Gestão

Quem somos?

de em 27 de setembro de 2010

Nenhuma companhia pode esquecer que sua vitalidade e sua imagem no mercado estão diretamente ligadas às pessoas que fazem parte de seu quadro de profissionais. Assim, entender como pensam e agem esses indivíduos é cada vez mais importante – seja para formatar programas de treinamento e desenvolvimento, seja para elaborar um projeto de expatriação ou plano de carreira -, e parte do sucesso de qualquer negócio. Mas, atualmente, qual a identidade do brasileiro? Algo mudou após mais de 20 anos de democracia e estabilização econômica no país?

Segundo o Projeto Brasilidade, primeiro da série de estudos da República, empresa de pesquisa de opinião pública, sim. O sociólogo e cientista político Rodrigo Mendes Ribeiro, coordenador do projeto, explica que há um novo Brasil, com importantes mudanças que originam uma sociedade mais complexa e rica; que não cabe mais em estereótipos. “O fardo histórico está sendo abandonado para abrigar novos traços de brasilidade”, completa.  Diante disso, as empresas precisam se (re) adequar para corresponder às novas expectativas e demandas sociais. “As companhias devem se ´autopensar´ diante de novos cenários e caminhos que se apresentam”, ressalta.
Isso porque, de acordo com o projeto, o brasileiro do século 21 é diferente. Os três perfis identificados – os que lutam pela sobrevivência (38%); os que aspiram pela estabilidade (26%); e os que buscam aprimoramento (36%) – são a base de uma nova sociedade, mais complexa e rica, mais amadurecida e informada.

E, ao contrário do defendido por vários autores do passado, o estudo apontou que o país possui uma identidade nacional consolidada, expressa em opiniões coesas entre os diferentes perfis socioeconômicos, que identificam características típicas dos brasileiros, como explica Ribeiro. “O brasileiro inicia a década com muita esperança e altivo, após ter passado por uma turbulência internacional que pouco o abalou. Apesar da desigualdade ainda presente, a pobreza e a insatisfação diminuíram; a classe média aumentou, assim como a renda, o acesso à internet e o consumo de itens de conforto – sete entre 10 brasileiros acreditam que o povo tem, hoje, maior poder de compra”, destaca o sociólogo.

E a avaliação positiva do país implica necessariamente autoestima mais elevada. Orgulho, avaliação positiva do país e visão de futuro põem por terra o “complexo de vira-lata”, expressão cunhada pelo escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues, associada ao “ser brasileiro”. Por “complexo de vira-lata”, Rodrigues entendia a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo.

Após identificar e analisar a mudança do cenário nacional, a pesquisa tomou como ponto de partida a pergunta: a autopercepção do brasileiro também mudou? As respostas deixam claro que sim. Com autoestima elevada, 78% dos entrevistados afirmaram ter orgulho de ser brasileiro. “Há otimismo. O futuro é visto com bons olhos e o chamado ´jeitinho brasileiro´, que na visão de estudiosos e acadêmicos sempre foi associado a características predominantemente negativas, hoje, ganhou uma dimensão muito mais positiva”, afirma. Trata-se de um atributo que, na visão dos entrevistados, mais define o que é ser brasileiro hoje – significa ser dotado de criatividade; flexibilidade; improviso; jogo de cintura; e um jeito especial de resolver os problemas mantendo a alegria. “Tudo o que nos difere, na percepção do brasileiro, da dureza e frieza dos europeus”, afirma Ribeiro, acrescentando que o brasileiro associa a competitividade e agressividade a características ruins, algo que não combina com a alma de quem nasceu no Brasil.

Identidade clara
De acordo com dados do projeto, há uma identidade nacional assentada em um elevado grau de coesão das opiniões em torno de características comuns aos brasileiros. Quando questionados sobre o que faz com que as pessoas se sintam brasileiras, os entrevistados deixam claro que predomina a visão do batalhador, com alta capacidade de superação; de alguém que mantém a alegria mesmo na adversidade; e faz uso do “jeitinho” como um recurso de adaptação social. Existem, claro, alguns matizes regionais ou de classe, mas o que predomina é uma identidade nacional bastante clara e definida.

 Além disso, a pesquisa aponta que, em contraposição ao ser humano em geral, o brasileiro se considera mais batalhador, mais alegre, mais solidário, mais criativo e inovador, mais prestativo, mais justo, mais bonito, mais sofrido, mais patriota, além de sempre dar um jeitinho e ter jogo de cintura. Esses traços revelam uma pessoa alegre, emocional e musical, que vive o presente e tem na adaptação e na flexibilidade a sua maior ferramenta de vida. Ou seja, um lutador otimista, que gosta do convívio e vive com pouco, segundo o estudo. Mas isso varia de região para região. Nas regiões Centro-Oeste e Norte – 31% e 35%, respectivamente – há os maiores índices da percepção do brasileiro como um batalhador. A característica de “nunca perder a esperança” recebe destaque nas classes A (32%) e B (27%); e nas regiões Norte (39%) e Nordeste (28%).

Como um batalhador, o brasileiro se considera um lutador permanente, que já nasceu em desvantagem. Justamente por isso transforma as fraquezas em fonte de energia: ele precisa de menos, aprende com a vida, adapta-se facilmente e inventa o que precisa. Por outro lado, também em relação ao ser humano em geral, o brasileiro se considera menos amigo, menos inteligente, menos corajoso, menos competitivo, menos agressivo, menos consumista e menos estressado.

