Muito se fala sobre inovação em RH, um conceito carregado de significado que virou “trend” por simbolizar a conexão das empresas com o amanhã. E quanto mais olhamos para o futuro, mais tendemos a associar o termo a grandes mudanças, deixando em segundo plano as pequenas evoluções que acontecem entre uma invenção e outra.
A bem da verdade, nem tudo precisa ser disruptivo para ser inovador. No dia a dia, a inovação assume diversas roupagens e pode estar na forma como a empresa aprimora processos, adapta estratégias ou potencializa talentos. Ou seja, inovar tem mais a ver com encontrar soluções que façam sentido para o negócio e para as pessoas do que com ideias mirabolantes. Afinal, não é todo dia que se lança um foguete, mas todo dia é dia para revisar um processo e propor melhorias. E quem entende isso, enxergando a inovação em RH como um compromisso contínuo, com certeza, está um passo à frente.
Inovação não se mede por superlativos
Mas se inovação em RH não é só sobre revolução, por que ainda há tanta fixação no que é disruptivo? O problema está na forma como enxergamos as mudanças. Quando algo radical acontece – atravessando nossa rotina –, como a adoção de uma nova tecnologia, o impacto é sempre mais visível. Pense no que representou para os colaboradores a chegada dos primeiros computadores às empresas, substituindo processos manuais por planilhas digitais. Isso mudou para sempre a forma como os dados seriam organizados. Foi um salto enorme, mas nem toda transformação será tão visível quanto essa. Na prática, a inovação está entrelaçada ao dia a dia da empresa, sustentando seu crescimento por meio de pequenos ajustes na rotina. E a cada aperfeiçoamento, novas possibilidades surgem – quase como um multiverso.

Para Christiane Berlinck, vice-presidente de Recursos Humanos do Grupo OLX, é justamente essa soma de pequenas e grandes inovações que faz uma empresa evoluir de forma sustentável. Não é o tamanho da ideia que define o impacto nos resultados. Entretanto, como ela bem destaca, só há evolução quando todas as melhorias, mesmo as menos tangíveis, são reconhecidas e celebradas. “Se uma organização se propõe a fomentar um ambiente criativo, reconhecer essas iniciativas de porte menor reforça ainda mais a cultura de inovação.”
O mito do novo
Se há um equívoco nessa narrativa, é a ideia de que a inovação só acontece quando se cria algo “impactante”, o que leva muita gente a ignorar as melhorias diárias por não serem “inovadoras o bastante”. Quando se trata de inovação em RH, essa visão limitada pode sufocar a criatividade e impedir que avanços importantes aconteçam. Esqueça os foguetes mais uma vez, já que a maior parte das inovações vem da otimização contínua do que já existe. “Inovação tem a ver com valor. Se não cria valor, não é inovação.” É assim que Fernando Viriato, vice-presidente sênior de Talento e Cultura da AccorHotels, define o que é inovação, reforçando que o ineditismo não é seu maior triunfo, e sim o efeito que ela provoca.
E, naturalmente, esse impacto pode ser resultado de pequenos ajustes que, à primeira vista, não parecem revolucionários, mas que aumentam a eficiência e economizam recursos. Fernando exemplifica isso ao falar sobre a experiência nos hotéis da Accor. “Se conseguimos melhorar o check-in, reduzindo o tempo de espera do hóspede e tornando a experiência mais fluida, estamos inovando. Não criamos nada inédito, mas entregamos mais valor”, explica. E essa mesma lógica pode ser aplicada a algo tão simples quanto um biscoito. “Se, ao mudamos o processo produtivo, gastamos metade do tempo para produzir um pacote, inovamos de uma forma muito importante para o stakeholder”, complementa. Segundo ele, tão importante quanto criar algo inédito é olhar para o que já existe e reconhecer quando se gera valor para o colaborador ou para o cliente, ainda que a novidade pareça pequena.

Disrupção ou melhoria? Por que não os dois?
Em outras palavras, inovar – muitas vezes – significa aperfeiçoar algo que já existe, sem que isso represente, necessariamente, uma melhoria nunca vista no mercado. Aqui, faz sentido distinguir os dois caminhos possíveis: o incremental e o disruptivo. Um não invalida o outro; e ambos podem (e devem) coexistir no RH, contanto que haja propósito no que se faz.
