Saúde

Quando o corpo começa a pagar o preço

de Luiz Fernando Garcia em 12 de fevereiro de 2014

Dez horas diárias de trabalho, horários específicos para dar conta de equipes espalhadas pelo Brasil e Cone Sul, feriados e finais de semana com pouco descanso. Há 11 anos na empresa, o engenheiro Carlos Bertholdi, diretor da Avaya, firma de telecomunicações, não via problemas na rotina atribulada. Contudo, aos 45 anos de idade, o corpo começou a pagar o preço. Ao deixar os exercícios de lado, o executivo começou a ter problemas. “Há um ano, identifiquei problemas na lombar. As dores me impediam de ficar sentado por muito tempo e interferiam no meu humor”, conta. Essa interferência, diz, foi decisiva para que Bertholdi resolvesse cuidar da própria saúde há quatro meses. Mas teve um empurrãozinho. Há cerca de dois anos, a Avaya lançou o programa Viver Bem, que consiste em cuidar da saúde física, social, financeira e emocional dos funcionários. De acordo com a empresa, o programa tem adesão de 80% do quadro. Por meio do braço de saúde social, a empresa dá dicas de programas culturais e livros. Para ajudar a saúde financeira, a Avaya investe em palestras e parcerias que dão descontos. Para a saúde emocional, a empresa desenvolveu oferece centro de convivência e massoterapia. Para cuidar da saúde, a companhia dá orientação com ajuda de nutricionistas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, endócrinos dentro da empresa. Foi assim que Bertholdi começou a preocupar-se em ter uma rotina mais saudável.

O primeiro passo foi a consulta com nutricionais, para adequar a alimentação. O convênio com uma rede de academia permitiu ao executivo fazer exercícios como pilates e musculação. Resultado: 4 quilos a menos na balança e dores controladas. “A dor na lombar praticamente sumiu. Hoje, acordo mais cedo e tenho mais energia e disposição”, conta o executivo. Para Bertholdi, o apoio da empresa para cuidar da qualidade de vida é fundamental. “É um dos três pilares para eu ficar em uma empresa, ao lado de salário e desenvolvimento de carreira”, diz. “O fator qualidade de vida tem crescido como prioridade pra mim, até pelo momento em que estou na minha vida e na minha carreira. Hoje, eu me sinto muito melhor do que há dez anos em termos de saúde”, avalia.

Para vencer o desânimo

Há dois anos, a Acesso Digital, empresa de digitalização de documentos, implantou o programa Ser Saudável, que oferece aos funcionários nutricionista e personal trainer para melhorar os cuidados com a saúde. A ideia, segundo a empresa, nasceu a partir da constatação de que os funcionários estavam desanimados. Com o programa, o objetivo era aumentar o bem-estar e a disposição do quadro. Há cinco anos na companhia, Bernardo Jordão, de 33 anos, responsável pela área jurídica da Acesso, não demorou muito para abraçar a iniciativa. O executivo, conta, nunca teve graves problemas com a saúde, mas não estava satisfeito com o ritmo de vida que tinha. “Era completamente sedentário e não me preocupava com a alimentação”, diz. Com o programa, o executivo repensou a rotina. “Comecei a prestar atenção nisso em maio do ano passado. Foi uma conscientização promovida pela empresa”, conta Jordão. A partir daí, ele adequou a alimentação e entrou para o grupo de corrida da companhia. Hoje, é um dos líderes do programa e perdeu 7 quilos. “Foi um ganho de vários aspectos. Estou dormindo melhor, minhas atenção e produtividade aumentaram muito e minha disposição mudou”, conta.

Segundo a empresa, desde o início do programa o desempenho dos funcionários mudou, com aumento da disposição, da autoestima e da atenção. Hoje, em média, 25 pessoas por mês participam do grupo de corrida e caminhada da empresa, que investe 0,4% do faturamento anual com o programa. “É um diferencial da empresa e representa até mais que aumento de salário. Sinto que a gente tem um engajamento maior quando a empresa se preocupa com a qualidade de vida e saúde dos funcionários”, acredita o executivo.

