Se nada acontece por acaso, a inovação também não vai simplesmente florescer em uma organização com centenas de colaboradores só porque as ideias estão alinhadas. Dentro de uma empresa, inovar depende mais do RH do que se imagina, o que nos leva à necessidade de compreender seus diferentes perfis. Sim, o perfil do RH diz muito sobre como a organização enxerga a inovação – e até onde está disposta a ir. Ao ser responsável pela gestão de pessoas, e sendo as pessoas o coração da empresa, a área assume um protagonismo notável, com o poder de provocar mudanças ou travar toda e qualquer evolução – incremental ou disruptiva.
Na prática, um RH com perfil harmonizador, que busca estabilidade, dificilmente vai desafiar padrões. Os mais conservadores e burocráticos vão priorizar a conformidade em vez de promover rupturas. Agora, se o foco for a inovação, o perfil do RH precisa ser estratégico e desafiador, ajudando a organização a construir novos modelos de gestão. Vale dizer que nenhum desses perfis está certo ou errado – a questão é o impacto que geram. No fim do expediente, é o posicionamento do RH que define o ritmo em que as mudanças acontecem, podendo acelerá-las ou fazer com que tudo permaneça exatamente como está.
O perfil do RH é reflexo da empresa – ou o contrário
Segundo Sérgio Amad, CEO da Fiter, o perfil pode variar conforme sua função dentro da empresa. Ou seja, a forma como o RH age está diretamente ligada tanto à estrutura organizacional quanto às características individuais dos profissionais da área. “O RH pode assumir diferentes perfis, dependendo da função e do momento da organização. Podemos analisar isso em duas camadas: a camada de cargos – operacionais, táticos e estratégicos – e a psicométrica, com base nas personalidades dos profissionais de RH.”

Imagine uma empresa que está passando por um crescimento acelerado e precisa reter talentos ao mesmo tempo em que ajusta sua cultura organizacional. Se o RH for predominantemente operacional, tenderá a focar apenas na demanda imediata de contratações. Se for tático, buscará soluções mais estruturadas, como novos programas de benefícios e treinamentos. Já um RH estratégico, entenderá que o desafio não é apenas atrair talentos, mas tornar a empresa um ambiente onde as pessoas queiram ficar.
Quem promove a mudança e quem mantém a ordem
Sérgio explica as diferenças a seguir. O perfil operacional, por exemplo, tem foco na execução de processos e busca garantir que as engrenagens da empresa continuem girando. Já o perfil tático se ocupa da implementação de soluções estratégicas, funcionando como a ponte entre a visão da empresa e sua execução no dia a dia. Aqui, o RH já começa a ter um impacto mais direto nos resultados organizacionais. No topo dessa estrutura está o perfil estratégico, com profissionais que pensam a longo prazo e contribuem ativamente para a transformação do ambiente de trabalho.
Além disso, há outro fator que molda a atuação da área: a personalidade de quem ocupa essa função. Dentro da camada psicométrica, Sérgio divide os profissionais em quatro perfis distintos. Os pioneiros são os inovadores da área, pessoas com facilidade para criar estratégias. Já os especialistas se destacam pela profundidade técnica, sendo responsáveis por executar planos mais complexos. Os gerentes, por sua vez, são os líderes que garantem que tudo saia do papel, assegurando que a empresa funcione dentro dos padrões estabelecidos. E há ainda os vendedores de RH, aqueles que transformam a empresa em uma marca empregadora atrativa, tanto para os colaboradores quanto para o mercado.
Na prática, a interação entre todos os perfis é o que define a dinâmica da gestão de pessoas. Em uma organização que busca inovação, por exemplo, é fundamental ter pioneiros na linha de frente do RH, garantindo que novas práticas sejam implementadas sem medo do novo. Mas, se a empresa estiver em um momento de consolidação, gerentes e especialistas serão os grandes responsáveis por garantir que tudo ocorra conforme planejado, sem grandes riscos ou surpresas. “O equilíbrio entre esses perfis é o que define a forma como a empresa se comunica, se desenvolve e se adapta às mudanças do mercado”, frisa Sérgio.