Mas, embora não se veja como amigo, sabe que é solidário ao salvar quem necessita; afinal, amanhã pode ser ele a precisar de ajuda. Segundo Ribeiro, o brasileiro se acha menos amigo, pois acredita que se estreitar as relações terá de ajudar a criar os filhos do amigo, emprestar dinheiro ou oferecer o próprio nome para compras no crédito. “O brasileiro acredita que é patriota, embora isso não represente uma adesão ao país oficial, pois  sente vergonha dos governantes, dos políticos e da política. Mas é um indivíduo que acredita no cidadão, na força de vontade do povo e no potencial. Além disso, tem um jeito próprio e alegre de se relacionar com os outros, de tocar a vida”, acrescenta Ribeiro.

Sobre o projeto

O Projeto Brasilidade, primeiro da série Estudos da República, baseia-se na pesquisa da autopercepção do brasileiro, investigando o impacto de duas décadas de democracia e de estabilidade econômica na identidade e na autoestima nacional. Partindo de análises clássicas como as realizadas por Gilberto Freyre, Darcy Ribeiro, Sérgio Buarque de Holanda e Roberto DaMatta, República reuniu antropólogos, psicólogos, cientistas políticos e sociólogos para descobrir o que significa ser brasileiro no século 21 e qual o impacto desse período recente sobre a identidade nacional e a autoestima. Concluído em 2010,o estudo integrou uma equipe multidisciplinar composta por antropólogos, psicólogos, cientistas políticos e sociólogos, e baseou-se em perguntas do tipo: Como o brasileiro vê o país e o seu futuro dentro dele? Como toma decisões? Como reage diante dos estímulos da comunicação? e O que é a brasilidade, esse amálgama que leva pessoas tão diversas a identificar-se como uma só nação?

 

Os três perfis

Veja a seguir a hierarquia das necessidades dos brasileiros

Aprimoramento 36%
Com maior concentração nas classes A e B – sendo 56% de mulheres, maior presença entre a faixa etária de 18 a 30 anos e maiores de 50 anos -, os brasileiros na situação de aprimoramento valorizam primordialmente os aspectos relacionados ao lazer, à espiritualidade, ao cuidado com relacionamentos pessoais e à qualidade de vida. O grupo se mostrou heterogêneo e reúne a elite econômica e cultural do país, acolhendo a maior parcela dos movimentos emergentes na cultura, estética e consciência cidadã. Porém, por se encontrar em posição privilegiada em relação aos demais brasileiros, mostra um lado preconceituoso e soberbo, julgando-se melhor que os demais. Na percepção dos integrantes desse grupo, o brasileiro é um povo acomodado, flexível, corajoso, patriota, consumista e que sempre dá um jeitinho.

Estabilidade 26%
Há certa distribuição desse perfil entre as classes, embora haja maior concentração entre as pessoas das classes A, B e C; e mais homens (58%). Esses são os brasileiros que se preocupam com a valorização profissional, moradia, educação e trabalho. A maior concentração está na faixa etária entre 25 e 50 anos, pessoas que têm por hábito acompanhar o noticiário econômico. Esse grupo é representado por profissionais em cargos de responsabilidade; pessoas focadas em objetivos profissionais que abarcam melhoria de performance e empregabilidade. Por cuidar da família – pais, sogros, irmãos desempregados e amigos que perderam a posição devido a fusões – esse indivíduo reclama das mazelas do país e espera que alguém dê conta de resolvê-las, pois ele não tem tempo. Os integrantes desse grupo associam o brasileiro a características como: competitivo, estressado, inteligente, batalhador e prestativo.

Sobrevivência 38%
Com maior concentração nas classes C, D e E, os brasileiros desse grupo são 82%, sendo 56% mulheres e maior presença entre os com mais de 40 anos. Esse perfil valoriza a situação política, religiosidade, saúde e moradia; é o público-alvo dos programas sociais. Os que lutam pela sobrevivência se dizem felizes, otimistas e patriotas, pois a vida tem melhorado. Há mais conforto e a percepção dessa nova situação; o poder de compra é mais importante do que ser bem atendido. Além disso, entendem a mobilidade social e carregam a enorme vontade de ir além dessa melhora. Esse grupo associa o brasileiro a alegre/feliz, nada sensual, criativo, justo
e batalhador.

 

Sobre a pesquisa

Com módulos qualitativos e de quantificação, a pesquisa foi feita em março de 2010, com quatro grupos focais e 1.272 entrevistas (homens e mulheres, de 18 anos a 70 anos), residentes nas principais cidades brasileiras, pertencentes às classes A, B, C, D e E (critério Brasil). Do Sudesde, 55% dos entrevistados; 19% do Nordeste; 14% do Sul; 7% do Centro-Oeste; e 5% do Norte, sendo 48% dos entrevistados do sexo masculino e 53% feminino. A maioria dos entrevistados é jovem – 25,1% possuem entre 30 e 39 anos; seguidos de 21,9% com idade entre 18 e 24 anos; e 14,2% com idade entre 25 e 29 anos. Os entrevistados na faixa etária entre 50 e 59 anos são 12,1%; entre 60 e 64 anos são 3,5%; e entre 65 e 70 anos, 4,2%.

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