Gestão

Quantia certa

de Marco Santana e Hernan Ventura em 17 de julho de 2009

Atualmente, a economia global está bastante instável, para dizer o mínimo. Com a turbulência dos mercados e os economistas lutando para acompanhar os índices flutuantes, persiste um ambiente deflacionário em algumas partes do mundo. Mas análises recentes realizadas por empresas de inteligência de mercado identificam a inflação como um desafio recorrente em alguns países, especialmente na América Latina. No Brasil, os históricos baixos índices de inflação começam a subir. A Argentina, por exemplo, reportou um índice oficial de inflação de 7,2% no ano passado, mas alguns consultores privados avaliam que esse índice é ainda maior, variando entre 17% e 23%. E na Venezuela, a inflação está próxima dos 31%. As empresas precisam ter flexibilidade e pensar de modo estratégico para administrar seu pacote de remuneração monetária e de recompensas não monetárias nesse tipo de ambiente. Para ajudar essas organizações a não se perderem em meio a esses cenários, a seguir, apresentamos dez ações a serem levadas em conta:

1 Flexibilizar a administração salarial
As empresas multinacionais, acostumadas a restringir os aumentos da folha de pagamento para um único dígito, terão de fazer concessões. Por exemplo, num país em que a inflação está na casa de 30%, as organizações que tentarem acompanhar o ritmo podem precisar elevar sua folha de pagamento em 30%. Em situações excepcionais, as regras gerais nem sempre se aplicam.
 
2 Manter os níveis de remuneração alinhados com a inflação
As empresas não querem “pagar pela inflação”. No entanto, as multinacionais que se recusarem a aumentar os níveis de remuneração para cobrir as perdas salariais de uma inflação de dois dígitos ficarão atrás dos concorrentes – e, talvez, vejam seus empregados mais talentosos (ou de alto desempenho) “abandonarem o navio”, a fim de conseguirem manter seu poder aquisitivo. Tenha em mente que nem todos os empregados precisam receber o mesmo aumento. Por meio da utilização de ajustes diferenciados de mérito e mercado, as empresas podem concentrar seus aumentos em talentos críticos para reter os empregados mais importantes.
 
3 Enxergar além dos índices formais de inflação
Os bancos centrais algumas vezes subestimam os verdadeiros índices inflacionários, e os mecanismos de controle do governo sobre os preços de serviços podem também enviesar os números oficiais da inflação. De um ponto de vista de recompensas estratégicas, somente acompanhar o índice oficial pode não satisfazer os empregados, que têm de enfrentar inflação alta em suas compras diárias. Além disso, as empresas com ciclos de planejamento anual devem perceber que as previsões de inflação podem ser ajustadas no meio do ano. As organizações brasileiras aprenderam a duras penas que é sempre melhor planejar de modo conservador e esperar que o verdadeiro índice de inflação exceda pelo menos um a dois pontos percentuais acima do índice previsto. Se o índice de inflação aumentar, a empresa estará preparada. Se o índice permanecer estável, ela irá gerar economia.
 
4 Observar o mercado
Monitorar de perto o mercado, a fim de identificar ou até mesmo de antecipar as ações dos concorrentes em relação à remuneração. Em períodos inflacionários instáveis, o RH tem uma responsabilidade ainda maior de monitorar as práticas dos concorrentes e implementar políticas e ações que irão proteger o pool de talentos da empresa tanto no curto quanto no longo prazo.
 
5 Tornar-se inovador utilizando-se de ferramentas alternativas de retenção
Em um ambiente inflacionário em que recursos orçamentários significativos precisam ser destinados a aumentos de salários, as empresas inteligentes cogitam utilizar formas indiretas de adoçar o pacote de remuneração total do empregado. Na Argentina, algumas companhias concedem crédito descontado em folha aos empregados de alto desempenho, melhorando a retenção e proporcionando alívio àqueles que se encontram endividados. As empresas devem implementar somente as ferramentas alternativas de retenção que sejam altamente valorizadas pelos empregados e viáveis financeira e administrativamente.
 