Se olharmos apenas pela ótica da disrupção, a reinvenção completa da gestão de pessoas seria a grande inovação a ser arquitetada pelo RH — uma abordagem ousada, mas extremamente arriscada. Como o sócio e estrategista de Cultura e Comportamento Humano da Innoway, Gerson Ferreira, bem destaca, embora não seja impossível (e o exemplo a seguir evidencia isso), esse tipo de disrupção está distante da realidade da maioria das empresas.
Ele cita o caso de Vinnet Nayar, CEO da empresa indiana de TI HCL Technologies, que desafiou a estrutura hierárquica tradicional ao colocar os colaboradores no centro das decisões. Essa mudança radical levou cinco anos para se concretizar, exigindo ajustes e muita experimentação até que sua gestão fosse, de fato, considerada inovadora. O caso ilustra um ponto essencial sobre a inovação disruptiva: além de não ser imediata, ela exige tempo, coragem e capacidade de adaptação, pois envolve a reformulação profunda de processos e estruturas. E sem planejamento, uma mudança dessa dimensão pode rapidamente se transformar em um grande fator de sobrecarga para a organização.
Fazer diferente e melhor
Não à toa, é por esse motivo que a maior parte das inovações não vem de rupturas tão drásticas. Segundo Gerson, que também é consultor de Cultura, Branding e Negócios na Vozco, as mais importantes e significativas são as incrementais – com origem nas pessoas. “A maior concentração de fonte de receita está no presente, na capacidade de fazer melhor e de forma mais segura”, ressalta. E essa capacidade não vem apenas da tecnologia utilizada, mas do que os talentos podem criar e produzir a partir dela. “Tudo o que uma empresa tem acesso, a concorrente também possui. A diferença está no que as pessoas fazem com o que têm em mãos — seja conhecimento, tecnologia, dados etc.”, complementa o especialista.

Agora, isso não significa que a disrupção não tenha seu espaço na gestão de pessoas. Mas é preciso ter cuidado para não cair na armadilha de buscar grandes mudanças antes de garantir que o básico esteja bem resolvido. Além disso, parafraseando Peter Drucker, o pai da administração moderna, se você quer algo novo, precisa parar de fazer algo velho. De acordo com Bruno Szarf, vice-presidente global de People & Performance e CHRO Global do Grupo Stefanini, a inovação em RH não pode ser um movimento aleatório ou isolado. “Não adianta ‘criar o novo’ com a cabeça antiga”, alerta. Se for assim, a organização acaba ficando presa entre o que “parece moderno” e o que efetivamente gera resultados.
Para descomplicar esse cenário, a melhor estratégia é alinhar as expectativas e necessidades dos colaboradores ao que a empresa realmente ambiciona, evitando desperdícios – de tempo, energia e recursos. E, sendo a Stefanini uma empresa de tecnologia, acompanhar as tendências de mercado também é fundamental — mas inovar não é só sobre seguir o que está em alta. O verdadeiro desafio está em trazer novidades que façam sentido para a organização, sem transformar a inovação em um mero “rótulo”. Como Bruno bem reforça, não basta ter as ferramentas mais avançadas se elas não conversam com a realidade dos times. “É preciso começar com o simples, medir e celebrar os resultados”, crava.
Quando a mudança vem de dentro
Na prática, a inovação pode, ou não, envolver grandes investimentos ou novas tecnologias. Mas uma coisa é certa: independentemente do desafio, o ato de inovar nasce sempre da necessidade de resolver problemas, como bem reforça Christiane Berlinck, do Grupo OLX. Foi exatamente uma demanda interna real que motivou a criação do assistente virtual “Joca”, desenvolvido para automatizar processos e aprimorar a experiência do colaborador.
Porém, se a cultura da OLX não fosse inovadora no sentido mais profundo da palavra, a criação de um chatbot para agilizar respostas do RH poderia não ser considerada uma inovação. E pior: correria o risco de jamais sair do papel, já que a iniciativa veio de um colaborador da área, e não de um especialista em inteligência artificial. “Estamos sempre buscando maneiras de reinventar nossos processos. No RH, isso significa criar espaços para a experimentação, seja por meio de programas de aprendizagem ou incentivo a novas formas de trabalho”, pontua Christiane. Segundo ela, o impacto foi imediato: no primeiro mês de operação, 90% dos colaboradores avaliaram o atendimento de forma positiva, e a redução na abertura de chamados foi significativa.
