Inovação

Recrutamento com IA: a inovação no coração do RH estratégico

À medida que a IA se integra cada vez mais aos processos de seleção e recrutamento, o RH deve equilibrar a inovação com a manutenção de um “toque humano” na gestão de pessoas

de Priscila Perez em 19 de julho de 2024
IA, recrutamento e inovação em RH Foto: Reprodução/Freepik

Quem nunca passou pela experiência de ser entrevistado e perceber, na hora, que estava “fora do escopo” da vaga, ou teve que lidar com um recrutador mal-humorado, que atire a primeira pedra. Com a inteligência artificial (IA) cada vez mais presente no RH, a expectativa é que o processo de recrutamento se torne mais preciso e focado nas habilidades e competências que realmente importam para promover uma cultura de inovação.

No entanto, entre a expectativa e a realidade, há muitos desafios a serem superados, como a integração da IA com as práticas de RH existentes e a garantia de que os algoritmos utilizados sejam imparciais. Não por acaso, a automação no RH é motivo de controvérsia entre os candidatos, que questionam a transparência da tecnologia nesse processo. Do lado deles, a principal reclamação é que a IA pode ser imprecisa devido aos filtros aplicados na seleção, resultando na exclusão de talentos qualificados – o que também ocorre quando a entrevista é enviesada. Já para as organizações, a IA representa a oportunidade de preencher as vagas de forma mais rápida e eficiente com candidatos que atendam exatamente às suas necessidades.

Uma questão de equilíbrio

IA, recrutamento e inovação em RH
Marcelo Galante, da Dasa

Nessa queda de braço com a IA, o que não pode ser sacrificada é a cultura de inovação que impulsiona as organizações a encontrar soluções para simplificar e revolucionar as tarefas cotidianas. Como especialista em pessoas, o RH tem a missão de equilibrar a adoção de novas tecnologias com a manutenção dos valores humanos, garantindo que a inovação seja integrada ao processo de recrutamento de maneira consciente. É o que aponta Marcelo Galante, Diretor de Recursos Humanos da Dasa, uma das maiores redes de saúde integrada do Brasil.

Embora a inteligência artificial torne o processo de seleção mais objetivo e menos propenso a erros, Galante ressalta que é fundamental assegurar que as pessoas continuem no centro de toda e qualquer decisão ou estratégia. “Mesmo sendo treinada e não considerando alguns fatores tais como cor, gênero e raça, a ferramenta tende a mapear perfis com características similares em termos de trajetória profissional, escolaridade, cargo etc. Nesse sentido, vale redobrar a atenção para que os ‘filtros’ da IA não levem à perda da humanização do processo,” analisa o especialista.

Para evitar incoerências, o diretor de RH aposta no desenvolvimento de líderes e recrutadores para que possam treinar a IA de forma assertiva, com dados que reflitam os valores da empresa e seu compromisso com a diversidade. O objetivo é garantir o mapeamento de perfis diversos, que agreguem à equipe pessoas com diferentes habilidades, experiências e perspectivas. Educar a IA, portanto, é imprescindível para se alcançar esse patamar de excelência. “É preciso estar atento aos dados e identificar o padrão dos perfis destacados e assim garantir que a seleção aconteça de forma justa e inclusiva”, reforça Marcelo Galante.

Ética e clareza

Quando se trata de recrutamento, o uso de IA pelo RH exige processos bem definidos e uma jornada digital (e de inovação) bem estruturada. Isso inclui, por exemplo, a constante revisão dos algoritmos para garantir sua precisão e equidade. Os critérios de seleção também precisam ser transparentes, assim como os dados que fundamentam a escolha de um candidato em detrimento de outro. Obviamente, esse nível de transparência não só fortalece a confiança no processo de recrutamento, como também assegura que as decisões tomadas com base nas informações fornecidas pela IA estejam alinhadas às necessidades da empresa.

IA, recrutamento e inovação em RH
Marcelo Braga, da Reachr Soluções Inovadoras em RH

Marcelo Braga, CEO e fundador da Reachr Soluções Inovadoras em RH, destaca que todas as soluções aplicadas devem apresentar termos de uso claros, evidenciando quais dados são utilizados no processo seletivo. “É fundamental deixar todos os limites e zonas cinzentas bem claros para todos. Isso inclui mostrar como os candidatos serão avaliados, quais ferramentas serão utilizadas e quais dados a empresa terá à disposição, tanto para contratar novos funcionários quanto para promoções internas e avaliações de desempenho”, reflete.

Empatia e agilidade

Com a devida transparência, a IA se tornará muito em breve uma ferramenta eficaz para fornecer respostas rápidas, semelhante ao papel desempenhado pela internet atualmente. Mas, como bem pontua o especialista, a sua implementação deve ser gradual e equilibrada, combinando o “olhar humano” com a agilidade do digital. Dessa forma, o RH pode maximizar sua eficiência por meio da IA sem perder a tão valiosa empatia que é essencial no gerenciamento de pessoas.