6 Estudar reajustes salariais múltiplos anuais
Enquanto a inflação permanecer abaixo de 10%, as empresas podem manter um programa anual de ajustes salariais de maneira segura. Quando a inflação alcançar dois dígitos, as organizações deverão pensar em conceder múltiplos reajustes anuais. Imagine um ambiente cujo índice de inflação seja de 30%. Se a empresa X mantiver seu ajuste salarial anual enquanto seus concorrentes passem a seguir um programa semestral, ela estará pagando 15% menos que os valores de mercado após o reajuste semestral de seus concorrentes. Em um cenário como esse, não seria nenhuma surpresa se muitos dos mais inteligentes e capazes empregados da empresa X encontrassem novas oportunidades de trabalho nas empresas concorrentes, que pagam os valores de mercado.
 
7 Considerar o aumento do custo de benefícios
Mesmo as empresas que acreditam estar preparadas para lidar com os aumentos salariais algumas vezes se esquecem de incluir em suas previsões aumentos de benefícios ou de encargos. No Brasil, por exemplo, as indenizações são determinadas por porcentagem do salário. Quando há um aumento geral de salários, devido à inflação, as empresas têm de aumentar os valores orçados para pagamento de pensão e de outros benefícios. Mas a distância geográfica permite ao executivo examinar a situação de um modo um pouco mais frio e atuar de forma mais prudente. Afinal de contas, se você aumentar a remuneração menos do que devia, sempre pode acrescentar algo posteriormente. Mas se a organização exagera e aumenta demais, é muito difícil tirar o aumento. O melhor a fazer, nesse caso, é aguardar até que o mercado se estabilize.
 
8 Intensificar os programas de comunicação ao empregado
Os empregados que vivem em um ambiente inflacionário geralmente se apegam à mais visível evidência de inflação – por exemplo, um aumento de 50% no preço do leite – para exigir aumento salarial. As empresas devem responder com uma estratégia de comunicação de duas vertentes. Primeiramente, mostrar a eles o valor do pacote total de remuneração – salário, benefícios, bônus, plano de aposentadoria etc. Em segundo lugar, explicar o contexto do negócio e ser transparente por meio da comparação do pacote total de remuneração com as médias da indústria e com o índice geral de inflação.
 
9 Esteja preparado para “o dia seguinte”
Mesmo depois de a inflação ter baixado, as empresas podem continuar a sofrer pressões por aumento de salário para compensar uma perda de poder aquisitivo. Elas devem repelir tais alegações infundadas e, ao mesmo tempo, se assegurar de que os aumentos passados acompanharam de fato os competitivos movimentos do mercado. A inflação pode ter subido 30%, mas os salários de referência podem ter subido 40% em certas indústrias.
 
10 Buscar a vantagem competitiva
As empresas de setores que exigem pouca mão de obra podem ter uma flexibilidade significativa no front das recompensas estratégicas durante um período inflacionário, e as companhias que têm investido em automação podem tirar partido da sua relativa flexibilidade em aumentos por mérito (devido ao menor número de empregados) no recrutamento de novos talentos. Por outro lado, aquelas que prestam serviços e têm muitos empregados talvez necessitem conceber estratégias criativas para reter empregados de alto desempenho até o período inflacionário passar.

Para multinacionais que enfrentam um desafiador cenário inflacionário, a flexibilidade e o pensamento estratégico são primordiais para administrar as remunerações. O uso de um mix destas dez ferramentas irá possibilitar não apenas que elas sobrevivam nesse ambiente, mas que nele prosperem.
 
Marco Santana é gerente de relações com clientes da Watson Wyatt América Latina. Hernan Ventura é diretor, da área de consultoria de remuneração, da Watson Wyatt Argentina

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