Todos os dias, o mundo produz uma quantidade massiva de dados, chegando a 2,5 quintilhões de bytes. A tecnologia acelerou esse processo a tal ponto que uma informação pode se tornar obsoleta no segundo seguinte à sua publicação. E no ambiente corporativo, isso não é diferente. Pesquisas existem aos montes, mas faltam profissionais qualificados e tempo para interpretá-las com a sensibilidade necessária. Embora a coleta de dados pelo RH tenha se tornado mais ágil com o apoio da inteligência artificial, a tarefa de “ler os colaboradores” não ficou mais simples. Ainda hoje, a inovação na gestão de pessoas e a adoção de uma cultura de dados representam desafios significativos para muitas empresas e seus departamentos de RH.
Definitivamente, essa abordagem data-driven, essencial para a tomada de decisões estratégicas, ainda não está 100% enraizada nas organizações. É o que aponta o especialista em People Analytics e Data-Driven, Galo Lopez Noriega, consultor da HSM, uma das principais empresas de educação executiva da América Latina. “A maturidade das empresas brasileiras em relação à cultura de dados no RH está em um estágio de desenvolvimento. Ainda existe uma necessidade de maior capacitação dos profissionais de RH e uma integração mais profunda dos dados nas decisões estratégicas”, explica.
Dados, RH e inovação
Dados são importantes, mas o que fazer com eles é ainda mais. Ao analisar essas informações, que vão muito além de números em uma planilha, o RH tem o poder de desenvolver e potencializar as habilidades de seus colaboradores, gerando inovação no processo. Para Jorgete Lemos, diretora executiva da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços, esse estudo permite ao RH tornar tangíveis aspectos intangíveis das pessoas, como suas percepções e observações cotidianas no ambiente de trabalho. Desse modo, é possível identificar padrões, tendências e fatores que influenciam o desempenho, a satisfação e o engajamento dos funcionários.
Não por acaso, a análise de dados tem o potencial de revolucionar a forma como o RH aborda a gestão e atração de talentos, promovendo a diversidade e impulsionando a tão buscada inovação. Jorgete ressalta a importância de compreender o que está por trás dos números, indo além da quantificação. “É preciso entender o clima, os valores que direcionam o gerenciamento. E que talentos queremos atrair? Queremos mais dos mesmos ou realmente estamos preparados para incluir diversidade?”, reflete a especialista.
Contexto, acima de tudo
Nesse sentido, também é fundamental dar contexto aos dados, pois, do contrário, eles podem levar a uma visão distorcida da realidade e prejudicar a tomada de decisões. Sem esse cuidado, corre-se o risco de reduzir as pessoas a meros números dentro de um cenário artificial, resultando em interpretações incompletas das situações experienciadas nas empresas.
Segundo Galo Lopez Noriega, um RH “data-driven”, que valoriza a inovação, precisa equilibrar o balanço entre dados quantitativos e qualitativos para evitar julgamentos equivocados. Por exemplo, um aumento no absenteísmo não deve ser analisado de forma rígida sem considerar os fatores pessoais refletidos nesses números. Isso requer uma abordagem sensível e individualizada, em vez da simples mensuração dos resultados. “Equilibrar a abordagem data-driven com um toque humano é essencial para criar um ambiente de trabalho saudável. Os dados devem ser utilizados para melhorar as decisões e interações, mas a empatia, intuição e julgamento humano são insubstituíveis”, ressalta Noriega.
A tomada de decisão também deve ser humanizada, levando em consideração o impacto das decisões na vida dos colaboradores, tanto em termos pessoais quanto profissionais. “Os dados devem ser utilizados para tomar decisões que considerem o bem-estar e o desenvolvimento dos funcionários, não apenas a eficiência e os resultados empresariais”, explica o consultor da HSM. Já o terceiro ponto destacado por Noriega diz respeito ao desenvolvimento contínuo das pessoas, reconhecendo o potencial de cada uma delas. Essa estratégia é determinante quando pensamos em inovação no RH com base em dados. “É preciso oferecer programas de desenvolvimento contínuo que permitam aos funcionários crescerem com base nos insights obtidos dos dados”, destaca o especialista.
Tempo para agir
Entretanto, com os ciclos de inovação cada vez mais intensos, os prazos também se tornaram mais curtos. Há muitas demandas simultâneas e uma pressão crescente por respostas rápidas, exigindo do RH uma adaptabilidade ainda maior para implementar mudanças inovadoras e sustentáveis baseadas em dados. Nesse cenário, muitas empresas acabam realizando pesquisas frequentes, mas não conseguem processar nem utilizar os resultados a tempo, comprometendo sua capacidade de resposta. Por isso, Noriega enfatiza a importância de equilibrar a frequência das pesquisas com a capacidade de processamento da organização. Embora o feedback contínuo seja valioso, se as pesquisas não resultarem em ações tangíveis, podem perder sua credibilidade aos olhos dos colaboradores.
Segundo Jorgete Lemos, o RH enfrenta três desafios principais. O primeiro é o tempo necessário para a aplicação das pesquisas em contraste com as demandas rotineiras e a necessidade de respostas ágeis. O segundo desafio são os prazos entre a aplicação da pesquisa e a ação baseada nos resultados. Já o terceiro diz respeito à credibilidade, que inclui a capacidade de agir mesmo quando os resultados são contrários às expectativas da empresa. Para a especialista, é crucial que as empresas estejam devidamente aparelhadas para utilizar a inteligência artificial de ponta a ponta. “Ou seja, não dá para pensar em pesquisa que não seja digital”, pontua a diretora executiva da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços.
O consultor da HSM destaca ainda outros desafios enfrentados pelo RH para integrar a cultura de dados e de inovação em seus processos. Entre eles estão a resistência à mudança por parte dos colaboradores, a falta de capacitação dentro do próprio departamento, a carência de apoio por parte da liderança e a ausência de uma governança de dados eficiente. A superação desses obstáculos exige, segundo ele, um esforço coordenado entre tecnologia, processos e pessoas, além do comprometimento do próprio RH com a inovação e a busca contínua por soluções que impulsionem a transformação organizacional.