Perfil do RH: mediador ou catalisador de mudanças?
Mas, então, como equilibrar transformação e estabilidade? A resposta mais parece um dilema filosófico, já que envolve fatores culturais e o próprio DNA da área, responsável pela gestão do capital humano. Afinal, cuidar de gente significa zelar pelo bem-estar, o que, muitas vezes, entra em conflito com as rupturas que a inovação pode trazer. Claro, nem tudo é radical, mas mudanças podem gerar desconforto, ansiedade e insegurança – e quanto maior a incerteza, maior o estresse e a resistência.
Por isso, dependendo do contexto, um RH mediador tende a não apoiar a inovação de forma tão aberta, porque ela inevitavelmente gera instabilidade. Quem faz esse apontamento é Bruno Szarf, vice-presidente global de Pessoas e Performance no Grupo Stefanini. “A inovação sempre traz um ambiente mais desconfortável, e o RH harmonizador busca reduzir esse impacto. O desafio é fazer com que as pessoas se sintam confortáveis no desconforto, entendendo que mudanças são naturais e inevitáveis”, observa.

Não à toa, buscar a harmonia parece o caminho mais seguro. O problema é que, ao minimizar desgastes e conversas difíceis, o RH pode acabar freando mudanças essenciais. Quando a busca pelo equilíbrio se sobrepõe à necessidade de transformação, algo que é determinante para a sobrevivência de qualquer empresa, o risco de manter processos ultrapassados apenas para não gerar desconforto se torna real. Bruno Szarf observa que esse perfil do RH, além de ser o mais comum, muitas vezes o coloca no papel de mediador, que evita se posicionar em decisões estratégicas e, com isso, abre mão do poder de impulsionar a inovação. “O RH tende a não provocar. Ele tem um olhar muito de acolhimento e pouco de negócio. Quer evitar conflito e fazer com que as pessoas se sintam bem e seguras”, acrescenta.
Uma questão cultural
E a cultura, onde entra nessa equação? Muitas vezes, a resistência à mudança não está apenas no RH, mas enraizada na própria cultura organizacional. Sérgio Amad, CEO da Fiter, alerta que esse fator pode ser decisivo para o avanço ou a estagnação de uma empresa. “A cultura de uma empresa pode ser um entrave significativo para a inovação”, pontua. Se a organização tem uma mentalidade muito rígida e conservadora, dificilmente seu RH assumirá um papel estratégico como provocador de mudanças. O resultado? Um setor que apenas executa processos, sem espaço para questionar modelos ou impulsionar transformações. Assim, as mudanças são barradas antes mesmo de começarem – e a empresa corre o risco de ficar presa ao passado enquanto o mercado segue evoluindo.
Sérgio também lista entre os entraves à inovação a perpetuação de processos antiquados, baseados em modelos tradicionais, desde o recrutamento até o treinamento dos colaboradores, e a resistência interna. Enquanto o primeiro reflete como a empresa enxerga sua gestão de pessoas, o segundo tem a ver com a natureza humana. E, convenhamos, ambos não são fáceis de mudar. “É natural que as pessoas resistam a mudanças, porque o novo gera insegurança, especialmente em culturas mais conservadoras ou em empresas com processos estabelecidos há muito tempo”, reflete. E se sempre foi assim e funcionou, por que mudar? Em empresas voltadas para a estabilidade, com normas rígidas, o velho ditado “em time que está ganhando não se mexe” faz todo o sentido – mesmo quando o jogo pede uma nova estratégia.
O caminho do RH estratégico
Mas como sair dessa zona de conforto? Bruno Szarf defende que, para que a inovação realmente aconteça, o perfil do RH precisa ser estratégico e proativo, com capacidade de antecipar problemas, planejar estratégias e propor mudanças concretas. “A gente precisa ter um RH muito mais atuante e participativo, um RH que olha números, mas não esquece das pessoas”, resume. Esse movimento, entretanto, demanda uma mudança profunda de mentalidade, especialmente entre aqueles que ainda enxergam o RH apenas como um setor operacional, limitado à rotina administrativa e distante das decisões estratégicas.