Destravar

Foi durante as sessões de ginástica laboral da empresa que Max dos Santos, de 34 anos, gerente de sistemas da Arcon, firma de gestão de segurança de dados, percebeu que estava um pouco “travado”. “Percebi que alguns movimentos eu tinha dificuldades de fazer e vi, a partir daí, o quanto estava largado comigo mesmo”, avalia. A atenção com a saúde e qualidade de vida veio com a ajuda da empresa, que implantou no início de 2012 o Move Arcon, programa cujo objetivo é melhorar a qualidade de vida dos funcionários, oferecendo atividades como corrida, ginástica laboral e quick massage. Além disso, segundo a empresa, a ideia é aumentar a integração entre pessoas e equipes. Hoje, 30 pessoas participam do programa e a companhia investiu cerca de R$ 60 mil neste ano. Para 2013, a ideia é ampliar o projeto aos familiares dos funcionários. Para Santos, a preocupação da empresa deu resultados para além da melhora da saúde. “Passei a ser mais atencioso e percebi que não tinha que ficar na rotina de trabalho, trabalho e trabalho”, conta ele que trabalhava em média 10 horas diárias e hoje consegue manter uma rotina de 8 horas de trabalho. “Vivia muito cansado, não tinha concentração nenhuma. Hoje sou mais disciplinado e produtivo”, avalia. Apesar dos incentivos, o executivo acredita ser da pessoa a responsabilidade pela própria saúde. “Sempre ficamos com desculpas de que nunca temos tempo, mas 80% da responsabilidade é nossa. A empresa tem de dar os recursos e os instrumentos para isso”, diz.



ENTREVISTA

Mohamad Akl, presidente da Central Nacional Unimed, sexta maior operadora de planos de saúde do Brasil, concentra 13% do mercado de saúde corporativa, com quase 1,3 milhão de beneficiários e faturamento superior a R$ 1,8 bilhão em 2012. Deve chegar aos R$ 2 bilhões em 2013.

Verificamos que oferecer planos de saúde não é mais garantia de ter profissionais saudáveis nas empresas. O que está ocorrendo na sua avaliação?
O Programa de Medicina Preventiva da Central Nacional Unimed atua com dois focos: ações para nossos quase 900 colaboradores, e para os funcionários das empresas que nos contratam. Nossa experiência indica que, hoje, a saúde tem várias dimensões. Ainda que a assistência médica seja excelente, é fundamental, também, que os colaboradores se alimentem bem, pratiquem exercícios físicos regularmente, não fumem, bebam moderadamente e façam exames médicos periodicamente (mediante acompanhamento médico). Com o aumento da longevidade, todos querem viver mais e melhor, e o plano de saúde, sem dúvida, é um fator primordial para isso. Mas, sem mudança de hábitos, será mais difícil evitar doenças e combatê-las. Por exemplo, os resultados no tratamento de cardiopatas serão bem melhores se eles reduzirem o peso, pararem de fumar e se exercitarem. A operadora tem, também, um Programa de Alimentação saudável e uma nutricionista na empresa, que atende seus colaboradores.

Qual o limite das empresas para a melhora da saúde dos funcionários?
Como operadora de planos de saúde corporativos com abrangência nacional, percebemos que as ações desejáveis são oferecer um bom plano de saúde e estimular os funcionários a levar uma vida mais equilibrada e saudável. A promoção da saúde, uma de nossas ações preventivas (realizada para clientes e para nossos colaboradores), é o lado educativo, constituído por campanhas, cartilhas, palestras etc. Outra iniciativa que sempre dá bons resultados é incentivar a prática de atividades físicas e esportivas, por exemplo, incluindo academia de ginástica no pacote de benefícios dos funcionários. As companhias que têm refeitório no trabalho podem oferecer cardápios mais saudáveis. Os limites do que as empresas podem fazer decorre dos recursos financeiros disponíveis e do nível de adesão dos profissionais. Cabe Í s operadoras, como a CNU, desenhar o programa preventivo mais adequado ao cliente. Em 2012 a CNU deu início a mais um programa voltado Í  qualidade de vida de seus colaboradores, o Grupo de Corrida e Caminhada.

Até que ponto a empresa é responsável pela saúde dos seus funcionários?
Uma empresa não pode obrigar um funcionário a ser mais saudável, somente incentivá-lo, por meio de programas de medicina preventiva e promoção da saúde.

