Inovação

Qual o papel do RH em uma cultura de inovação?

Fundamental como agente transformador da cultura organizacional, o RH é figura central para tornar a empresa mais inovadora.  E as inovações no setor também impactam diretamente esse processo

de Jussara Goyano em 9 de maio de 2024
Ipopba, via Freepik.com

O RH, longe de ser um departamento operacional, emerge como um catalisador essencial na migração cultural das empresas para uma mentalidade inovadora. Isso não necessariamente diz respeito ao uso de tecnologia, embora ele seja quase compulsório e confira velocidade a diversos dos processos estabelecidos para o RH ou pelo departamento para toda a empresa em um contexto transformacional. Ao abraçar a mudança, desenvolver novas práticas e promover um mindset de crescimento, o setor se torna um agente fundamental na criação de uma cultura organizacional ágil, flexível e orientada para o futuro.

Gerson Ferreira: introdução ao tema da inovação

Essa foi, em síntese, a lição percebida em conversa recente entre líderes do segmento, membros do Conselho de Especialistas da Plataforma Melhor RH.

Gerson Ferreira, Sócio Co-fundador da Innoway, consultoria em Gestão da Inovação, foi convidado a introduzir o tema “A importância da inovação em recursos humanos – Explorando novas abordagens para o progresso organizacional” no bate-papo, promovendo insights sobre como uma organização pode, de fato, se tornar inovadora, e sobre quais ações do RH contribuem nesse sentido e o tornam mais inovador.

Fabiano Rangel, Diretor Institucional, Articulação e Parceria na Associação Brasileira dos Profissionais pelo Desenvolvimento Sustentável, conduziu as reflexões junto ao consultor.

Apresentada durante o encontro,  pesquisa divulgada em janeiro pela PWC revela um cenário em que 41% dos CEOs brasileiros acreditam que suas organizações não sobreviverão ao mercado sem mudanças significativas. No mundo, esse percentual chega a 45%. Neste ponto se discute o papel do RH em apoiar a mudança e a inovação para a perenidade e saúde das companhias.

“Um ponto importante nesse contexto é justamente a questão da cultura organizacional”, pontua Ferreira, da Innoway.

Daniela Plesnik: “Evoluímos pouco”

Daniela Plesnik, Executiva Senior de Recursos Humanos, CHO,  lembra que esse quadro não é novo, quando cita Peter Drucker, em fala de 1978, já prevendo necessidade de flexibilidade adaptativa das companhias, diante de “mudanças frenéticas e tecnológicas”, impondo necessidade de instituir um ambiente organizacional propício à transformação e à inovação. “Desde 78 isso é discutido e a gente evoluiu pouco”, enfatiza a executiva, constatando que a Pandemia promoveu esforços nesse sentido, que de certa forma perderam intensidade no período atual.

Renato Rovina, Diretor de RH na BNP Paribas, lembra que esse contexto frenético só vem se acentuando, com os ciclos de transformações empresariais encurtados e o aumento de responsabilidades do RH, das lideranças e dos colaboradores.

Renato Rovina:
“Muita incerteza”

“Quando a gente fala, hoje, de mudança, os ciclos de tecnologia, de inovação, de entrada de novos concorrentes no mercado, ele está tão intenso que eu já não tenho mais muito tempo de montar uma planilha de gestão de mudança e trabalhar todos esses aspectos”, observa o executivo, incluindo aí a preparação de equipes e lideranças para os impactos transformacionais.

“Esse encurtamento dos ciclos de inovação, dos ciclos de mudança internos, externos, eles têm dificultado, têm adicionado aí o desafio do RH, colocando pressão na alta liderança para também continuar relevante”, enfatiza, lembrando que o setor, além de tudo, é o elo entre líderes e colaboradores, sendo impactado também pela pressão que estes percebem. “Tem muita incerteza.”

O papel do bem-estar na inovação

Segundo a Harvard Business Review, em estudo realizado com mais de 230 empresas, 89% delas se encontram focadas em performance, mas sob o custo da colaboração e comunicação comprometidas e de um alto nível de estresse e ansiedade em longo prazo.

“Considerando que a sinergia entre a inovação e a valorização dos colaboradores, que inclui, entre outros temas, as iniciativas para promover a saúde e o bem-estar, como o RH pode tratar esse desafio dos estilos de cultura?”, provoca Ferreira, da Innoway.

