Entrevista

Ócio ajuda a tomar decisões melhores, diz especialista

Head de bem-estar do Hospital Israelita Albert Einstein e curador do Hapiness Brasil 2022, Márcio Marega comenta como a neurociência pode mostrar caminhos mais humanos para a gestão corporativa

de Jussara Goyano em 10 de novembro de 2022
Fwstudio/ Freepik.com

Márcio Marega lembra que o mercado corporativo deixou muito mais às claras a questão das soft skills. “Você vai ser contratado por conta das suas habilidades técnicas. Mas vai ser demitido por conta das suas habilidades emocionais”, recorda o executivo. Marega é head de Bem-estar do Hospital Israelita Albert Einstein e foi curador de conteúdo e palestrante no recente Hapiness Brasil 2022, evento apoiado pela Plataforma Melhor RH em outubro, organizado pela Fiter, empresa especializada em gestão de felicidade e saúde mental nas empresas. 


O encontro, com a presença de grandes líderes de RH e especialistas em desenvolvimento humano e felicidade, versou sobre a importância da neurociência na jornada do colaborador, do seu conhecimento para implementação de políticas de cuidado e desenvolvimento de pessoas, do onboard ao desligamento, criando processos mais humanos e orientados a uma cultura de bem-estar e performance nas empresas.

Em entrevista à Melhor RH, Marega aborda pontos principais das discussões presentes no evento e sobre ambientes corporativos psicologicamente seguros e com uma liderança humanizada e compassiva.

Os gestores e líderes de RH, ou fora da área, acreditam na importância de conhecer a neurociência, de conhecer o funcionamento cerebral e o comportamento humano? Já existe uma cultura sendo construída nesse sentido?

Foto de Marcio Marega, que diz que ócio ajuda a tomar decisões melhores
Marega, do Albert Einstein: Felicidade é fit para uma organização saudável

Eu acho que a sua última frase está certa. Existe uma cultura sendo construída nesse sentido. Mas arrisco afirmar que, na realidade, é tratada com superficialidade, no sentido do conceito, ainda. As pessoas sabem da importância, elas sabem que faz diferença você tratar essas questões de uma forma mais enfática e cuidadosa. Mas ainda é algo em construção. (Isso no mundo corporativo.  Para o mundo acadêmico e para a área da saúde, isso já é um pouco mais aprofundado, mas para o mundo corporativo ainda é algo que está numa superficialidade positiva). Positiva, porque é a partir daí que vem o movimento, e de algumas iniciativas é que a gente vai conseguir aprofundar para chegar naquilo que a gente de verdade acredita, que é a transformação de paradigma. A revolução de todo o sistema de gestão de cuidado do ser humano, olhando, aí sim, de verdade, para um lado muito mais humano. 

Você falou uma coisa importante, que é a questão de migrar para um sistema muito mais humano. O que você entende por humanidade, hoje, pensando em termos de gestão e performance corporativos? 

É a empatia da liderança. Eu acho que líderes empáticos conseguem impactar e ajudar o colaborador a performar melhor. Acho que o primeiro passo é uma transformação para uma liderança muito mais empática e compassiva. E também um ambiente psicologicamente muito mais seguro, onde as pessoas de verdade possam colocar seus medos, suas falhas, seus receios. E elas vão ter a certeza de que elas não vão ser julgadas por conta disso. É quando você tem total liberdade para explorar algo sem medo ou sem o receio do julgamento, que o resultado pode ser muito mais positivo. 


Você acredita que hoje há mais espaço para a vulnerabilidade, para perguntar “como é?”, “de que jeito eu faço?”, ou então pedir “me ensina? Não sei fazer, quero aprender”? Você acredita que a pandemia modificou esse tabu?

É, acredito sim. A gente observa grandes movimentos em grandes instituições nesse sentido… instituições que foram conhecidas até então como “trituradoras de carne”, literalmente. Hoje já desenvolvem, de uma forma assertiva, consistente, programas de cuidado com a saúde mental, bem-estar e felicidade dos seus colaboradores. A gente tem uma geração diferente de líderes.  Enfim, uma geração diferente de colaboradores. É quando a questão da humanização, a questão do respeito ao ser ouvido, a questão do ombro, a questão do abraço são muito mais importantes, ou fazem muito mais sentido, na verdade, do que há pouco tempo atrás, quando a “cultura do êxito” imperava. É um movimento muito interessante no compartilhar, no poder dizer,  no ter vulnerabilidade

Com essa questão da vulnerabilidade possível, a gente pode dizer também que está criando espaços mais criativos, não? As pessoas têm menos medo de expor ideias, propor soluções, produtos?

Uma decisão assertiva que não vai acontecer quando ela está envolta num furacão de ansiedade ou quando ela não está tranquila para tal tomada de decisão. O tumulto, a ansiedade são inimigos de uma tomada de decisão. 

Tem também a questão da do foco [ligada ao bem-estar, que ajuda na tomada de decisão]. Infelizmente, a gente não tem a capacidade – apesar de algumas pessoas acharem que sim – de fazer 1000 coisas ao mesmo tempo. É um percentual mínimo da população que tem essa condição, mas é mínimo mesmo, sabe? Daí a importância do mindfulness [consciência plena], da meditação, do criar pausas, do respirar consciente. O ócio também nos ajuda a tomar decisões mais claras, assertivas. Daí a importância, de verdade, de criar um tempo de descanso. A gente precisa disso para se preparar para condutas melhores. Descanso genuíno, mesmo, e não descansar e ficar no LinkedIn, por exemplo.  As redes sociais roubaram o nosso tempo.

Antigamente, se você estivesse numa fila de banco, estaria numa fila de banco, mesmo. Hoje, se você está numa fila qualquer, está com o smartphone, sendo margeado por informações. A tecnologia nos roubou o tempo do ócio, e a gente precisa voltar, dar um passinho atrás, se desconectar, literalmente, para poder tomar decisões melhores em todos os sentidos.

Está prevista uma nova edição do Hapiness Brasil em 2023?

A gente tem ideia de fazer um evento ainda maior, com uma participação maior de empresas, aprofundar conceitos importantes em neurociência, metacognição… Talvez trazer até um pouco da questão da medicina, do estilo de vida, para essa discussão. Sempre permeando a questão da felicidade. A gente acredita que a felicidade é o fit que o RH encontra para uma instituição mais saudável, mais inteligente e funcional. 

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