Carreira e Educação

O futuro do e-learning

de Carolina Sanchez Miranda em 12 de novembro de 2014
Alex Augusto / Crédito: Divulgação
Alex Augusto, da Ciatech: conteúdo flexível e conteúdo fragmentado / Crédito: Divulgação

O e-learning entrou definitivamente no cardápio da educação corporativa. Mas será que o ensino a distância vai gradativamente substituir o ensino na sala de aula? A resposta de um estudo encomendado pela Ciatech, do UOL Educação, para essa pergunta é não. “É um erro pensar que a educação a distância vai substituir a presencial. Acreditamos na evolução, não na revolução. Nada que surge descarta o que já existe, mas complementa. O aprendizado on-line complementa as estratégias que as universidades corporativas têm hoje. O presencial pode ficar focado na experiência, na troca de informações”, afirma Alex Augusto, CEO da Ciatech.

Essa visão de “evolução em curso” é a primeira das dez tendências apontadas pelo levantamento, que compila ideias, conceitos e dados coletados e selecionados em publicações nacionais e internacionais sobre o futuro da educação.

A segunda delas é a oferta do “conhecimento acessível” em diferentes dispositivos tecnológicos, considerando que os profissionais não limitam seu tempo de aprendizagem e busca de informação ao tempo em que estão conectados no desktop. Esse acesso acontece também pelo smartphone e pelo tablet, dependendo do período do dia e dos compromissos de cada um. No caso de equipes de campo, por exemplo, o melhor meio para acessar informações é pelo celular.

Segundo, Daniel Orlean, sócio-diretor da AfferoLab, o desenvolvimento de programas que mesclam conteúdo presencial e a distancia, acessível tanto pelo desktop quanto em dispositivos móveis, já está se tornando uma realidade e tem nome: blended learning. “Percebemos o uso cada vez mais intenso do blended learning para criar uma experiência mais completa. O mundo é blended. Quando me relaciono com alguém, eu falo cara a cara, por telefone, pelo Facebook. Posso começar um curso em sala de aula, continuar no tablet, receber pílulas de vídeo pelo celular etc.”, explica.

Na visão de Augusto, da Ciatech, nesse cenário, o desafio para os gestores de educação corporativa é adequar o conteúdo dos cursos para os meios móveis. “O método educacional é completamente diferente no desktop, no tablet e no smartphone.”

Eu aprendo, tu aprendes, nós aprendemos
A maioria das pessoas está conectada o tempo todo em redes de relacionamento. A troca de informações é algo natural fora do ambiente de trabalho e passa a ser uma demanda também para a educação corporativa, especialmente entre os jovens da geração Y.

A aprendizagem colaborativa, promovida a partir do “saber social”, é a terceira tendência apontada pelo levantamento e representa uma mudança cultural dentro das empresas. O uso de redes sociais corporativas ou mesmo o uso das redes sociais para fins corporativos ainda é tímido e envolto em muito receio. “A grande maioria dos gestores de projetos de e-learning acha que em um ambiente de colaboração as pessoas se desviariam do tema do curso”, comenta Augusto. “Por isso, saber social é algo que está engatinhando. Temos menos de meia dúzia de cases de sucesso nessa área, mas são de empresas que entenderam o desafio. Há casos de companhias que desenvolveram melhoria de produtos pela interação em ambientes colaborativos com as pessoas que os comercializavam”, complementa.

#Q#

Daniel Orlean / Crédito: Divulgação
Daniel Orlean, da Affero Lab: aposta no blended learning / Crédito: Divulgação

Aprendizado colaborativo
Para Orlean, da Affero Lab, a troca de conhecimento por meio de comunidades virtuais é uma forte tendência. “Antigamente, enfrentávamos o problema de usar uma coisa nova, que ninguém usava fora da empresa. Agora não, essa cultura já existe; o que temos de fazer é canalisá-la para o objetivo da organização. Quanto maior a troca de conhecimento que ajude a resolver problemas do dia a dia, mais próximo do aprendizado colaborativo estaremos”, diz. “Ainda há dois perfis de profissional dentro das empresas: aquele que acredita que deve compartilhar informações para se destacar, e aquele que acredita que deve proteger o que sabe para se destacar. É preciso transmitir a ideia de que vale mais a pena dividir.”

De acordo com o CEO da Ciatech, as empresas bem-sucedidas no uso corporativo das redes sociais promovem uma mudança cultural de cima para baixo. Ou seja, não apenas abrem o ambiente para colaboração, mas têm seus executivos interagindo também. Isso estimula os funcionários a participar, os motiva e os engaja quando percebem que sua participação é levada em consideração.

Em linha com a participação mais ativa dos profissionais em seu processo de aprendizagem aparece, como quarta tendência do estudo, a “aprendizagem flex”. “Quando falamos em flex, a palavra-chave é autonomia. O profissional conectado está acostumado a buscar as coisas e não apenas a receber. A empresa tem de dar direcionamentos sobre o que ele precisa aprender, mas também dar condições para aprender o que quer”, diz o CEO da Ciatech. Isso significa, na prática, oferecer conteúdos de que o colaborador necessita para exercer melhor suas funções na organização e dar ainda a opção de ele agregar à sua trilha de aprendizado conteúdos que são de interesse dele.

