Foi uma área em que, por muito tempo, os desavisados acharam dispensável o domínio do padrão culto do idioma. Mas no mundo corporativo, em que a lógica dos lucros e prejuízos norteia as preocupações cotidianas, cada vez mais executivos se preocupam com a eficácia da comunicação no trabalho e dedicam-se ao aprendizado da língua portuguesa – sobretudo em épocas de acordo ortográfico.
No entanto, alguns vícios ainda persistem no dia a dia empresarial, muito embora já exista a consciência de que o uso do idioma pode ser a diferença entre um desempenho eficaz e o fiasco nas relações internas das corporações, na interface externa de suas operações, e em reuniões de trabalho e negócio. Daí a onda de profissionais preocupados com a própria formação e ciosos da credibilidade da empresa que representam a procurar cursos de aperfeiçoamento. Aqueles que leem menos acabam recorrendo a programas intensivos para absorver de forma rápida um conhecimento que, em geral, se construiria ao longo de uma vida.
A sócia-diretora da Companhia de Idiomas, Ligia Velozo Crispino, já perdeu a conta das empresas a que atendeu com praticamente todos os colaboradores apresentando deficiências sérias no trato com a língua, em cargos como os de gerência, dos quais normalmente se espera uma formação mais consistente. Ela assinala que os erros mais comuns são os de concordância e regência verbal, além de ortografia (“experiência” com s ou “ansiedade” com c, por exemplo, são comuns), a maioria perpetrada na comunicação por internet. “Você não detecta tantos erros em relatórios quanto em e-mails. Esse tipo de mensagem proporciona um nível de informalidade muito grande. Profissionais mais jovens, principalmente, escrevem tudo em letra minúscula e não colocam acento – o que acontece, na maioria dos casos, por causa da necessidade de se comunicar de forma rápida”, afirma Ligia.
A diretora associa o uso do idioma a um cartão de visita. “Se você está num cargo de maior destaque, obviamente estará mais exposto. Sendo assim, imagine um diretor de marketing, um relações públicas, com a responsabilidade de representar minha empresa: que imagem ele vai passar se comete muitos erros de português?”, questiona.
A publicitária Marlisi Rauth, que trabalha como analista de comunicação e consultora de marketing em Curitiba, destaca o uso indevido do pronome oblíquo (“te mandei um arquivo”, por exemplo), que, embora seja tolerado na comunicação oral, não é recomendado na comunicação escrita ou em situações mais formais. Outra afronta ao idioma são os vícios de linguagem, diz Marlisi, como “a nível de”, além de mencionar o clássico “para mim fazer” como erro fatal, que pode gerar uma impressão muito ruim.
“Há muitos sites e peças de comunicação empresarial repletos de erros, mas isso é bem mais freqüente no dia a dia das empresas. E esse é o grande problema, porque as pessoas acabam se acostumando com alguns deles”, afirma Marlisi.
Inversão
Gerson Correia, sócio da Talent Solution, empresa de seleção de executivos, já presenciou muitos maus tratos à língua que comprometeram negócios. Segundo ele, se um profissional mais experiente ainda comete erros primários, é porque nunca teve feedback. “Um cliente de uma empresa de tecnologia estava prestes a fechar um negócio, e a certa altura cometeu um erro referente à grafia de uma palavra comum, do dia a dia. Pegou mal e o negócio acabou desandando, pois causou uma péssima impressão”, lembra Gerson, que também ataca o uso de gírias na comunicação corporativa. “Em alguns segmentos, como o da publicidade, as gírias são toleráveis, mas em grande corporações, por exemplo, é de bom tom evitar expressões mais informais”, recomenda.
Em certas situações, a informalidade está a tal ponto instituída na comunicação que o uso normativo da língua se torna vítima de preconceitos. “A ênclise [coloção do pronome depois do verbo] hoje é motivo de crítica, e muitos consideram pedantismo. A expressão com gerúndio também parece ser regra, em vez do futuro do presente. De modo que, quando se ouve a forma certa, soa esquisito, como se o correto fosse estranho”, explica Correia.