De fato, não se trata aqui de inventar a roda, mas de entender como fazer melhor com os recursos disponíveis. Para a OLX, o Joca foi um salto disruptivo, mas a inovação em RH também pode estar em mudanças mais simples. A adoção do Workplace, por exemplo — uma plataforma que integra grupos temáticos, chat, repositório de arquivos e transmissões ao vivo — trouxe ganhos operacionais significativos por lá. “São ferramentas já utilizadas em outras empresas, mas que, ao serem implementadas, auxiliam de forma significativa o dia a dia dos times”, reforça Christiane, destacando que o que realmente importa é gerar valor.

Complementando a análise, Bruno Szarf destaca que a inovação nem sempre está na ideia em si, mas na forma como ela é aplicada. Mentoria e Plano de Desenvolvimento Individual (PDI), por exemplo, não são conceitos novos, tampouco surpreendentes. Mas, na Stefanini, a “invencionice” foi unir os dois de um jeito mais estratégico. Com o apoio da IA, a empresa criou uma mentoria interna capaz de conectar cada colaborador ao mentor mais adequado, tornando o desenvolvimento humano mais eficiente e personalizado. “Inovar existe um olhar constante”, complementa.
Inovação sem estratégia é só desperdício
Se inovar já carrega seus riscos, imagine tentar fazer diferente sem ter um plano estruturado. Em matérias anteriores, já mostramos que até para errar é preciso método. Agora, pense no perigo de adotar mudanças abruptas sem medir todas as implicações. O medo de ficar para trás no mercado não pode ser uma justificativa para radicalizar a gestão de pessoas, ignorando a realidade da empresa e as necessidades dos colaboradores.
Para Fernando Viriato, da Accor, a inovação em RH precisa ser um processo contínuo, e não uma ruptura constante. Por mais que as grandes transformações representem saltos em direção ao futuro, são as pequenas evoluções diárias que pavimentam esse caminho. Cada inovação incremental impulsiona a próxima, criando um ciclo positivo de avanços. “A inovação incremental tem um impacto mais amplo do que a disruptiva porque abre portas para que as pessoas se sintam permanentemente valorizadas e estimuladas. Se bem aplicada, ela fortalece o engajamento e a conexão dos colaboradores com a empresa”, ressalta Fernando.
E se o feedback é essencial para captar o clima da organização quando essas mudanças acontecem, ele destaca que olhar para frente é ainda mais estratégico. “O feedforward garante que, da próxima vez, as coisas aconteçam de forma ainda melhor”, finaliza.
Inovação sem conexão não engaja
Entretanto, para que a inovação não seja apenas um discurso vazio, é preciso lembrar que ela só faz sentido quando melhora a vida das pessoas – conceito defendido pelo autor norte-americano Scott Berkun. Gerson Ferreira reforça essa visão ao destacar que engajamento não nasce de benefícios pontuais ou programas isolados, mas da conexão com um propósito coletivo. O problema, segundo ele, é que muitas empresas ainda tratam a inovação em RH de forma superficial, como um atalho para aumentar a produtividade, sem dar às pessoas tempo, incentivo ou liberdade para imaginar algo diferente. E sem esse espaço, a inovação simplesmente não acontece.
Ele exemplifica isso com um pensamento bastante comum: “muita gente ainda pensa que ‘onde sou pago para fazer algo, parar para ter ideias não parece ser uma boa ideia’”. Essa mentalidade é resultado direto da pressão por resultados, em que o foco recai apenas na execução de tarefas. Nesse cenário, como esperar que as pessoas inovem? E se as lideranças não enxergam valor na mudança, como esperar que os times façam diferente?
As respostas não são simples, mas Gerson destaca alguns passos para desfazer esses nós. É preciso alinhar objetivos, deixar claro quais comportamentos são valorizados e qual o papel de cada colaborador na construção desse futuro. Na prática, isso significa estabelecer metas concretas para criatividade e melhorias, incentivar o aprendizado coletivo e, principalmente, revisar a cultura organizacional para que inovar seja parte da rotina da empresa.

