Mens sana in corpore sano. O provérbio é bastante claro: só quem está perfeitamente saudável, apresentando boas condições físicas e psicológicas, pode trabalhar bem. Preocupadas com a saúde de seus colaboradores, cada vez mais as áreas de RH investem na contratação de planos que atendam às suas necessidades. Mas o setor tem passado por uma série de mudanças, o que gera dúvidas na hora de escolher o plano mais adequado. A primeira dessas modificações foi implementada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que em novembro de 2009 estabeleceu a Resolução Normativa nº 195, que dispõe sobre novas regras para contratação de planos coletivos.
Outra mudança importante instituída pelo órgão é que não há mais aplicação de carências ou cobertura parcial temporária nos planos com 30 beneficiários ou mais. Em junho deste ano, a ANS aplicou mais uma resolução importante: a de nº 211, que garante 70 novas coberturas médicas e odontológicas a 44 milhões de beneficiários em planos de saúde.
A entrada de grandes consultorias também agita o setor. Em março deste ano, a Aon Consulting, empresa de consultoria de benefícios de saúde e previdência, adquiriu 100% da carteira da Ticket Seg, companhia que atua no mesmo segmento. Com a aquisição, a Aon adicionou 1 milhão de beneficiários, mais 200 mil vidas. Em julho, a consultoria realizou novo acordo, anunciando a fusão com a Hewitt Associates, uma das maiores empresas de consultoria de RH do mundo. A fusão cria uma das líderes globais em soluções de capital humano, com receita de 4,3 bilhões de dólares e 29 mil associados. Outro negócio importante no setor foi a aquisição de 70% da Qualicorp, corretora de planos de saúde, por 1,1 bilhão de reais pela gestora de fundos de private equity Carlyle.
Diante desse novo cenário, o que o profissional de RH pode esperar desse setor em 2011? A escolha do melhor plano para os colaboradores deverá incorporar mais alguns fatores? Segundo Sheila Clezar, diretora da Marsh Gestão de Benefícios Brasil, é preciso que as empresas busquem consultorias que apresentem ferramentas capazes de ajudar a empresa no entendimento do custo total relacionado à saúde de seus funcionários.”A gestão do benefício saúde exige indicadores financeiros, pois, no ranking dos custos empresariais, o custo direto com a saúde representa, em geral, o segundo maior gasto, atrás somente da folha de pagamento”, analisa.
Sheila também destaca os custos indiretos com a saúde dos funcionários que, muitas vezes, não são conhecidos pela empresa. “Entre eles estão: a perda de produtividade, absenteísmo, substituição do funcionário afastado, alteração da alíquota do Seguro Acidente de Trabalho (SAT) e do impacto do Fator Acidentário de Prevenção (FAP)”, complementa.
De acordo com a diretora, na hora de contratar um plano de saúde, o profissional de RH deve tomar os seguintes cuidados: considerar a elegibilidade e a abrangência geográfica do plano, a forma de custeio, o modelo de financiamento, multa ( run-off e/ou excedente de sinistralidade) em caso de rescisão extemporânea (antes do final de vigência do contrato) e o mecanismo de compartilhamento de risco com a operadora ( stop loss ). Para a especialista, é necessário considerar ainda: coberturas adicionais obrigatórias, a provisão técnica para eventos ocorridos e não avisados e as regras relacionadas aos eventuais usuários aposentados ou demitidos sem justa causa, beneficiados pelos artigos 30 e 31 da Lei 9.656/98. “Os pontos citados devem ser alvo da maior atenção no momento da contratação do plano de saúde coletivo. O reajuste único com periodicidade anual, associada à incorporação de novas tecnologias no rol de procedimentos, pode sugerir negociações mais densas e um aumento dos custos dos planos para as novas contratações, gerando impacto indireto, inclusive, para os beneficiários que contribuem para o plano”, analisa. Sheila acrescenta que, devido a essas novas exigências, houve redução do número de beneficiários para aplicação de carência e cobertura parcial temporária para planos com 30 beneficiários ou mais (antes, eram 50 beneficiários).
“A não ser que o beneficiário formalize o pedido de ingresso em até 30 dias da celebração do contrato coletivo ou de sua vinculação à pessoa jurídica contratante”, acrescenta. Segundo a consultora, para 2011 estão previstas ainda novas regras para os artigos 30 e 31 da Lei nº 9.656/98, que tratam da continuidade da cobertura de plano de saúde de trabalhadores demitidos sem justa causa e aposentados. “Essas regras esclarecerão as contradições na interpretação do que está expresso na lei, de forma a possibilitar sua aplicação em harmonia com os interesses das partes envolvidas nessa relação”, completa.
