Por Fabíola Lago
Nathalie Trutmann, 42 anos, tinha um grão de areia que a incomodava. Usou a metáfora da ostra e a pérola para falar de vulnerabilidade em sua palestra no CONARH 2016, contando sua própria história de vida pessoal e profissional. Com uma excelente formação, MBA pela Insead, considerada uma jovem de talento com alto potencial pela empresa, uma multinacional, Nathalie olhava ao redor e se perguntava: como as pessoas à sua volta pareciam tão confiantes, tão certas, com tantas respostas para tudo, tão bem vestidas, sem rugas ou manchas na pele? Como podiam ser tão diferentes dela, com tantas dúvidas diante da complexidade do mundo profissional e da própria vida?
Em sua palestra, Nathalie, que facilmente seria tomada como uma budista por sua simplicidade, conta como seu grão de areia, que parecia tão inadequado, tornou-se a voz que a definiu como pessoa e profissional. Foi em 2004, durante um intercâmbio profissional no Srilanka – 10 dias antes de uma catástrofe natural-, que decidiu que já não cabia mais no mundo corporativo.
Pediu demissão, seu superior questionou, fez nova proposta, melhor remuneração, o RH tentou persuadi-la, mas foi quando um dos diretores disse que “achava até boa sua demissão, já que na última avaliação observamos que seu excesso de honestidade poderia ser prejudicial aos negócios da empresa”, que ela selou sua decisão. Não sabia ainda o que faria, mas tinha convicção que aquele trabalho já não fazia mais sentido.
Veio para o Brasil, trabalhou como artesã na Praça Benedito Calixto, conheceu outras tantas pessoas que tinham seus incômodos como ela e aos poucos percebeu que na verdade, essa inquietação é de todos, mas aquelas pessoas perfeitas tinham mais competência para disfarça-la do que ela.
Passou a trabalhar com Educação. Casou, teve filhos e aquela que seria vulnerabilidade, seu incômodo, acabou por ser um de seus maiores valores, sua marca, digamos, sua pérola, que a definiu como uma profissional diferenciada. Hoje, como diretora geral da Hyper Island Latan, escola sueca de inovação, reconhecida em todo o mundo por sua excelência, ela repassa seus valores de coragem, transparência, persistência para centenas de alunos e empresas, inclusive no CONARH 2016.
“Acredito que, felizmente, com toda conexão que a tecnologia proporciona, existem sim mudanças na forma de fazer negócios. A 24h Fitness, com 23 mil funcionários, por exemplo, estimula que seus funcionários façam uma roda no início do expediente e escolham palavras que serão ponto de reflexão para o dia. A diretora costuma enviar um mail semanal para todos contando qual foi o principal desafio de sua semana. Duas atitudes muito simples que humanizam e mostram que as dificuldades são de todos. Mostrar-se também vulnerável, fazer perguntas, questionar, é fundamental para criar um ambiente de confiança com credibilidade”, analisa a ex-artesã.
Hoje, Nathalie conta com orgulho que, como educadora, voltou a trabalhar com o mundo corporativo. E como, desde 2004, tudo mudou. Não havia Uber, Whatsapp, Airbnb e o Facebook acabava de ser lançado com a expectativa de poucas centenas de usuários. Também mudaram as lideranças e valores das empresas. Ninguém poderia imaginar como o mundo estaria hoje, 12 anos depois.
“Apesar de toda tecnologia, o mundo ainda é feito de pessoas. É preciso ter empatia com os colegas, com fornecedores, clientes. Fazer testes e aprender com erros. Porque não conseguimos acompanhar a velocidade de tantas transformações. Temos que honrar nosso passado, sabendo que nada está garantido para o futuro”, concluiu a pérola. Ops, Nathalie.