Qual a importância para a empresa de se implantar programas de saúde e qualidade de vida para os funcionários?
Isso vale para a CNU e para nossos contratantes: funcionário saudável e feliz atende seus clientes com dedicação e carinho. É mais bem humorado e falta muito menos ao trabalho. Há uma relação direta entre o desempenho profissional e o índice de felicidade no trabalho. E saúde, obviamente, é um dos mais importantes vetores da qualidade de vida.

Que tipo de ação é eficaz para chamar a atenção dos funcionários sobre a saúde deles?
São várias ações combinadas: divulgação pelos meios de comunicação da empresa (jornais, revistas, murais, boletins no site da empresa, e-mails e torpedos SMS), por meio de palestras e em eventos especiais. Também são muito importantes os eventos esportivos, especialmente os que envolvam os familiares diretos (filhos e cônjuges). Um dos serviços prestados pela Medicina Preventiva da CNU que fazem mais sucesso são os torpedos SMS (por exemplo, para enfatizar a importância de um cliente hipertenso tomar os medicamentos prescritos pelo médico, mesmo quando se sentir bem). Há também na operadora um Programa de Gestão de Saúde.

Parcerias com as empresas e a CNU, por exemplo, custam quanto?
Os preços das ações de Medicina Preventiva variam de acordo com o porte e o número de funcionários envolvidos. Mas são programas que se pagam, porque é sempre mais barato evitar a doença do que tratá-la.

O que a CNU oferece e como ela atua junto Í s empresas?
A CNU oferece Í s empresas clientes o Programa Gestão de Saúde que visa auxiliar os beneficiários na manutenção do equilíbrio de saúde. Para atingir este objetivo a CNU fornece aos beneficiários informações simples e essenciais sobre as principais doenças, utilizando desde ligações telefônicas até torpedos. Tudo isto para que o usuário seja um parceiro atuante na manutenção de sua saúde. No ano de 2012 foram feitas 59.948 ligações telefônicas,  51.398 torpedos foram enviados e 3.670 visitas domiciliares realizadas. Além disso,  temos um Programa de Prevenção na Empresa, que oferece aos clientes ações para a promoção da saúde, prevenção de doenças e incentivo a hábitos saudáveis, com periodicidade e duração definidas previamente. Em 2012, os resultados nas empresas contratantes foram: população exposta – 47.777  vidas; população atendida com ações individualizadas – 19.095 vidas; população exposta Í  informação por meio de folhetos educativos – 27.987 vidas. Também realizamos, em 2012, nossa Campanha contra o Câncer, com quatro focos: mamografia, colo de útero, próstata e colorretal. Incentivamos a realização de 12.460 consultas e exames preventivos, em beneficiários selecionados dentre os clientes da CNU que não haviam feito esta prevenção nos últimos dois anos, segundo recomendações do Instituto Nacional do Câncer (INCA), por faixa etária e sexo. Neste caso, a iniciativa foi nossa, sem coparticipação (custo) para o cliente.

Sabemos que os ganhos de ações como essas de qualidade de vida/saúde são difíceis de mensurar. Vocês conseguem/conseguiram mensurar o retorno que as empresas parceiras têm? Qual a natureza desses retornos (financeiro, produtividade…)?
Realmente, é muito difícil dizer que determinada pessoa não desenvolveu uma doença porque participou de um programa de medicina preventiva. Mas é isso que ocorre, efetivamente. As empresas têm retornos tangíveis, como redução do absenteísmo, da rotatividade, bem como o incremento do ͍ndice de Felicidade no Trabalho, com consequente aumento do nível de satisfação dos clientes.

Até que ponto, na sua avaliação, programas de qualidade de vida/saúde ganham pontos com os executivos? Eles veem valor nessas iniciativas?
Estes programas são relativamente novos no Brasil. O próprio conceito de ´qualidade de vida´ é recente. Temos avançado com maior percepção dos executivos da importância de prevenir doenças evitáveis. Há, contudo, um longo caminho pela frente, até que estes programas sejam totalmente compreendidos e aceitos. Afinal, o ser humano reluta muito em mudar hábitos arraigados, mesmo quando são altamente nocivos, como o tabagismo e o sedentarismo.

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