Na parte operacional, Braga cita várias atividades repetitivas que a IA pode realizar, permitindo que os recrutadores assumam uma posição mais estratégico e focado na experiência do candidato. “A IA pode atuar na triagem e no ranking de candidatos, apoiar na construção de descrições de cargos e nas devolutivas”, exemplifica. A ferramenta ainda é útil para gerir indicadores, construir réguas de comunicação, criar posts para redes sociais, analisar candidatos e espelhar perfis para novas contratações

IA, recrutamento e inovação no RH

Se há uma fórmula mágica para a inovação nas organizações, ela certamente envolve um RH moderno e estratégico que vê na tecnologia uma poderosa aliada para aprimorar a gestão de pessoas – sendo o recrutamento um dos processos mais impactados. Em vez de receber milhares de currículos e avaliar apenas uma parte deles, a IA permite analisar todos os candidatos de forma padronizada, utilizando palavras-chave e critérios de comportamento. A partir dessas métricas, as organizações podem, inclusive, mapear perfis com mentalidade inovadora, com capacidade de influenciar e liderar mudanças internas.

Segundo o porta-voz da Dasa, Marcelo Galante, o processo se torna mais ágil e preciso quando o RH estabelece um modelo de contratação direcionado a perfis específicos. Dessa forma, o match com a cultura organizacional é significativamente aprimorado, o que também contribui para a antecipação de tendências e habilidades futuras. “Além disso, a IA possibilita o cruzamento de dados analíticos, não apenas durante o recrutamento e seleção, mas também oferecendo insights valiosos para entender melhor os colaboradores”, complementa.

IA, recrutamento e inovação em RH
Foto: imagem gerada por IA – DALL·E

Tecnologia sem preconceitos

Revisitando a questão inicial, é evidente que os processos seletivos sempre foram suscetíveis aos chamados “vieses inconscientes”. Esses preconceitos sutis podem afetar as decisões de contratação, levando à exclusão de candidatos por motivos irrelevantes. Já com o uso da IA, os processos de recrutamento e inovação no RH podem ser pautados exclusivamente por competências técnicas e comportamentais, sem a interferência de fatores subjetivos. Mas isso não torna a questão menos complexa ou desafiadora.

Segundo Marcelo Braga, CEO e fundador da Reachr, o uso pleno da IA pelo RH ainda é incipiente por duas razões principais: qualidade dos dados e custo. A primeira está relacionada à falta de informações confiáveis. Muitas empresas utilizam descrições de cargos genéricas, e os currículos dos candidatos nem sempre são precisos. Além disso, as informações coletadas durante o processo seletivo muitas vezes se perdem em anotações não gerenciadas adequadamente pela empresa. Os motivos de aprovação e reprovação também são pouco documentados, dificultando o trabalho posterior. “Ou seja, a qualidade dos dados ainda é ruim. Mas tende a melhorar com o tempo, à medida que as empresas forem entendendo o poder do ‘bom uso de dados’ nos processos seletivos”, pondera.

Além da ausência de dados confiáveis, o custo da IA também é alto. A cada nova seleção, novos dados são recebidos, exigindo uma maior capacidade de armazenamento e processamento. Isso implica em investimentos não somente em infraestrutura e tecnologia, mas também em profissionais especializados para gerenciar e otimizar esses sistemas.

Foto: Reprodução/Freepik

O poder da IA

Contudo, a grande questão é: o RH está realmente preparado para abraçar essa onda de inovação? Uma pesquisa da Ticket, marca da Edenred Brasil, com mais de 300 profissionais de RH, revelou que a maioria está animada com o uso de IA e acredita que ela impactará positivamente a área nos próximos cinco anos. Entre os jovens de 16 a 26 anos, 100% confiam no poder da IA para melhorar a atuação do RH. Já entre os colaboradores mais experientes, de 43 a 49 anos, 92% deles são otimistas em relação à ferramenta.

Entretanto, apenas 36% dos jovens têm um bom entendimento da IA para uso profissional, o menor índice entre as gerações, o que surpreende Natália Ghiotto, diretora de Produtos da Ticket, dado que essa geração já nasceu na era digital. “Esses resultados são um parâmetro para as empresas planejarem seus treinamentos e ações para inserir profissionais de RH no universo da IA. Notamos que as pessoas estão otimistas e isso não se restringe às gerações tidas como nativas digitais, como a Z e a Y”, reflete Natália.

O futuro pertence à IA?

A integração da IA no RH promete uma revolução ainda mais abrangente no futuro, impulsionando não somente o recrutamento de talentos, mas todas as áreas relacionadas à gestão de pessoas. Na visão de Marcelo Braga, a IA estará presente nos processos de admissão, onboarding, folha de pagamento, avaliações de desempenho e departamento pessoal. “Já existem movimentos nessa direção”, salienta.

Assim como a revolução tecnológica mudou e criou novos cargos, ele acredita que a IA seguirá a mesma lógica: “até 2030 muitas posições não imaginadas serão criadas e outras deixarão de existir”. E tudo indica que essa mudança será ainda mais rápida do que a transformação trazida pela internet.


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