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“Estamos na era da inteligência artificial e do machine learning e esse é um caminho sem volta”

Carla Ricchetti, official de Investimentos da International Finance Corporation (IFC), fala sobre o impacto da tecnologia nas tendências do trabalho

A tão sonhada era tecnológica, a tecnologia das coisas, inteligência artificial e a integração global já é o presente. Estamos hiper conectados com nossos smartphones e/ou computadores de qualquer lugar do planeta Terra. O mundo da tecnologia está cada vez mais presente no nosso cotidiano, a cada dia novas tendências surgem e transformam nossos hábitos e a maneira de interagir com a vida. 

A official de Investimentos da International Finance Corporation (IFC), Carla Ricchetti, onde trabalha com tecnologias limpas, energia renovável e tecnologias disruptivas há 14 anos e conta sobre a importância da tecnologia nos dias de hoje:

MELHOR – Hoje, tem como viver sem tecnologia?

CARLA RICCHETTI – Certamente sim, mas a vida seria muito mais difícil. A cada dia a tecnologia se consolida mais em nossas vidas facilitando o cotidiano. A nossa rotina tornou-se muito mais digital em todos os aspectos, incluindo comunicação, compras, reservas em hotéis e restaurantes, administração e pagamentos. Acessamos informações em tempo real e, consequentemente, temos a oportunidade de fazer melhores escolhas, com mais recursos e de forma eficiente e barata.

A tecnologia democratizou processos, informações e agora está acelerando incrivelmente o desenvolvimento de nossa sociedade. Foram 30 anos para a eletricidade alcançar 10% de penetração e 25 anos para o telefone alcançar os mesmos 10% de penetração. Os tablets, por outro lado, levaram 5 anos para atingir a mesma taxa de 10% de penetração entre as pessoas, enquanto os smartphones levaram 10 anos para alcançar 40%. Essas estatísticas demonstram como o amadurecimento de várias tecnologias está impulsionando o crescimento exponencial de todos os setores econômicos. A revolução tecnológica vai seguir transformando as próximas décadas de maneira acentuada. Contudo, o que esperamos de fato é que a tecnologia também seja um catalisador de maior desenvolvimento econômico, social e cultural no planeta.

MELHOR – O que seria da economia e do trabalho se não existisse a tecnologia durante a pandemia?

CARLA RICCHETTI – O impacto da pandemia na economia e no trabalho seria muito mais profundo se não fosse pelo suporte da tecnologia. Um exemplo claro é o impacto positivo em pequenas e médias empresas como restaurantes, comerciantes varejistas e empresas de serviços. Muitas dessas empresas costumavam resistir ou adiar o processo de digitalização. Entretanto, durante a pandemia perceberam que o acesso a recursos tecnológicos foi fundamental para a administração do trabalho remoto de funcionários, o acesso a fornecedores e consumidores, e a otimização das vendas online. Perceberam também que a digitalização ajudou a reduzir custos, aumentar o alcance das ferramentas de marketing e facilitar a distribuição. Muitas dessas pequenas e médias empresas teriam que fechar permanentemente se não fosse pelo amparo de diferentes tecnologias, plataformas digitais e processos de inovação constante. Daqui para frente, o nível de digitalização vai ditar a competitividade das empresas no mercado. Quem não se adaptar não participará dessa nova economia digital.

MELHOR – Como a empresa pode se preparar para as mudanças e/ou implementação tecnológica dentro dos departamentos? E qual seria a importância do RH neste momento?

CARLA RICCHETTI – Estamos na era da inteligência artificial e do machine learning e esse é um caminho sem volta. Essa tendência está transformando a dinâmica de empresas de todos os tamanhos. Há um estudo realizado recentemente pela Harvard University que confirma como o segredo da implementação e harmonização da inteligência artificial e diversas tecnologias complementares estará centrado nas pessoas. 

Do ponto de vista corporativo, ganhar competitividade nessa fase requer muito mais do que tecnologia e digitalização. Requer transformação organizacional. Nesse aspecto, o RH tem um papel essencial na arquitetura e na implementação desse processo bem como na atração e retenção de talentos. Por que empresas como Google e Apple exemplificam essa transformação organizacional tão bem? Essas companhias não somente têm tecnologias, mas transformaram a maneira com que fazem negócios. Empresas líderes têm um sistema organizacional em que os seres humanos têm suas capacidades incrementadas pela tecnologia. São inovadores e estão sempre se adaptando.

