Saúde

Suporte Especial

de Fabíola Lago em 21 de setembro de 2009
Daud, da Vivo: qualquer funcionário com cancêr tem seu caso discutido no comitê diretivo da empresa

Foi um procedimento preventivo da empresa, o check-up, que salvou a vida de Sandra Lucena, gerente nacional de vendas da Ticket. Com o diagnóstico de câncer na mama ainda inicial, foi possível fazer o tratamento rapidamente com excelentes chances de cura. Mas o apoio psicológico e financeiro da organização também foi determinante para o sucesso do tratamento, na opinião da executiva. “Existem gastos imprescindíveis com procedimentos estéticos que colaboram no combate à depressão”, pontua Sandra.

Sandra é um dos vários exemplos de pacientes que, com o diagnóstico precoce e apoio e tratamento adequados, conseguiu dar a volta por cima em relação a uma doença que, até algumas décadas atrás, poucas pessoas sequer ousavam falar o nome, usavam apenas a expressão “aquela doença”. Trata-se, sem dúvida, de um problema de saúde grave, que traz receio ao paciente e à família. No entanto, felizmente, é cada vez maior o índice de pessoas que superam a doença e voltam à sua rotina profissional e familiar. E, nesse processo, contam com o apoio da empresa em que trabalham por meio de recursos médicos, psicológico, além da segurança de que o emprego estará garantido acima de qualquer circunstância. E o mundo corporativo está, cada vez mais, também, preocupado em oferecer esse suporte e campanhas de conscientização sobre a doença.

Na Seguradora Tókio Marine, por exemplo, julho foi determinado como o mês de campanha contra o câncer. Foram distribuídas cartilhas com informações sobre causas, sintomas e prevenção de diversos tipos de câncer, como pulmão, boca e laringe, pele, infantil, bexiga, próstata, mama e colo de útero. Quem quisesse também podia fazer uma consulta com especialistas do Hospital do Câncer A.C. Camargo, parceiro da ação. “Toda família já teve um caso de câncer que afetou sua vida. A única receita é a prevenção”, afirma Flávio Ayrosa, diretor de RH e sustentabilidade da seguradora.

Sem discriminar
Durante os seis meses de tratamento, Sandra ia às sessões de quimioterapia na sexta-feira e na segunda já estava trabalhando. Fazia palestras, treinamento, relacionamento com clientes e um contact center de 120 pessoas. Ela conta que ficou ainda mais vaidosa no período. E o estímulo da equipe foi motivador. Só se ausentou durante quinze dias, quando fez a cirurgia de mastectomia. “Senti a empresa muito próxima de mim, como se fosse minha família. Todos ficaram assustados, mas ninguém fugiu”, orgulha-se.

De fato, é comum que haja uma comoção entre os colegas ao saberem que alguém está com câncer. No entanto, como ressalta Michel Daud, diretor de saúde e qualidade de vida da Vivo, minimizar riscos e desgastes pode ser discriminatório e pode colaborar para um quadro de depressão, inclusive agravando a doença. Por isso mesmo, a equipe médica é porta-voz oficial de qualquer informação sobre a saúde do colega de trabalho. Nesse sentido, ele conta que na Vivo são feitas pequenas reuniões para esclarecer dúvidas e orientar sobre a melhor forma de lidar com a situação.

Entre os especialistas ouvidos por MELHOR, um consenso se destaca: saber lidar com a situação também significa saber lidar com o medo de ser demitido do funcionário paciente – afinal, muitas vezes o tratamento é longo e exige a ausência do profissional. Por isso, a falta de tato da empresa pode afetar profundamente o equilíbrio psicológico do paciente, o que reforça a necessidade de mantê-lo na equipe e ajudá-lo a reorganizar o trabalho de forma transparente.

A gerente de RH da Allis, Fernanda Brunetto, já passou por duas experiências marcantes de funcionários com câncer, ambos gestores. Ela lembra que, nos casos, tanto a área de recursos humanos quanto o diretor mais próximo dos funcionários foram envolvidos no processo de suporte. “Foram seis meses de tratamento e foi acordado que quem cobriria a área durante o tratamento seria um colega, cujo vinculo profissional já era muito bom. Tocavam o projeto juntos. E o paciente não só se recuperou bem como foi premiado pela sua superação. Voltou ativamente e desenvolveu o projeto em que estava envolvido”, conta.