Os três horizontes da inovação no RH
Mas como fazer da inovação um verbo conjugado por todos? No vocabulário corporativo, inovar soa moderno, quase como um convite à revolução. E quem não quer revolucionar algo hoje em dia, não é mesmo? Ser o primeiro é sempre sedutor. Mas para que a inovação gere impacto real, ela precisa andar de mãos dadas com a eficiência. Existe um equilíbrio a ser mantido para que o transatlântico (se não entendeu a referência, leia esta matéria) não afunde enquanto as mudanças acontecem.
Para inovar sem comprometer a eficiência, Gerson Ferreira sugere a aplicação dos três horizontes da inovação ao RH — modelo criado em 1999 pela McKinsey para ajudar empresas a avançarem de forma estruturada. O primeiro horizonte, o incremental, se refere a melhorias que otimizam processos e aprimoram a experiência do colaborador. Aliás, a maior parte da inovação em RH acontece aqui. Já o segundo, o adjacente, envolve a expansão para novas áreas e práticas, sem mudar completamente o modelo de negócio. Nesse estágio, o RH começa a testar novas estratégias e desenvolver novos produtos, mas sem romper com o status quo. O risco, aqui, é controlado.
O terceiro horizonte, o transformacional, por sua vez, é onde a inovação disruptiva realmente acontece. Nesse nível, todos os esforços são direcionados para criar algo novo e inédito. “Trabalhar inovação de H3 implica em gestão de risco com alto nível de incerteza, sendo um horizonte adotado por poucas empresas, pois exige grandes investimentos”, explica Gerson.
O desafio de inovar sem perder o presente
Na prática, quem foca apenas no H3 acaba ignorando as necessidades do presente, enquanto quem se prende ao H1 limita seu crescimento. No fim das contas, não se trata de escolher entre um ou outro, mas de conectar todos esses horizontes de forma estratégica. No dia a dia, isso significa inovar com olhar para o futuro, sem perder de vista o que faz sentido no presente. O problema é que muitas empresas apostam em mudanças bruscas sem medir as consequências no curto prazo, enquanto outras se agarram ao que já funciona, por medo de arriscar. Como, então, encontrar o equilíbrio entre inovar para o agora sem comprometer o futuro – e, ao mesmo tempo, não ficar estagnado no presente?

A resposta para esse dilema, segundo Gerson Ferreira e Bruno Szarf, está na ambidestria organizacional – a capacidade de equilibrar eficiência e inovação, excelência e exploração, presente e futuro. Para Gerson, esse equilíbrio pode acontecer de três formas: ambidestria compartilhada, onde a empresa preserva sua cultura atual, mas cria uma estrutura separada para inovação; ambidestria conectada, que promove ajustes internos para unir eficiência e adaptação dentro da mesma estrutura; e ambidestria dedicada, que separa um time focado exclusivamente em inovação por um período determinado.
Seja qual for o modelo escolhido, o maior desafio continua sendo engajar as lideranças para que abracem inovação – e tudo o que ela representa – como um estímulo à criatividade. Sem esse apoio, qualquer esforço para inovar corre o risco de morrer na teoria. “Isso é o que chamo de ambição coletiva: uma poderosa sinergia entre a vontade e a capacidade de um grupo de pessoas valorizadas, integradas e respeitadas, que, juntas, focam em conquistar resultados que gerem realização e significado”, reforça Gerson.
Ambidestria na prática: inovação que faz sentido
Na Stefanini, essa abordagem já faz parte da cultura. Bruno destaca que a empresa se consolidou globalmente ao desenvolver sua própria ambidestria, mantendo a eficiência operacional de suas soluções enquanto investia em inovação. “O Grupo usa inovações tecnológicas incrementais para aprimorar processos, ao mesmo tempo em que altera os padrões dos setores em que atua com soluções disruptivas”, explica.
Porém, vale lembrar que ser ambidestro não é natural para a maioria das pessoas. Tente escrever com a mão não dominante e logo perceberá como a coordenação fica comprometida. No mundo corporativo, o desafio é parecido: de nada adianta inovar com uma mão se a outra não consegue sustentar a operação. Christiane Berlinck, do Grupo OLX, alerta que, sem estratégia, esse desequilíbrio pode custar caro. “A ambidestria só funciona quando há clareza de objetivos e decisões bem fundamentadas. Atuar apenas com base em intuições, sem embasamento real, pode levar a ações que não geram benefícios concretos. O que realmente faz a diferença é saber onde concentrar esforços para gerar impacto positivo e sustentável.”
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