Douglas Almeida: dualidade entre paliativos e dia a dia que não muda

Douglas Almeida,  Diretor de Recursos Humanos para América Latina, reconhece a pressão constante sobre os profissionais devido às suas metas, a falta de tempo para mudanças estruturais e a necessidade de uma abordagem mais profunda e abrangente para lidar com essas questões, que impactam diretamente na criação de um ambiente de trabalho flexível, apto a mudanças e propício à inovação. 

“As empresas começam a desenhar programas estruturados para poder gerenciar o estresse, para poder diminuir a ansiedade e aí você começa a ver parcerias que vão muito para o lado de sessões psicológicas ou atividades físicas. Só que, na prática, o que os empregados percebem, o que o colaborador sente? Uma dualidade, porque ele começa a ver uma oferta de produtos e de soluções que são bacanas, são interessantes, mas o dia a dia dele não muda.”

Jorgete Lemos: foco em saúde proativa

Também certa da necessidade de mudanças na abordagem do tema, Jorgete Lemos, Diretora Executiva da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços, destaca, contudo, a importância de se implementar uma cultura proativa de saúde, argumentando que a não opção por esse modelo gera perdas e adoecimento coletivo.  “Acho que temos que quantificar e demonstrar as perdas pela inexistência de uma cultura de saúde”, ressalta. “Não precisamos mais ter a cultura da doença, nós temos que focar a cultura proativa em saúde, nos resultados que estamos deixando de ter”, destaca a executiva.

Sérgio Amad, CEO da Fiter, por sua vez, traz à tona a necessidade de capacitar as lideranças para lidar com questões de saúde mental e segurança psicológica no ambiente de trabalho. Ele destaca a importância de estabelecer canais de comunicação eficazes e promover um ambiente de confiança e colaboração para gerar engajamento dos colaboradores e impulsionar a inovação.

Paola Klee: valores alinhados

Ainda sobre o tema do bem-estar, Paola Klee, Fundadora e CEO da YC – You Career Future,  enfatiza a importância de uma cultura organizacional saudável e equilibrada, ainda que sem perder de vista os resultados, sobretudo os financeiros. Ela destaca a necessidade de considerar a saúde e o bem-estar dos colaboradores como elementos essenciais para o sucesso a longo prazo da organização. Nesse processo, ressalta a importância de alinhar os valores organizacionais com a estratégia de negócios, garantindo uma abordagem sustentável e centrada nas pessoas.

Patrícia Alexandre: desgaste do RH

Voltando o olhar especificamente sobre o profissional de RH, Patrícia Alexandre, Diretora Executiva na Sinapro (Sindicato das Agências de Propaganda), ressalta o cansaço enfrentado no dia a dia de suas atribuições. “Estou em contato diariamente com várias empresas de todos os tamanhos e o que eu tenho percebido é o desgaste dos profissionais de RH, a falta de engajamento, o quanto também estão cansados”, destaca a executiva. 

“Parece que eles cansaram de não ser ouvidos pelas lideranças”, completa, mencionando o adoecimento desses executivos e, em muitos casos, a mudança de área buscada pelos profissionais de RH. “Eu tenho visto muitos profissionais fazendo transição de carreira neste momento, por conta desse desgaste, desse cansaço.”

Sérgio Amad: discrepância entre manuais e realidade

Devem incidir sobre o RH os mesmos olhares presentes na abordagem centrada em pessoas e seu bem-estar, inserida na gestão estratégica da empresa. Com o cuidado, no entanto, de a alta gestão ter em vista o papel estratégico do setor, dando a ele a devida atenção e cuidando para que não adoeça.

Além disso, incidindo sobre o RH e sobre todos os colaboradores “existe uma discrepância entre o que está escrito no manual de cultura e o que acontece na realidade nas empresas… entre o que está publicado no LinkedIn e o que acontece na realidade”, destaca Amad, da Fiter. Para ele, vivenciamos uma oportunidade clara de revisar a cultura, harmonizar o que é preciso e criar dados para ampliar o fit cultural e tornar o ambiente mais acolhedor.

Segurança psicológica, erros e acertos

Levantamento da Innoway com mais de 900 executivos mostra que aprendizagem organizacional e segurança psicológica são, para a maioria, medidas importantes para estimular um ambiente criativo e inovador na empresa.

Fabiano Rangel: fim do comando e controle

Fabiano Rangel, Diretor Institucional, Articulação e Parceria na Associação Brasileira dos Profissionais pelo Desenvolvimento Sustentável, reconhece o contexto e também a importância da inovação e da mudança organizacional para o momento de constantes transformações do mercado. Ele defende o papel dos RHs no ajuste cultural necessário, destacando alguns pontos de reflexão para o setor, no que diz respeito a um ambiente mais adaptável e com maior segurança psicológica.

