Entrevista

O líder do futuro precisa de mais empatia

Passada a pandemia, qual o perfil de liderança vai sobressair? No pacote de competências estão entender a si mesmo e os outros, aprender a criar empatia, criar e respeitar diferenças pessoais, entre outras

Com a necessidade de mudanças abruptas nos modelos de negócios vigentes com a pandemia do novo coronavírus, muitas empresas se veem diante, também, de repensar o papel de suas lideranças. Falar sobre o desenvolvimento de líderes é algo que praticamente habita a agenda da área de RH há muitos anos. E sempre trazendo (boas) discussões, reflexões e mudanças. Mas tais mudanças seguiam um curso e velocidade muito distintos do que se percebe (e sente) nos dias de hoje. E quando se pensa em líderes neste cenário que possam ajuda a empresa, qual o perfil que vem à mente?

Para Vicente Picarelli, sócio-fundador da Picarelli Human Consulting, esse profissional deve ter, além do domínio técnico do assunto, a habilidade de conduzir assuntos polêmicos e não-cartesianos. Neste momento de novo renascimento por que passam empresas e pessoas, Picarelli aponta outras competências e habilidades desse novo perfil de liderança, como é possível se preparar para elas e o que pode fazer o RH nesse processo.

O que muda na liderança dos executivos durante e após pandemia?

Os líderes estão tendo uma experiência completamente nova com esta pandemia e o que se vê é que a maioria deles não está preparada para lidar com ela. Esse é o verdadeiro significado de saber lidar com o incerto e o complexo! No momento, estamos vivendo um fenômeno que está mudando o comportamento da sociedade, das pessoas e da forma de se realizar o trabalho. O pós pandemia não trará os mesmos modelos antes existentes, a tendência será aproveitar parte do que deu certo e inovar no que for necessário. No entanto, uma coisa é certa: as empresas terão de rever as suas estratégias e modelos de negócios porque estarão muito impactadas. Será como um renascimento! Dessa forma, os executivos terão, pela frente, de lidar com muitas mudanças, aprender novas formas de fazer negócios, identificar e desenvolver novos mercados, aprender novos métodos de gestão de recursos e desenvolver novas capacidades para lidar com pessoas, pois parte dos seus liderados terão contrato de trabalho e parte serão terceiros com vínculos especiais com a empresa e todos eles terão demandas psicológicas para serem atendidas em função da oscilação do ambiente de trabalho dadas as circunstâncias de incerteza do empreendimento. Os executivos vivenciarão uma dinâmica exaustiva de desaprender e apreender para estar sincronizados com a nova realidade e precisarão se fortalecer internamente, no seu campo psíquico, aprofundando o seu autoconhecimento e consolidando sua capacidade de entregar resultados.

A maioria dos líderes não apresenta uma complexidade mental suficientemente capaz de acompanhar a complexidade do mundo

Então, como descreveria o perfil desejado para um profissional que busca exercer, hoje, posições de liderança?

Quando pensamos em líderes e como eles podem virar o jogo a favor da empresa, imaginamos uma pessoa que, além do domínio técnico do assunto, tenha a habilidade de conduzir assuntos polêmicos e não-cartesianos. Quanto mais avançamos neste mundo globalizado, mais percebemos a convergência de temas abrangentes que ganham, cada vez mais, contornos de complexidade e incerteza. O grande desafio das organizações é desdobrar esse imenso quadro e buscar reorganizá-lo em uma sequência possível de ser trabalhada até que se esteja pronto e preparado para lidar com tamanha grandeza de possibilidades.

E como vê as competências do líder daqui para a frente a partir desse cenário em que estamos?

Esse líder vai ter de entender a si mesmo e os outros, aprender a criar empatia, criar e mostrar interesse pelo crescimento profissional da equipe, respeitar diferenças pessoais, refinar senso de justiça, equilibrar interesses da equipe e do indivíduo, valorizar a diversidade, comunicar com honestidade e efetividade.

Como as empresas, e especialmente o RH, podem colaborar para a preparação desses novos líderes?

Os executivos precisam ser incentivados a buscar incessantemente o equilíbrio possível em sua vida pessoal e sintonizar seus pensamentos e ações com as constantes novas responsabilidades, os grandes desafios, a escassez de recursos, a melhoria dos resultados, os estilos de liderança em crise e os conceitos… e mais conceitos…

Os executivos precisarão se fortalecer internamente, aprofundando o seu autoconhecimento e consolidando sua capacidade de entregar resultados

E como os profissionais podem buscar essa qualificação?

Um caminho é compreender os novos significados trazidos pelas mudanças tecnológicas, científicas e sociais e como elas impactam no mundo dos negócios. Mas há outros também: buscar equilíbrio entre pensamento e ação; saber lidar com a contradição e o paradoxo; aprender que as incertezas também trazem oportunidades. Além disso, é importante aumentar a capacidade de resiliência, criar capacidade de gerenciar pensamentos distorcidos, aumentar capacidade de reagir ao estresse, valorizar o “estar presente”, expressar compaixão e sensibilidade, ganhar maturidade emocional, fazer o que diz, integrar eticamente desempenho e comportamento.

Quais os principais obstáculos a superar nessa transformação?

O principal é a mudança de mindset. A maioria dos líderes não apresenta uma complexidade mental suficientemente capaz de acompanhar a complexidade do mundo. A melhor forma de diminuir essa distância é vivenciar simultaneamente a autoconsciência, a consciência da equipe e a consciência da comunidade. Um líder consciente entende que pessoas e situações só podem crescer e produzir se houver condições saudáveis de trabalho. Devido aos níveis crescentes de complexidade, nenhuma pessoa é inteligente o suficiente para tomar todas as decisões. A inteligência coletiva precisa ser desenvolvida e acessada de forma que respostas certas possam ser encontradas para os enormes desafios. [Gumae Carvalho]

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