Já no segundo caso, a gerente relata que a pessoa infelizmente foi diagnosticada já em processo de metástase. O gestor ficou muito deprimido e, apesar do acompanhamento psicológico, acabou sofrendo muito por não conseguir trabalhar no mesmo ritmo simultâneo ao tratamento e pediu demissão. “Mas foi uma decisão que partiu dele”, diz Fernanda.

Seis casos de câncer nos últimos seis anos. Essa é a experiência do diretor de RH, Miguel Monzu, na Astrazeneca, laboratório que fabrica entre outros produtos medicamentos oncológicos de ponta. Monzu chegou a lidar com até três casos de câncer na empresa simultaneamente. “Felizmente, conseguimos um resultado bastante feliz na gestão dessas situações”, avalia. Faz parte dos princípios da companhia não fazer substituições e garantir o emprego acima de qualquer circunstância.

Monzu conta que um diretor, apesar do câncer no pulmão, normalmente agressivo, manteve uma sobrevida de dois anos e meio. Fazia quimioterapia e voltava para trabalhar. Na avaliação do diretor de RH, o fato de manter-se útil e produtivo, desenvolvendo projetos, foi determinante para que o executivo lutasse contra a doença por tanto tempo. Os demais pacientes estão tratados e trabalhando normalmente, claro, com monitoramente necessário pós-câncer.

“Vida e morte infelizmente fazem parte da história de uma empresa”, analisa Thierry Giraud, presidente da Sage XRT. O executivo, ele mesmo sobrevivente de um tumor na juventude, já perdeu dois funcionários com câncer – uma secretária e um engenheiro de software, ambos com óbito muito rápido. Além do apoio médico e financeiro, presidente, diretores e colegas visitaram os pacientes durante todo o curto período de sobrevida. Como a empresa trabalha com tecnologia da informação, os projetos em andamento tinham backups atualizados e foi possível mantê-los ativos, apesar da tristeza de toda a equipe.

Muito além do emprego
Além da garantia do emprego, uma atitude nobre por parte da empresa, é preciso saber conduzir também outros aspectos que envolvem o tratamento de câncer. Apoio psicológico à família, recursos financeiros para medicamentos, consultas em hospitais de referência e exames laboratoriais de ponta também são fundamentais nesse momento. Na Vivo, qualquer funcionário, executivo ou não, assim como seus ascendentes e dependentes, com câncer, tem seu caso discutido no comitê diretivo da empresa. Os tratamentos são realizados nos melhores hospitais de São Paulo, com estadia paga também para acompanhantes quando trabalham em qualquer outro lugar do país.

Para a gerente de benefícios da Ticket, Catarina Jacob, com 23 anos de RH, esse é um investimento da empresa no qual todos ganham. A companhia possui um fundo de reserva em coparticipação com funcionários justamente para essas situações imprevistas que envolvem a saúde. Além disso, há um seguro adicional para câncer, o Viva mulher e o Homem vivo, que dá aporte financeiro ao paciente em vida. Em caso de óbito, 100% é destinado aos familiares. São cerca de quatro mil vidas seguradas. A prevenção para doenças crônicas também está no dia a dia da empresa: há orientação médica, nutricionistas e incentivo para atividades físicas.

A Astrazeneca, líder na produção de medicamentos de ponta para a área oncológica, especialmente nas áreas de câncer de mama e de próstata, por sua vez, fornece toda medicação necessária não só para funcionários, mas também para familiares. São medicações imprescindíveis para o tratamento que podem custar até quatro mil reais por mês.

Segundo Monzu, quando há o caso de doenças mais graves entre os funcionários, as que não forem possíveis de se enquadrar no benefício saúde (mais precisamente no plano de assistência médica), a empresa arca com 100% dos custos do tratamento, como, por exemplo, um exame por cintilografia (que permite obter imagens de processos fisiológicos que ocorrem em nosso organismo). Com presença marcante na área de oncologia, a Astrazeneca também usufrui
do relacionamento com oncologistas para proporcionar o melhor tratamento aos seus colaboradores.