A cultura do FUD – FEAR,  UNCERTAINTY and  DOUBT (Medo, Incerteza e Dúvida) -, segundo o executivo,  “resulta em alguns problemas crônicos dentro da organização, em particular, essa crise existencial das lideranças”. Ele entende que “todo o movimento que a gente está vendo está nos impondo repensar qual é o papel da liderança dentro das organizações, se aquele modelo que a gente aprendeu dentro de uma lógica behaviorista, de comando e controle, planejamento e processo,  funciona”.

Para Rangel, “dentro de uma sociedade, hoje, em que o nível de desenvolvimento organizacional, e até produtivo, já não é mais tão braçal, mas muito mais intelectual, isso mexe em estruturas muito sedimentadas, que abalam diretamente essa questão da segurança psicológica”.

Gustavo Tavares: pertencimento é essencial

Gustavo Tavares, Gerente Geral para América Latina no Top Employers Institute, ressalta, por sua vez, para um ambiente criativo e inovador, a importância do pertencimento no contexto da diversidade, equidade e inclusão nas organizações. Ele destacou que a criação de um ambiente de trabalho acolhedor, onde as pessoas se sintam parte de um grupo, é fundamental para promover a segurança psicológica e fomentar a inovação.

“E o que viabiliza essa questão do pertencimento é justamente você ter canais de comunicação de mão dupla, dar oportunidade para o colaborador se expressar, dar espaços formais e informais para o colaborador trazer as suas devolutivas”, comenta Tavares. “Não adianta chegar e falar que vamos ter um plano maravilhoso para fomentar as ideias, mas as pessoas não se sentirem confortáveis para compartilhar algo.”

Renato Rovina, do BNP Paribas, destacou a questão do erro e como as empresas lidam com as falhas dos colaboradores: “A gente sente muito que empresas ou times não têm muito espaço para erro, que as pessoas são tolhidas ou são penalizadas por tentarem algo diferente, e até impelidas a ocultar erros, o que é pior ainda para a gestão de risco corporativo”, observa o executivo. “Essa questão da segurança psicológica tem muito a ver com o quanto a empresa está disposta a bancar alguns erros, aceitá-los em prol da inovação. Obviamente a gente está falando dos erros de boa-fé. Isso ainda é pouco valorizado.”

Já sobre treinamentos organizacionais, Rovina destaca que as mentorias são um caminho importante. “A gente fala muito de treinamento peer-to-peer e do quanto as pessoas aprendem com as outras pessoas, isso segue muito vivo”, destaca. “Tem aquela questão dos 70, 20 e 10. Os 70 você aprende fazendo e os 20 você aprende com mentoria e com apoio interno, acho que isso ainda segue vivo. A gente acredita muito nesse modelo de treinamento na nossa organização, de aprender de quem já sabe, além de um consultor externo, um parceiro, que não tem aquela vivência interna.”

Edvaldo Picolo,  HR Senior Manager for Employee Center, Services & HR Information System na Volkswagen Brasil, destaca a diferença entre o que é obrigatório ou desejável, no que diz respeito a treinamentos, e o desafio que é medir o ROI – Retorno sobre Investimento – de cada um deles.

Edvaldo Picolo: desafio do ROI sobre treinamentos

“O treinamento obrigatório é o código de conduta, é o compliance, é o LGPD. Isso é uma regra da companhia, tem que ser feito”, desenvolve o executivo. Já no treinamento desejável, “eu entro no espaço da exploração, é aquilo que eu vou fazer para melhorar o desempenho da minha atividade, ou o que eu vou fazer para dar um salto qualitativo na maneira com que eu realizo o meu trabalho, ou até treinamentos que eu gosto, que não têm nada a ver com a minha função”, continua. Na escolha do que é o melhor para o colaborador, “a gente tem uma responsabilidade extremamente grande e às vezes o desafio é como a gente calcula o ROI, como eu faço aquele treinamento se transformar, depois, em investimento para a companhia”, destaca Picolo.

O auxílio de dados

A evolução das empresas trouxe à tona a necessidade de incorporar dados no RH. Entretanto, a transição não é fácil devido à resistência e à falta de profissionais capacitados em análise de dados. A adaptação a essa nova cultura de dados demanda tempo e uma mudança profunda na mentalidade.

Um levantamento com 416 executivos (CEOs e Diretoria) pela Innoway mostra cultura crescente em coleta e uso de dados internos e externos para tomada de decisões, e perfil Data Driven em expansão (orientado basicamente por análise de dados, com capacidade crítica para cruzar informações e analisar evidências para decisões estratégicas). 

