiedade por respostas rápidas e, muitas vezes rasas, fazem com que os relacionamentos contemporâneos não somente de trabalho, mas também os pessoais se tornem pouco profundos. A disputa entre uma conversa com um amigo e a tela do celular se torna cada vez mais presente, fazendo com que a nossa atenção esteja sempre dividida e nossa capacidade de escuta e de conexão altamente comprometida.

Diante dessa aclamação provocativa da Esther, faço a conexão com dois outros temas que vi por lá e que refletem diretamente nos desafios corporativos que estamos vivendo atualmente. Primeiro deles é saúde mental e bem-estar no trabalho: um dos pilares mais importantes quando falamos sobre esse tema é a qualidade dos relacionamentos dentro da empresa. Não é à toa que indicadores de turnover e baixa produtividade estão ligados a ambientes e relações pouco saudáveis.

A palestra da Amy Gallo, autora do livro “Getting Along: How to Work with Difficult People” trouxe de forma muito prática sobre como lidar com pessoas difíceis no trabalho. Também apontou dados expressivos: segundo a pesquisa realizada pela Resume Lab em 2022, 80% dos respondentes dizem que tem pelo menos um colega de trabalho considerado “terrível”, sendo que para 83% isso impactou negativamente no próprio desempenho. De fato, percebemos que as relações de trabalho impactam diretamente na experiência vivida pelos profissionais dentro da organização. Mas, ela também traz uma provocação no sentido de analisarmos o que é uma pessoa difícil para nós? Por que temos dificuldades em lidar com essa pessoa? Onde a nossa própria personalidade ou vieses impactam para que essa relação seja difícil? O autoconhecimento se mostra cada vez mais relevante na era artificial.

Ligando os pontos ainda com a fala de Ester Perel, ela traz como a intimidade artificial faz com que evitemos conflitos e conversas difíceis, vendo essas situações como uma barreira para aceitar pensamentos diversos e contextos diferentes da perspectiva que conhecemos. Fugimos das conversas difíceis, corremos para as telas e para um “conforto artificial” que nos distancia de relacionamentos maduros, honestos e prósperos. Evitamos o desconforto imediato e corremos o risco de prejudicar a nossa própria carreira no longo prazo.

Os parágrafos acima refletem as competências que precisamos desenvolver como seres humanos. Habilidades de relacionamento e coragem para enfrentar os conflitos de forma madura e empática podem parecer “simples” de se desenvolver, mas como profissional da área de pessoas, posso afirmar que os maiores desafios de gestão e desempenho de times acontecem por falta dessas habilidades dentro das empresas.

Por fim, outra habilidade humana inquestionável é a capacidade de olhar além, de ter senso crítico para se provocar e avaliar as coisas sob uma ótica que está fora da nossa bolha. Apesar de falarmos sobre tamanha diversidade de assunto e da quantidade de inovações presentes em um festival como a SXSW. Devemos reconhecer que ainda é acessível para poucas pessoas e que estar nesse ambiente é um grande privilégio.

Aproveitar todo esse networking e riqueza de conteúdo para fazer algo de impacto para nosso meio é algo que a tecnologia pode ajudar, mas não fará sozinha. Muito foi falado sobre a consciência das empresas em temas como responsabilidade social e projetos de impacto, onde por meio de educação e ações direcionadas do mercado, podemos aumentar a geração de oportunidades e novos empregos para a sociedade. Como empreendedora e headhunter, voltei com uma forte inquietação para tirar projetos do papel de forma mais objetiva, onde por meio do meu trabalho e das minhas conexões, posso impactar ainda mais na empregabilidade de muitas pessoas. Acredito muito na educação e no mercado de trabalho como ferramenta de mudança e, se estou inserida nesse meio, pensar em como contribuir é como um dever.

São muitos os insights, reflexões e aprendizados que trouxe na minha bagagem de volta. Entre eles, a certeza de que manter a mente aberta e a capacidade de continuar aprendendo são fundamentais para se manter viva. Viva não somente no mercado de trabalho, mas viva como ser humano, vibrando com o frio na barriga que existe quando estamos a frente de algo novo que nos desperta para sermos melhores, mais curiosos, mais corajosos, mais bold.

A liderança que quer fazer a diferença precisa estar aberta e ter coragem para sair de zonas conhecidas, tendo a humildade de reconhecer que estamos em constante aprendizado. A nossa evolução acontece quando expandimos e, é a partir daí que o futuro se constrói.

Que venha a SXSW de 2024. Até lá, temos muito trabalho a fazer. Let’s do it!

Compartilhe nas redes sociais!

Enviar por e-mail


Maria Eduarda Silveira

Sócia-fundadora da consultoria de recrutamento e desenvolvimento BOLD HRO