Para o oncologista do Hospital A.C. Camargo, José Augusto Rinck Júnior, as empresas podem ajudar o paciente de câncer de varias formas. Num primeiro momento, proporcionando o acesso pleno aos médicos, procedimentos, exames e tratamentos necessários. Ter a compreensão de que o diagnóstico e o tratamento podem requerer períodos de interrupção parcial ou integral de suas funções, e, especialmente, uma vez tratado com sucesso – pode ser a cura ou o controle da doença – dar ao funcionário o retorno de suas funções. “Se houver sequelas ou riscos que o tratamento pode acarretar, em vez de afastamento ou aposentadoria precoce, mudar sua função e dar o treinamento, caso necessário”, acrescenta o médico.

Segundo Rinck, há inúmeras histórias de pacientes que, após tratados, não só retornaram às suas atividades como passaram a desenvolvê-las de forma muito mais motivada e eficiente, servindo de verdadeiros exemplos de como “enfrentar e superar não somente esta estigmatizante doença, como qualquer obstáculo que a vida pode ter”.

Conexão aparente

Existe uma relação entre a vida estressada dos dias de hoje e um aumento dos casos de câncer?

Apesar das campanhas de prevenção, da informação maciça sobre a importância de um estilo de vida saudável, um mito tem cercado o câncer: o aumento da incidência de casos em pessoas mais jovens, fruto da atribulada vida contemporânea. Sandra Lucena, da Ticket, disse que conheceu várias mulheres da sua faixa etária, de 35 anos, com câncer e, coincidência ou não, com perfis muito parecidos: mães, workholics, inquietas com a carreira e com pouco tempo para si. Thierry Giroud, o presidente da Sage-XRT, acredita que sua geração, também na faixa dos 35 anos, fuma, bebe e, especialmente, está conectada demais: um mundo de wireless, celulares, palms e tantas outras ondas de rádio passando pelo ar permanentemente.

Para Vera Bejatto, diretora da Victory Consulting, os executivos são mais exigidos e, portanto, se transformam em verdadeiros escritórios ambulantes com notebook, blackbarrys e celulares invadindo o seu espaço pessoal, gerando pouco comprometimento com uma vida saudável. No entanto, apesar de um panorama verídico, não há estudos que comprovem o aumento da doença.

Segundo o oncologista José Augusto Rinck Júnior, não existem dados que mostrem uma incidência maior em faixas etárias menores que as habituais para cada câncer. Estudos epidemiológicos investigam se há ou não esta tendência. “O que talvez traga essa impressão é o fato de termos, atualmente, um acesso maior, ainda que muito aquém de alguns países, mas muito à frente de outros, aos métodos de rastreamento precoce e mesmo de investigação diagnóstica, o que tem facilitado e aumentado o diagnóstico de câncer”, explica.

O médico esclarece ainda que o câncer decorre de um erro no processo de proliferação de uma célula normal, que pode ser induzido por alterações herdadas dos pais ou da família (hereditário), por alterações induzidas por fatores indutores de câncer (exposições a agentes carcinogênicos), por aumento na idade e consequentemente maior chance de ter um erro nesse processo, ou por combinações de todos esses fatores. “Assim sendo, são considerados fatores de risco para o câncer: falta de exercícios, obesidade, dieta irregular, álcool, fumo, poluição, entre outros.”
Quanto ao estresse, traumas psicológicos (demissão, por exemplo) ou depressão, o oncologista diz que, embora sejam buscadas associações com o desenvolvimento do câncer, nenhum estudo até o momento foi capaz de mostrar com clareza que possam ser fatores desencadeadores da doença. “Obviamente, jornadas extenuantes estão comumente associadas a estilos de vida geralmente ricos em fatores de riscos conhecidos para o desenvolvimento de câncer como tabagismo, etilismo, má alimentação e falta de atividade física”, conclui.

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