Outras mudanças previstas são fixação de prazos máximos para atendimento em planos de saúde e ampliação das regras de portabilidade de carências, com extensão da portabilidade para os beneficiários de planos coletivos por adesão para planos individuais e criação da portabilidade especial: válida para beneficiários de operadoras que não conseguiram encontrar empresas interessadas em absorver seus beneficiários quando tiveram a transferência de carteira compulsória decretada pela ANS. “Haverá, ainda, redução do período mínimo de permanência no plano de origem para um ano, a partir da segunda portabilidade e aumento no prazo para o exercício do direito de portabilidade de dois meses para quatro meses, a partir do mês de aniversário do contrato”, diz. A especialista acredita também que, em 2011, haverá uma nova atualização do rol de procedimentos, com início de vigência previsto para o primeiro semestre de 2012. Essa atualização deverá incluir estudo de viabilidade de assistência farmacêutica, à semelhança dos SUS, que fornece medicamentos a pacientes que utilizam postos e hospitais públicos.
Acompanhar a sinistralidade
Uma questão que vem ganhando destaque nas empresas e que deverá fazer parte da agenda do RH é lembrado por Vera Lúcia Bejatto, presidente da Victory Consulting. Ela explica que a área deverá apresentar uma equipe que inclua também profissionais da área de saúde, que acompanhem a evolução da sinistralidade do plano de saúde. “Essa é uma medida preventiva e que deverá salvaguardar a empresa de um reajuste pesado na renovação do contrato desse importante benefício”, avalia.
Já em relação à norma da ANS que criou a figura das administradoras de benefícios, Vera diz que elas já existiam, mas na realidade atuavam na gestão do plano de saúde, principalmente em planos de adesão de sindicatos e associações. “Essa é uma das características desse tipo de empresa. As atribuições são todas relacionadas ao cadastro de usuários no plano de saúde e à cobrança de boletos para pagamentos de mensalidades nos planos dessas entidades e avaliação de sinistros”, comenta.
Na opinião da presidente da Victory, as constantes alterações da ANS em relação à lei 9.656/98 e os impactos sobre os planos de saúde têm agravado o custo para as operadoras. “Isso ocorre porque cada resolução normativa inclui coberturas de alta complexidade e custos elevados. O que normalmente o RH das organizações tem observado é que o plano fica mais caro ano a ano”, acrescenta. Vera apresenta algumas dicas na hora de contratar o plano de benefício saúde: é preciso saber se a operadora aceitará o desenho do plano designado pela política de benefícios da companhia, que muitas vezes foge ao tradicional. “Além disso, deve-se observar a capilaridadade da rede credenciada, a flexibilidade para negociações de custos e a aceitação do grupo de inativos, como aposentados e agregados.”
Outro ponto que ela ressalta é a dos custos. Os atuários das operadoras devem levar em conta os seguintes aspectos: faixa etária da população e abrangência geográfica; distribuição dos planos pela pirâmide hierárquica e sinistralidade e o número de inativos, afastados da organização. “Como agora a RN 195 preconiza reajustes anuais, existe um rigor na avaliação por parte das operadoras, pois a recuperação de custos será realizada anualmente. Assim, se precificar abaixo do esperado para os custos assistenciais, nada poderá ser feito pela operadora para alinhamento em período inferior a 12 meses”, alerta.
Consultoria de benefícios
Com todas essas mudanças, ela acredita que ficará mais difícil para as empresas alterarem seus planos de saúde devido à escassez de opções no mercado com as recentes fusões e aquisições, que concentraram muito esse segmento. “O ideal é o RH ter uma consultoria de benefícios especializada e capacitada a pesquisar bem o mercado para que a relação seja mais fiel junto à operadora e com isso se obtenham melhores negociações para a gestão integrada da saúde, proporcionada pela consultoria”, comenta. Ela destaca que em 2011 itens como aprimoramento na gestão de saúde e qualidade de vida terão grande relevância no mundo corporativo. “Essas ferramentas serão valorizadas porque para controlar sinistros só existe uma ´receita de bolo´ que dá certo: programas de prevenção e promoção saúde, com introdução de ações de qualidade de vida para ´blindar´ reajustes elevados e manter a população mais saudável e produtiva”, conclui.
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