Ferreira, da Innoway, observa que a gestão e a compreensão dos dados tornam-se cruciais no ambiente de RH. E lembra que, apesar, muitas vezes, da abundância de dados disponíveis, o desafio reside em saber como gerenciá-los e utilizá-los para tomadas de decisão estratégicas. Surge a dúvida: Os profissionais de RH estão preparados para lidar com essa transformação?

Daniela Plesnik responde que não. Lembra o bloqueio histórico do setor, que até recentemente era cobrado a considerar apenas pessoas, não dados, e que há registros de que o RH foi um dos últimos rincões organizacionais a tomar conhecimento das estratégias de People Analytics. E mesmo os colaboradores, até pouco tempo atrás, tinham medo das pesquisas internas, sobretudo da confidencialidade das respostas. Recorda que o RH vive entre apurar dados e agir rapidamente, porque mudar a cultura leva tempo. Não é possível depender exclusivamente de pesquisas.  

Nesse sentido, Amad, da Fiter, destaca a importância da simplicidade para lidar com dados.

“A gente aprendeu, para ver se a empresa não vai entrar em falência, a olhar o passivo dela e olhar o balanço do R&D, saber o EBITDA, ter essas informações na ponta da língua”, explica o executivo. “E qual é o índice de ser humano, quando a gente olha o bem-estar das pessoas, que de fato a gente domina e que a gente está olhando? Se a gente estiver olhando 20 pesquisas, tem grandes chances de a gente nem lembrar desses números. Então, o que eu vejo, muitas vezes, é excesso de dados”, pontua Amad.

Também há a percepção de desconexão da realidade nas pesquisas, entende, por sua vez, Paola, da YC – You Career Future. “Eu já vi, em vários momentos, RH trazendo dados desconectados da realidade e aí as demais áreas questionam aquele dado, gerando um embate sem fim”, registra a executiva, lembrando a importância de acompanhar evidências e evitar vieses nas pesquisas.

Sobre possíveis embates e vieses, Jorgete, da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços, lembra que os dados são “a ponta do iceberg”. “A pesquisa é pontual, as pessoas se preparam para falar o que a empresa quer ouvir. Então, quem é que pode dizer se essa leitura é correta ou não? É quem está junto aos protagonistas, aos atores principais, que são os colaboradores, são os líderes devidamente preparados”, entende Jorgete. Mais uma vez, a atenção recai sobre as lideranças.

Tema para premiação

Ações criativas e inovadoras em RH estão sob a lupa do Prêmio Melhor RH Innovation, promovido pela Plataforma Melhor RH e pelo CECOM – Centro de Estudos da Comunicação. A iniciativa já desponta como um dos principais selos para reconhecer cases que se destacam por contemplar transformações apoiadas pelos recursos humanos. As inscrições regulares para a premiação estão abertas e vão até o fim de maio (31/05).

O Prêmio compreende três diferentes pilares – Tema, Performance e Grandes Ideias -, que somam 21 categorias. Os inscritos serão avaliados em cada uma delas por uma equipe de aproximadamente 70 profissionais de notório conhecimento e reconhecida trajetória profissional na área. Os premiados em cada categoria constituirão um banco de cases em inovação no RH, à disposição gratuitamente para consulta do mercado. Os participantes também concorrem a dois prêmios especiais, que serão entregues às marcas com mais troféus e certificados, uma vez que é possível, de forma condicionada a regras específicas da premiação, a participação em mais de uma categoria ou pilar.

Muito além da tecnologia – Não se trata necessariamente de tecnologia ou disrupção, mas de novas maneiras de fazer as coisas: processos, produtos, carreiras, posicionamentos e conexões que surgem inovadores, gerando valor às companhias e benefícios às equipes e envolvidos. É esse tipo de movimento que o Prêmio Melhor RH Innovation quer reconhecer, explica Márcio Cardial, Publisher da Plataforma Melhor RH e diretor do CECOM.

Além da criatividade e da inovação, “por meio desse reconhecimento, incentiva-se a disseminação das melhores práticas, inspira-se a busca pela excelência no RH e fortalece-se a imagem do setor de RH como agente transformador nas organizações”, entende o executivo.

O evento de entrega da premiação e revelação dos destaques de cada categoria está previsto para novembro deste ano.
____________________________
Para ter acesso ao regulamento e realizar a inscrição, visite o site www.melhorrhinnovation.com.br



Compartilhe nas redes sociais!

Enviar por e-mail