Gestão

Motivos desconhecidos

de Carolina Wanderley* em 19 de novembro de 2010

O mercado de trabalho tem mostrado uma realidade contraditória quando o assunto é benefício para a aposentadoria. Se, no momento da admissão de algum profissional, a empresa não oferece um plano de previdência complementar interessante, ela perde aquele talento para a concorrência, pois enfraquece automaticamente a remuneração total do empregado. No entanto, mesmo ela tendo um plano bem desenhado e que atenda às necessidades futuras com garantias seguras, não significa que consiga reter talentos por causa do plano. A primeira conclusão é um fato real de mercado: o plano de previdência está atraindo talentos, mas não os retendo. Assim, o grande desafio para o gestor de RH é transformar esse benefício em fator de retenção. É de conhecimento que os próximos movimentos do mundo do trabalho enquanto modernidade, adequação de funções, detecção e gestão de talentos, satisfação interna, junção de culturas e controle de custos estão total e necessariamente na mão de RH. É dele a tarefa de transformar água em vinho. Se a água é pura, basta uma uva de qualidade e os ingredientes certos para que o néctar surja como o esforço por um ideal. Ideal de competência.

E se há por parte do RH competência para criar um plano de previdência interessante, por que não transformá-lo em ferramenta de retenção de talentos? Isso porque, mesmo tendo um plano excelente, a empresa não faz propaganda a respeito. Isso mesmo, propaganda. A comunicação dificilmente é usada para valorizar o plano que a empresa oferece mesmo esse sendo o segundo maior gasto relacionado a benefícios (cerca de 5% a 7% da folha de pagamento). A maioria dos empregados mal sabe o que acontece com seu plano, pois as informações ou são muito técnicas, ou indisponíveis. E o nível de adesão aos planos de previdência complementar na empresa cai junto ao público mais jovem.  Eles não pensam sobre o tema e não é comum falar sobre isso para quem acabou de ingressar no mercado de trabalho.

Falta de conhecimento
Outra constatação dramática é que os empregados mal sabem quanto têm acumulado no seu plano de aposentadoria. Só caem em si quanto a esse valor quando já se desligaram da empresa e precisam tomar alguma decisão sobre o que fazer com o dinheiro. Ou seja, já é tarde. Mecanismos de vesting (ou seja, o acesso aos recursos antes da aposentadoria) facilitam e motivam o empregado a aderir aos planos de previdência. Entretanto, as empresas, muitas vezes, pouco valorizam e divulgam esses benefícios pré-aposentadoria.

Uma primeira mudança importante seria o RH iniciar um projeto estilo “face to face”.  Com todos os públicos, os mais novos, os de médio tempo de casa e os mais antigos. Convocar os grupos de empregados da empresa e explicar, de forma clara e didática, a importância daquele plano, com quanto a empresa colabora, o que isso representa de aporte perante a colaboração dele, e o quanto isso se transformará num patrimônio financeiro sedimentado no correr dos anos. Ele tem de tomar consciência de que aquele dinheiro é dele, portanto, tem de cuidar. Muitas vezes, o empregado nem tem a noção de que aquela poupança compulsória está diretamente ligada ao seu bem-estar futuro e que, portanto, ele é quem tem de averiguar o que é mais adequado naquele momento de sua vida profissional. E a empresa também pode flexibilizar o plano para atender necessidades de públicos específicos.

Dúvidas recorrentes
A experiência mostra que mesmo próximo de se aposentar os empregados ainda demonstram dúvidas primárias sobre tributação, melhor momento para o saque, como administrar o valor poupado, como transformar aquela renda em tranquilidade futura. Para que isso mude, todos os canais de comunicação sobre o tema deveriam funcionar plenamente. Desde um 0800, até cartilhas, cursos e eventos que misturam treinamento com simulações financeiras. Uma vez que é provado estatisticamente que o benefício da aposentadoria social (INSS) é claramente insuficiente para a manutenção do poder da compra na aposentadoria, principalmente para os maiores salários, só há mesmo duas saídas: a poupança própria ou a previdência complementar. E no caso da complementar parece que os empregados não percebem que as empresas costumam fazer um aporte de praticamente 100% do valor que o empregado investe, dobrando o prêmio. Na poupança própria, guarda-se o que sobra, ou o que se economiza (quando isso acontece). Os profissionais precisam valorizar esse benefício e se apropriar do seu futuro, pois patrimônio financeiro se conquista em longo prazo. Os participantes precisam entender e valorizar seu plano. A empresa pode e deve capitalizar em cima desse conceito para manter aquele talento na equipe e ajudá-lo a sentir-se respaldado hoje e precavido amanhã.

Para entender o quanto os empregados precisam economizar, ajude-os com uma conta simples: imagine um valor mensal que você precisa ter de renda na aposentadoria (excluindo INSS), multiplique esse valor por 220. O resultado dessa conta representa o quanto você deveria projetar de patrimônio disponível no futuro.

O conceito de aposentadoria precisa ganhar notoriedade e importância, como um movimento de capitalização pessoal. Seja para o que for. Para criar um novo projeto, para viajar, para construir um barco, para nunca mais trabalhar. E esse cenário apela para mais informação, para o participante optar com segurança sobre seu nível de contribuição, sobre o fundo de investimentos para aplicação de seus recursos, sobre as formas de recebimento dos recursos etc., para garantir uma renda adequada ao padrão de vida de cada um quando o mercado de trabalho não for mais a fonte de renda do trabalhador. Aí, cria-se a via de mão dupla, o empregado é atraído pelo pacote de benefícios, permanece na empresa porque sua gestão é transparente e voltada para que ele alcance estabilidade e liberdade financeira no futuro. E, no mínimo, vai pensar duas vezes sobre o montante que está deixando para trás no plano de previdência em caso de mudança de empresa.

* Carolina Wanderley é consultora sênior de previdência da Mercer

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