Dentro de um contexto de flexibilização de conteúdos e programas, Orlean, da Affero Lab, inclui a aprendizagem adaptativa como parte da tendência. Trata-se da avaliação do conhecimento dos participantes, antes do início do treinamento, para a adaptação individual do conteúdo a ser oferecido. “Muito tempo vem sendo perdido pelas empresas sem necessidade, com profissionais passando por conteúdos já conhecidos por eles.”

Conteúdo fragmentado
Além do conteúdo flexível, o “conteúdo fragmentado” é apontado como quinta tendência no levantamento da Ciatech. Também chamados de learning snacks, os conteúdos curtos, intensos e objetivos têm tudo a ver com a rotina das corporações. “Ninguém tem tempo nem perfil para ficar horas em um curso on-line. Por meio de visitas a pequenos blocos de conteúdo, vai se adquirindo o conhecimento necessário”, comenta Augusto, da Ciatech.

Nessa linha, Nilson Filatieri, da Eadbox, afirma que a videoaula já é um modelo consolidado. “Um negócio que pegou e tende a crescer muito. É uma mídia à qual as pessoas já estão acostumadas, atende à necessidade de conteúdos curtos e favorece o acesso pelo dispositivo móvel”, explica.

Outra forma de adquirir conhecimento de maneira mais leve é pelo “método imersivo”. Nesta sexta tendência está a já famosa gamificação, ou o uso de jogos no aprendizado. A formatação do conteúdo dos cursos on-line em slides e documentos definitivamente está ultrapassada. Não é necessário ser especialista para saber que esse tipo de abordagem tem baixa adesão. “Acho que esse foi um dos motivos de não termos conseguido criar uma cultura de educação a distância. Para criar uma cultura de uso, a primeira coisa é ganhar a atenção do aluno. Só nos prendemos a alguma coisa quando ela de certa forma nos toca. E adotar o método imersivo é usar ferramentas que envolvem os estudantes”, afirma Augusto, da Ciatech.

#Q#

e-learning / Crédito: shutterstock
Crédito: Shutterstock

 

Gamificação
Filatieri, da Eadbox , acredita que o uso de jogos na educação corporativa é bastante aderente. “Quando empregada de maneira correta, a ferramenta causa um alto impacto. Cai como uma luva para prender a atenção em um ambiente em que está todo mundo preocupado com seus afazeres. Já vimos que é algo irreversível.” É uma maneira também de engajar o profissional no treinamento . “A gameficação traz uma abordagem de aprendizado que inclui desafios e conquistas”, lembra Orlean, da AfferoLab.

Dentro da tendência de uso de métodos imersivos no e-learning corporativo, Orlean cita o simulador 3D e, principalmente, o vídeo como ferramenta importante. “Assistir a vídeos é uma das principais formas de utilização da internet hoje. E a interatividade torna essa uma ferramenta de aprendizado muito poderosa”, afirma.

Ele conta que recentemente participou do desenvolvimento de um programa para novos funcionários conhecerem os diferentes sites de uma empresa, a partir de um vídeo imersivo. “Foi gravado de modo que pudesse ser assistido por óculos virtuais, dando a sensação ao funcionário de estar passeando pela empresa. Além disso, como num jogo, ele tem a possibilidade de escolher como quer fazer esse tour”, conta. Os vídeos também podem ser interativos. “São gravados já pensando em momentos em que o participante pode tomar decisões, escolher entre duas opções para seguir o treinamento, por exemplo. Didaticamente isso torna o participante protagonista.”

Aprendizado ao alcance das mãos
Já deu para perceber que os dispositivos móveis mudaram a cara do e-learning. E quando se fala de dispositivos móveis pensa-se em tablets e celulares. Mas existem outros, que fazem parte da computação vestível. Dá para imaginar receber parte do conteúdo de um curso a distância pelos óculos ou pelo relógio? Parece ficção científica, só que é realidade. Isso é possível e está sendo considerado uma tendência, chamada de “smartificação”.

Segundo Augusto, da Ciatech, essa tendência está alinhada com uma outra, conhecida como bring your own device (BYOD), que é a prática de os funcionários usarem seus próprios dispositivos para o trabalho, como, por exemplo, consultar e-mails pelo celular pessoal. A smartificação consiste em preparar o conteúdo dos cursos para ser entregue no dispositivo que o profissional tiver. E isso começa a incluir óculos e relógios. “Temos visto lançamentos de smart watch com 3G e de smart glasses, como o da Google”, lembra Orlean, da Affero Lab.

Por dentro dos bits e bytes
O avanço da tecnologia traz novas possibilidades para o ensino a distancia. Viabiliza o acesso ao que se pode chamar de “big data da educação”, como indica a oitava tendência do estudo da Ciatech. Na prática, é a manipulação de dados não estruturados, como tweets, posts no Facebook, vídeos, geolocalização e comportamentos, que dependem de contexto para ter sentido. Até recentemente, essas informações só podiam ser apreendidas por pessoas, mas agora existem soluções tecnológicas capazes de fazer isso.
E essas soluções tendem a contribuir cada vez mais para que os gestores de conteúdo entendam de que forma os alunos interagem com o conteúdo, ajudando a obter insights sobre como as pessoas aprendem ou a identificar eventuais falhas nas soluções de aprendizagem.