Sendo assim, para o VP global de Pessoas e Performance do Grupo Stefanini, não basta o RH querer inovar se não consegue comprovar o impacto positivo que suas ações geram no desempenho geral da empresa. Isso exige profissionais com um perfil diferente, capazes de falar claramente a linguagem do CEO e das demais lideranças. Em outras palavras, a missão tradicional do RH de cuidar do capital humano continua valendo, mas é preciso ir além, assumindo responsabilidades que também envolvam diretamente o sucesso dos negócios. “É um RH que ajuda a fazer as pessoas pensarem e a se movimentarem, mas, de novo, não pode ser provocador em vão. Ele deve levar a gente para aquilo que é a estratégia da empresa.”
Cultura de inovação na prática
Isso significa que o RH deve incentivar a inovação sem perder de vista a realidade da organização – e sem alimentar inseguranças desnecessárias. “Se a empresa está focada em inteligência artificial, por exemplo, a provocação do RH deve ser: será que a gente já pensou o processo de uma forma diferente? Será que isso pode ser automatizado?”, questiona Bruno. Mas a provocação não é apenas sobre tecnologia e eficiência. Também cabe ao RH a responsabilidade de preparar as pessoas para assumirem novos papéis nesse cenário em transformação, garantindo que a inovação não seja percebida como uma ameaça, mas como uma evolução natural do trabalho.

Dessa forma, não é que o perfil do RH harmonizador esteja errado – afinal, ele continua sendo importante para manter a empresa saudável –, e sim que a inovação demanda mais. O verdadeiro desafio consiste em utilizar essa postura para preparar as pessoas para lidar com as mudanças, ainda que elas tragam algum desconforto inicial. É exatamente nesse ponto que o RH assume um papel provocador ao incentivar as pessoas a rever processos já estabelecidos. E são essas pequenas provocações que lançam as bases para a construção de um ambiente realmente inovador. Elas colocam em jogo questões essenciais para o futuro da organização e têm um efeito radical sobre as pessoas, porque transformam totalmente sua forma de pensar. “Mudando as lentes, mudamos a forma como as pessoas enxergam a realidade”, crava.
Como fazer a transição
Contudo, transformar o perfil do RH em um agente estratégico de inovação não acontece da noite para o dia. A mudança, segundo Sérgio Amad, da Fiter, precisa estar enraizada na cultura da empresa para se tornar realidade. Como ele bem destaca, antes de qualquer transformação, é preciso revisar a missão, visão e os valores da organização para garantir que a inovação seja parte do DNA corporativo e que o perfil do RH esteja alinhado a essa mentalidade. “A missão precisa refletir um compromisso com a inovação, e o perfil do RH deve garantir que esse conceito se traduza em práticas reais. Já a visão deve projetar onde a empresa quer chegar, enquanto os valores permitem que o perfil do RH impulsione essa inovação”, explica.
Mas não basta definir direcionadores no papel; é preciso conectá-los à estratégia da empresa e transformá-los em ações concretas – e nada disso acontece sem o patrocínio das lideranças. Se o alto comando não estiver comprometido com a mudança, qualquer esforço para impulsionar a inovação será engolido pela rotina. Como reforça Sérgio Amad, “se o alto comando da empresa apoia o RH, ele pode ser um potencializador de mudanças”. Sem esse respaldo, o perfil do RH – seja ele mais harmonizador ou provocador – perde sua força.
No fim das contas, o RH não atua sozinho. Sua capacidade de transformação está diretamente ligada ao suporte da liderança e à cultura organizacional. Se a empresa não estiver pronta para abraçar as mudanças, o RH pode até desafiar o status quo, mas dificilmente conseguirá mover as peças certas para que a inovação aconteça. Bruno reforça esse ponto: “cabe ao primeiro nível de liderança, tanto da empresa quanto do próprio RH, colocá-la em jogo”. Dessa forma, o time entende que inovar faz parte de uma jornada que vale ser celebrada.
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