Promoção
Uma pessoa que apresenta dificuldades para se comunicar tende a ter maiores contratempos numa empresa. Quanto mais se evolui na hierarquia maior será a cobrança pelo desempenho. No que se refere à expressão, essa evolução será medida, entre outros fatores, por um bom vocabulário e pela capacidade de se expressar com precisão e clareza em situações cotidianas. Lígia, da Companhia de Idiomas, explica que há pessoas que, por tempo de casa, são promovidas apesar de continuarem com problemas de comunicação. “Nesses casos, a empresa se vê obrigada a investir nesse funcionário para ensinar-lhe o idioma. E se numa empresa a equipe se comunica melhor do que o líder, você tem um problema. Não será um curso de 40 horas que irá solucioná-lo, pois isso vem da família, da educação”, afirma Lígia. Para esses casos, ela defende um trabalho mais prolongado, que proporcione leituras e atividades variadas para que os funcionários não fiquem “bitolados” na cultura empresarial.
Mas, embora a falta de domínio da língua implique restrições ao crescimento profissional de um executivo, a consultora Marlisi Rauth não crê que a incidência de erros seja motivo para demissão. “Uma pessoa que não saiba escrever ou falar corretamente muito provavelmente terá dificuldades de se expressar. Sem saber se expressar, o profissional pode acabar falando o que não deve, ou pode não ter capacidade de persuasão e justificativa em momentos delicados, por exemplo. E, aí sim, pode colocar muito a perder”, explica Marlisi.
A consultora recorda-se de uma empresa onde trabalhou que desclassificou muitos candidatos a vagas de emprego por terem ido mal na prova. “Vi muita gente perder sua chance de contratação por causa do português.”
Tudo indica que, excetuando-se os lapsos, cada vez mais frequentes ante a rapidez que a vida profissional exige, os erros de português têm sempre a mesma base: a falta de leitura. Marlisi defende que um profissional, sobretudo de alto escalão, estabeleça para si uma rotina de leituras – não só de jornais e revistas, mas também de livros – e torne-se “íntimo” do idioma, incorporando a forma culta ao seu dia a dia. Uma pessoa que escreva errado pode acabar sendo tachada de ignorante pelos colegas de trabalho.
Objetividade
A jornalista Arlete Salvador, autora dos livros A arte de escrever bem e Escrever melhor (ambos da editora Contexto, 2004 e 2008, respectivamente), em parceria com Dad Squarisi, também considera “erro” a falta de objetividade que vitima o uso da língua nas empresas. Ela alega que a incapacidade de se expressar com clareza pode manifestar-se em textos muito longos e com palavras em excesso, sendo a maioria delas, em muitos casos, desnecessária. “O resultado disso é que o texto fica prolixo e o autor arrisca-se a cometer mais erros gramaticais e ortográficos. Uma das coisas mais irritantes para executivos de alto escalão é receber relatórios longos e incompreensíveis. Sabe aquele tipo de documento que o diretor lê e pergunta: “Meu Deus do céu, o que ele quis dizer com isso?”, ataca Arlete.
O exagero de palavras, também conhecido como verborragia, pode ser um sinal de dificuldade para expor ideias ou intenções, o que pode, do ponto de vista dos negócios, resultar em ineficiência, queda de produção e consequentemente prejuízos. Além disso, jargões e palavras de efeito podem mascarar informações inócuas ou mal organizadas, revelando a falta de concisão de quem produziu o texto. E, neste caso, os maiores prejudicados são a própria empresa e, infelizmente, o idioma.
Para não errar Alguns vícios de linguagem que podem arranhar a imagem do profissional |
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O mesmo Junto a Concordância do verbo “haver” Onde Menos Crase O Gerundismo Anexos Regência de “implicar” Pagar Dupla regência Cuidado: Comunico-o = comunico o horário Comunico-lhe = comunico ao funcionário. Há outros verbos cuja regência é, normalmente, empregada de forma inadequada no ambiente corporativo: “Sair de férias”. O correto é “sair em férias” “Chegar ou ir no escritório”. O correto é “chegar ou ir ao escritório”. Enquanto |