Carreira e Educação

Reskilling, um dos grandes desafios do futuro do trabalho

Estamos nos movendo na velocidade necessária para sanar a crise de aprendizagem que, em meio a outras crises, pode estar passando sem a evidência merecida?

de Redação em 19 de maio de 2022
Faceslab/ Freepik.com

Ana Guimarães*

O ano era 2018, e o Fórum Econômico Mundial alertava para a necessidade de preparar a força de trabalho para um novo conjunto de habilidades compatíveis com os avanços tecnológicos e com as mudanças provocadas por fatores socioeconômicos e demográficos. O relatório apresentado já apontava que 54% dos trabalhadores precisariam de requalificação até 2022

Chegamos em 2022 atravessando uma pandemia que ditou um ritmo ainda mais acelerado para as transformações em curso, além de termos atingido o recorde de escassez de talentos no Brasil — em 2021, 71% dos empregadores apontaram dificuldades em preencher suas vagas; no mundo, o percentual alcançou 69%. Os dados são da mais recente pesquisa do ManpowerGroup sobre o tema.

Pergunto-me se estamos nos movendo na velocidade necessária para sanar a crise de aprendizagem que, em meio a outras crises, pode estar passando sem a evidência merecida? Nessa reflexão, aprofundo o papel das empresas em fechar o gap, mas é importante sublinhar que esta é uma responsabilidade compartilhada entre organizações, profissionais e outras instituições, como o próprio governo, visto que a falta de pessoas qualificadas para ocupar funções expoentes da Quarta Revolução Industrial impacta diretamente a economia dos países.

Em um contexto de mudanças perpétuas, que impõe a inovação como regra para organizações prosperarem, novas habilidades surgem a cada dia. E líderes estão cientes disso. De acordo com a Deloitte Global Human Capital Trends 2021, 72% dos executivos afirmaram “a capacidade de seu pessoal de se adaptar, requalificar e assumir novas funções” como o aspecto mais importante ou o segundo mais importante para enfrentar futuras disrupções.

De forma geral, as pesquisas do ManpowerGroup indicam que apostar na combinação de soft skills (habilidades humanas) e tech skills (habilidades relacionadas à tecnologia) será o mais acertado para as empresas. Afinal, segundo o Fórum Econômico Mundial, até 2025, os humanos e as máquinas dividirão as tarefas relacionadas ao trabalho em uma proporção de 50-50, enquanto 97 milhões de novos empregos surgirão nas áreas de IA, Economia Verde e Economia de Cuidados. Ao olharmos para o período de retomada, fica claro que este movimento já está acontecendo: a recuperação em “K” representa a ascensão de profissões ligadas às áreas citadas acima e tem as habilidades essencialmente humanas como sustentação.  

Sendo assim, como estratégia para acompanhar o futuro e a digitização, que parecem sempre se antecipar com mudanças vertiginosas, o reskilling (requalificação) se apresenta como pilar central para as empresas preparem a força de trabalho para os desafios de hoje e do amanhã. Mais do que uma ação pontual ou para ‘cumprir tabela’, o reskilling pertence a uma cultura de aprendizagem comprometida com a criação e o desenvolvimento contínuo de talentos. 

Inclusive, este processo começa desde o recrutamento e seleção, momento em que deve ser avaliado mais do que a bagagem técnica do candidato, mas sim a sua capacidade de aprendizagem. Até porque se habilidades despontam na mesma medida que as transformações progridem, aprender, desaprender e aprender de novo deveria se tornar a norma.

Além de encontrar pessoas com esse perfil, as empresas ainda podem investir em um sistema de mapeamento de competências capaz de compreender as potências que já estão na organização e quais lacunas de habilidades precisam ser preenchidas para dar conta da crescente busca por inovação e sustentabilidade dos negócios no curto, médio e longo prazo. Dessa forma, as empresas terão mais clareza sobre como qualificar e requalificar as pessoas, em um exercício constante de atualização.

Neste ponto, vale ressaltar que, apesar do cerne dessa profunda reconfiguração morar nas novas tecnologias, existe outra camada que soma ao chamado por uma revolução de competências: a própria escolha dos trabalhadores. Nesta nova ordem que adentramos, profissionais estão convocando empresas a ouvirem o que precisam e desejam, não à toa observamos fenômenos de demissões voluntárias acontecendo nos Estados Unidos, no Brasil, na China.

Isso significa que para que as empresas possam ter sucesso e colham os frutos das suas ações de requalificação, é preciso considerar que liberar o potencial das pessoas implica em torná-las protagonistas de sua trilha de aprendizagem, entendendo quais interesses, paixões e objetivos elas têm para si mesmas e alinhando estes às necessidades e objetivos do negócio. Aqui, entra, por exemplo, a importância das conversas de carreira e da estratégia de realocação para outras áreas e funções dentro da empresa, nas quais têm mais chances de expandir a criatividade e impulsionar inovações. Pesquisa do LinkedIn, de 2021, mostra que “os funcionários que mudam para novos empregos internamente são 3,5 vezes mais propensos a serem funcionários engajados do que aqueles que permanecem em seus empregos atuais.” Ou seja, unida à requalificação, a mobilidade se apresenta como fator-chave para superar o desafio da criação e retenção de talentos.

A requalificação é um imperativo do nosso tempo, porque não se restringe a apenas a preservação das empresas, mas especialmente, porque está conectada à empregabilidade de milhões de pessoas pelo mundo, logo, atrelada às condições dignas de vida. Como disse Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, “a melhor maneira de promover uma sociedade mais coesa e inclusiva é proporcionar a todos um emprego e uma renda decentes. (…) A escala e a urgência dessa transformação exigem nada menos que uma revolução de requalificação”. Assim, espero que este chamado que já ecoa há anos não demore mais para gerar ações concretas e, principalmente, ágeis por parte das organizações para que o mundo, o trabalho e as pessoas possam seguir aprendendo — e evoluindo.

*Ana Guimarães, Diretora de Operações no ManpowerGroup Brasil

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