Uma nova possibilidade de análise de dados vem junto com uma nova plataforma para permitir a introdução de diferentes fontes de informação nos sistemas de aprendizagem. Hoje, a comunicação de dados nesses sistemas é feita a partir de um padrão, chamado Scorm (Sharable Content Object Reference Model). O nome é velho conhecido dos gestores de projetos de educação corporativa, segundo os especialistas ouvidos nesta reportagem. Pouco disseminado ainda é o “Tin Can (API)”, que aparece como a tendência de número nove no estudo da Ciatech.

Para compreender melhor: é a padronização das informações em Scorm que permite acessar dados dentro do sistema como: quais cursos o aluno já fez, quais foram os progressos que um aluno ou turma fez em determinado curso, se o aluno chegou a terminar determinado curso etc. Todas as informações contidas dentro do próprio sistema de aprendizagem. O Tin Can, por sua vez, monitora experiências do usuário que acontecem fora do sistema, como jogar um jogo, participar de um bate-papo no Twitter, ler um blog ou ver um vídeo.
A adesão à nova tecnologia contribui para o maior aproveitamento do poder do big data da educação. “O Tin Can é algo absolutamente novo e há pouquíssimas empresas trabalhando no desenvolvimento de projetos com ele”, afirma Augusto, da Ciatech. Em sua visão, não surgiu para acabar com o Scorm, como alguns acreditam, mas sim para ajudar os gestores no desafio da personalização dos treinamentos.

“O Tin Can não está consolidado ainda, não sabemos se de fato vai pegar, é uma tecnologia boa, a concepção é muito bem feita do ponto de vista tecnológico, mas toda tecnologia tem uma curva de adoção, como ocorreu com o CD e o DVD, que demoraram dez anos para pegar. O que vai influenciar a velocidade de adesão é uma série de variáveis, incluindo o comportamento das pessoas”, analisa Filatieri, da Eadbox. Ele lembra que as possibilidades do próprio Scorm ainda não são aproveitadas pelas empresas em sua totalidade.

#Q#

MOOC e spoc
Por fim, a mudança do “Moocs (Massive Open Online Courses ) para SPOC (Small, Private On-line Courses)” é a última tendência detectada pelo estudo. Os Moocs estão proliferando e se tornando populares. Trazem a promessa de proporcionar acesso totalmente aberto a cursos avançados, de alta qualidade, em uma escala sem precedentes e com custos insignificantes. É um modo de as pessoas acessarem conteúdos oferecidos pelas melhores universidades do mundo. No entanto, o nível de desistência é muito alto. E o desafio de aumentar o engajamento de alunos nos cursos traz para cena os Spocs.

“Os Moocs estão muito mais ligados ao ambiente acadêmico, não o corporativo”, explica Augusto, da Ciatech. De acordo com o executivo, o formato de treinamento mais efetivo para a geração Y inclui ações presenciais voltadas à experiência e à orientação (coaching), combinadas com o aprendizado on-line. “Os Spocs unem esses elementos de maneira mais focada que os Moocs. É um novo formato que as pessoas estão testando na academia também. Uma evolução dos Moocs para algo menor, com acompanhamento maior. E tem se mostrado mais eficaz”, conclui.

 

As 10 tendências

1. Evolução em curso – As mudanças estão acontecendo em um processo evolutivo, em vez de num ritmo revolucionário. O novo agrega possibilidades, sem substituir o antigo.

2. Conhecimento acessível – Para facilitar a aprendizagem, será cada vez mais importante criar soluções de educação on-line de qualidade acessíveis via dispositivos móveis.

3. Saber social – Aprender será cada vez mais uma experiência colaborativa, promovida pela troca de conhecimento em redes sociais.

4. Aprendizagem flex – A expectativa é que as pessoas tenham mais autonomia para controlar suas experiências de aprendizagem, escolhendo o que querem aprender.

5. Conteúdo fragmentado – Formatar a aprendizagem em pequenas partes, de acordo com a relevância, será cada vez mais habitual.

6. Método imersivo – A interatividade de jogos digitais e vídeos será cada vez mais aproveitada para engajar alunos e aumentar a absorção de conteúdos.

7. Smartificação – Além dos notebooks, tablets e celulares, dispositivos móveis, como o smart watch e o smart glass vão influenciar a forma de aprender.

8. Big data da educação – Dados do comportamento dos alunos na internet – a partir de tweets, posts no Facebook etc. – tornam-se subsídio para aprimorar as soluções de aprendizagem.

9. Experiência Tin Can (API) – As informações do big data podem ser acrescentadas às informações contidas nos sistemas de aprendizagem sobre o desempenho dos alunos.

10. De MOOC para SPOC–Trata-se da evolução dos Moocs para algo menor, com acompanhamento maior.

Compartilhe nas redes sociais!

Enviar por e-mail