MELHOR – Você acredita que a alta do desemprego está relacionada com a substituição da mão de obra?

CARLA RICCHETTI – A pandemia colocou as economias em ritmo de recessão ou baixo crescimento. Essa crise aliada a processos de digitalização e automação tem impulsionado uma alteração na dinâmica de demanda e oferta de qualificações no mercado de trabalho. De acordo com um estudo publicado em 2020 pelo Fórum Econômico Mundial, 42% das principais competências necessárias para executar os trabalhos hoje serão reformuladas nos próximos dois anos. Portanto, há uma necessidade imediata de recapacitar pelo 1 bilhão de pessoas até 2030 para que as mesmas estejam qualificadas para as demandas que surgirão.

Países do mundo todo precisarão focar em uma recapacitação em massa que, sem dúvida, vai requerer colaboração de todas as partes interessadas, incluindo governos e setor privado.

MELHOR – Quais as tendências ainda estão por vir?

CARLA RICCHETTI – Três tendências interessantes me vêm à mente: (1) impacto da convergência de tecnologias no mercado de trabalho; (2) trabalho fracionado; e (3) carreiras múltiplas. 

Com relação à convergência de tecnologias, vale lembrar que estamos em um momento histórico em que muitas tecnologias de ponta como computação quântica, inteligência artificial e 5G estão amadurecendo ao mesmo tempo. Isso desencadeará uma grande onda de avanços nas economias mundiais nas próximas décadas. Um verdadeiro salto de inovação que promoverá a disruptura de vários setores da economia e, com isso, afetará a forma como as relações de trabalho ocorrem. 

Nesse processo, profissões antigas estão morrendo e novas estão nascendo. O trabalho fracionado também é uma outra tendência que veio para ficar. Essa nova geração está buscando mais flexibilidade para poder viajar sem ter que estar preso a um lugar. É uma mudança cultural em que geografia não é mais um empecilho para a prestação de serviço a empresas ou projetos interessantes ao redor do mundo. Trabalho fracionado está se tornando também uma tendência institucional, com várias startups focadas no conceito e ganhando muita tração. Além disso, traz benefícios para empresas maiores, já que permite a contratação de profissionais de forma temporária, sempre de acordo com demanda específica.

A tendência de carreiras múltiplas também está crescendo. Hoje o ambiente corporativo é menos hierárquico, mais descentralizado na tomada de decisões e com times colaborando em países diferentes. Está morrendo aquele conceito de fidelidade a determinada empresa porque o mundo está muito dinâmico e o aprendizado pode ocorrer de forma muito rápida e distribuída. Portanto, será muito comum que essa nova geração, que inclusive aprende instantaneamente online, queira diversificar suas carreiras no decorrer dos anos. 

MELHOR – A vida é altamente impactada pelas relações com internet, redes sociais e outros meios tecnológicos. Como você acha que esta situação afeta a saúde mental das pessoas?

CARLA RICCHETTI – Várias universidades e centros de excelência na área da saúde estão publicando pesquisas que mostram como o uso excessivo da internet, redes sociais e jogos/entretenimento podem causar impactos negativos na saúde mental das pessoas como ansiedade, falta de sono, alterações hormonais e muitos outros. Alguns hospitais e clínicas como o Hospital das Crianças em Boston, nos Estados Unidos, já oferecem tratamento especializado para imprensa e internet voltados para crianças e adolescentes viciados em atividades online e com dificuldades sociais na vida real em função do vício.

Eu, particularmente, sinto a diferença na minha noite de sono quando fico longe das telas durante uma hora antes de dormir ou quando passo algumas horas no fim de semana fazendo alguma atividade perto da natureza ou com família e amigos. Acredito que daqui para frente o grande desafio será aprender a balancear o nosso tempo online com o offline. Essa não será uma tarefa fácil, mas será essencial para nos mantermos sãos dentro dessa nova era digital.

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