Assim como a mulher tem direito a licença maternidade, o homem também pode receber o benefício. Por lei, pais de recém-nascidos ou que adotaram seus filhos e que são contratados segundo a CLT tem direito à licença de 5 dias, sendo prorrogável por mais 15. Segundo o relatório “Situação Paterna no Brasil”, realizado pelo Instituto Promundo, apontou que 82% dos entrevistados concordam com a lei e fariam o possível para estar envolvidos com os cuidados dos filhos, porém apenas 68% tiraram a licença paternidade.
O papel das empresas e dos homens diante deste cenário foi tema do painel “Boa hora para todes: O impacto da licença parental inclusiva”, do 2º Fórum Melhor RH Diversidade e Inclusão, realizado em 1º de novembro, e organizado pelo Cecom- Centro de Estudos da Comunicação e Plataformas Melhor RH e Negócios da Comunicação. Participaram do debate os speakers Flavia Lisboa Porto, diretora de Recursos Humanos da Yara Brasil; Neila Mara Lopes, head de Diversidade & Inclusão da Sanofi e Tiago Koch Monteiro, idealizador do projeto Homem Paterno.
A licença parental já é vista por muitas empresas como um pilar de governança em sua agenda de ESG (sigla em inglês para environmental, social and governance – ambiental, social e governança, em português). O “S” da sigla engloba práticas de gestão voltadas para a diversidade e inclusão.
Para Flávia Lisboa, as empresas precisam proporcionar aos seus funcionários o direito de participar da vida familiar, criando regras internas que tragam o bom funcionamento do ESG na companhia, e para que não seja apenas uma sigla. “Se fala tanto em ESG, mas um futuro para quem? Temos que olhar nossa cadeia de valor e olhar quem são meus clientes, quem são meus fornecedores, quem são meus funcionários, porque quando fizermos o corte demográfico nós estamos falando de mulheres e homens, de negros, de pessoas com deficiência, estamos falando de pessoas com orientações diferentes; entender isso é importante para conversar com a população e também olhar para nossos processos e políticas e revisitados”, ressalta Lisboa.
Homens tem dificuldade para pedir licença parental
“Muitas empresas ainda precisam se adaptar às mudanças”, afirma Neila Lopes. A head de Diversidade e Inclusão ressalta que a agenda da diversidade inclui também a parentalidade em sua lista de prioridades para que homens e mulheres possam exercer seus papéis nos primeiros meses dos filhos, porque explicita “de maneira potente o tema da masculinidade e da parentalidade. Embora o cenário atual não seja possível, eu vejo como positivo para que homens e mulheres possam ter equidade”.
Porém, a especialista percebe que alguns homens sentem dificuldade em pedir a licença porque, mesmo tendo esse benefício, ele ainda não é integralmente aproveitado ainda, muitos não usufruem por medo de perder o emprego, medo de perder oportunidades, medo retaliações na volta, medo de deixar os colegas sobrecarregados, ou não ter apoio.
Tiago observa que em muitas empresas ainda é tabu discutir a licença paternidade além do previsto em lei, seja pelo quadro de funcionários ou pela história de muitos pais trabalharem e não participar dos cuidados com os filhos nos primeiros anos. Para o especialista, ainda precisa ser reforçado a necessidade da licença paternidade para os pais além dos 20 dias previstos em lei. “O cenário da licença paternidade no Brasil é negativo, existe uma ordem mercadológica. É uma discussão cara para a sociedade. Nenhum político quer propor isso, porque é vista como um prejuízo. Na minha visão é uma distinção do setor econômico” diz Thiago.
Embora muitas empresas ainda discutam o tema, ela já é realidade em algumas companhias. Nelia lembra que com a pandemia o processo de humanização do trabalho, alavancado principalmente pelo home office, a parentalidade que ficava muitas vezes fora da empresa passou a incorporar o cotidiano dos empregados: Foi preciso derrubar algumas barreiras corporativas e os papéis sociais da parentalidade que ficassem do muro para fora agora fazem parte do cotidiano de quem trabalha”.
Thiago percebe que em muitas empresas que administra palestras e cursos, a licença paterna ainda é vista com preconceito e resignada apenas ao papel da mulher e sugere: “Precisa ter o entendimento de que a chegada de um ser humano vai mudar a dinâmica familiar e vai mudar o bem-estar”.
Para o especialista, falta entendimento de empresas das questões pessoais de seus funcionários: “Este entendimento pode estar bem avançado, falta por parte de homens a relevância do cuidado do início da vida para as empresas. Trazer o olhar do cuidado como prioritário é ainda uma barreira. Ainda caro para uma parcela das empresas e é visto como custo, como algo que não precisamos”.
Os speakers concordam que a mudança de pensamento das empresas começa pelos profissionais de Recursos Humanos. Nélia complementa lembrando que, com o nascimento dos filhos, o trabalho acaba privando mulheres do trabalho e homens de exercerem sua paternidade, e “essa questão deveria ser trabalhada nos RHs das empresas. Essa reflexão foi acelerada pela pandemia. Nas áreas de RH foi preciso criar soluções que incluíssem esses papéis”.
Flavia aponta que muitas das ações nos primeiros anos de vida dos filhos são importantes para o futuro, até em como o futuro adulto irá lidar com questões sociais e políticas: “O cuidado hoje impacta o acesso ao cuidado no futuro. Tem uma relação no futuro quem cuida, os anos de educação de uma criança, eles tem impacto na percepção de corrupção, tem impacto no ponto de vista de segurança pública. A organização não é uma bolha e reflete no que acontece fora do muro da empresa”.
Sanofi e Yara têm adotado licença paternidade estendida
A empresa Yara Brasil Fertilizantes tem mais de 6 mil colaboradores, e mais da metade de seus funcionários homens. No ano passado começou a oferecer aos funcionários que tiveram filhos licença paternidade de seis meses. Ela detalha: “No começo me assustou, mas percebi que precisa entender o que significaria o marido em casa seis meses e que não entende qual é o papel dele; será que ele vem para casa para me cobrar — cadê minha comida, cadê minha roupa? Porque, ao oferecemos a licença, abre um diálogo sobre qual é o papel e de quem é esse papel, para não criamos um problema maior “.
Essa prática está sendo cada vez mais presente no mercado de trabalho, segundo pesquisa do Boston Consulting Group (BCG) e Ernst & Young 80% das empresas que adotam a licença paternidade estendida observaram melhora na qualidade de serviço dos servidores, 77% acreditam que o benefício pode ser um diferencial na escolha da empresa.
A speaker afirma que a companhia tem que olhar de forma igualitária para os funcionários: “Não é licença maternidade ou licença paternidade e licença parental, ou seja, qualquer pessoa que dê à luz a uma criança ou que seja responsável pelo cuidado de uma criança, essa pessoa teria direito a um período de 30 dias de licença”, aponta Flávia.
Na Sanofi, a prática já é adotada há quase três anos, e abrange todos os modelos de famílias. Inicialmente a empresa ouviu os funcionários sobre a iniciativa, onde teve total aprovação. “Nos entendemos a licença parental, hoje os homens podem optar por sair vinte dias ou quatro meses ou seis meses. Fazemos isso a quase três anos, os primeiros dois anos foram de muito aprendizado, mantivemos uma adesão de 50% dos funcionários. Olhamos a experiência do que saíram e do que optaram por não sair e de que maneira poderemos alavancar essa adesão. Temos metas para alcançar 60% de adoção de licença estendida pelos homens até o fim deste ano, já chegamos até agora a 80%. Finaliza Nélia.
(Texto e reportagem: Luis Zak/ Publicado em Portal da Comunicação)
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