O mercado de trabalho brasileiro passa por um processo de transformação que amplia as oportunidades para profissionais acima dos 50 anos. Em um cenário de envelhecimento populacional e revisão das políticas de diversidade, empresas de diferentes setores começam a adotar práticas estruturadas para atrair, reter e valorizar esses talentos. Mais do que uma ação de inclusão, a contratação de profissionais 50+ tem se mostrado uma estratégia eficiente para fortalecer a cultura organizacional, ampliar a troca de conhecimento e impulsionar a produtividade.
Paralelamente, cresce a percepção de que o envelhecimento da força de trabalho pode representar uma vantagem competitiva. Companhias que estimulam a convivência entre gerações observam maior engajamento, redução de rotatividade e melhoria na qualidade das entregas. Essa combinação de experiência, equilíbrio emocional e propósito coletivo vem se consolidando como um dos diferenciais mais relevantes da gestão de pessoas no País.
Confiança e maturidade como parte do DNA

Na Rede Confiança Supermercados, a diversidade etária faz parte da cultura organizacional desde a fundação. Há 42 anos, a empresa valoriza trajetórias longas e promove oportunidades para que colaboradores cresçam internamente. “A experiência dos 50+ não é projeto pontual, é reflexo do jeito como valorizamos as pessoas”, afirma Liliane Adachi, diretora de Recursos Humanos.
Com mais de 5 mil colaboradores, a varejista de Bauru (SP) criou a campanha “Confiança e Maturidade: porque talento não tem idade”, incentivando candidatos 50+ a se inscreverem nos processos seletivos. A iniciativa reforçou a mensagem de que talento independe da idade e contribuiu para reduzir o viés etário. “A presença dos mais experientes eleva o nível das equipes, reduz conflitos e melhora a produtividade”, diz Liliane.
A rede também aposta em treinamentos on the job e práticas de gamificação, estimulando a convivência entre gerações. Jovens aprendem com a visão prática dos mais maduros, enquanto os veteranos se beneficiam da agilidade e das novas tecnologias. O resultado é um ambiente equilibrado, colaborativo e resiliente.
Diversidade etária com estratégia e propósito

Na Sodexo, a diversidade geracional integra a estratégia global de sustentabilidade e o plano de ESG da companhia. “Garantir a inclusão e a representatividade de diferentes perfis faz parte do nosso DNA”, afirma Lilian Rauld, gerente de Sustentabilidade e ESG.
Com cerca de 47 mil colaboradores no Brasil, sendo 28% acima de 50 anos, a empresa mantém programas formais de Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I) desde o início dos anos 2000. Um dos destaques é o Guia Sodexo 50+, que aborda saúde, qualidade de vida, educação financeira e direitos da pessoa idosa. “Queremos que todos os colaboradores tenham autonomia e protagonismo em todas as fases da vida”, explica Lilian.
Outro destaque é o Programa Vitalidade, que incentiva o envelhecimento saudável e promove ações com foco no bem-estar físico e emocional. A Sodexo também mantém grupos de conversa sobre climatério e menopausa, reforçando a importância da saúde integral e do acolhimento. “Equipes diversas trazem perspectivas complementares e impulsionam a inovação em serviços e processos”, completa.
Visão estratégica, maturidade e respeito técnico

Na Invent Smart Intralogistics Solutions, o olhar para o público 50+ surgiu de forma natural. “Sempre valorizamos a experiência e a diversidade como pilares da nossa cultura”, diz Andréa Delmanto, gestora de Recursos Humanos. Profissionais acima dessa faixa etária representam 30% da força de trabalho, especialmente em áreas técnicas e de automação.
Andréa afirma que “os 50+ trazem visão estratégica, maturidade e respeito técnico, atributos fundamentais em um setor que exige precisão e conhecimento acumulado”. Para ela, a convivência multigeracional é fonte de aprendizado mútuo e consolida o senso de pertencimento. “Temos um ambiente naturalmente inclusivo, em que a troca é genuína e valorizada.”
A executiva ressalta que o repertório técnico dos profissionais seniores acelera a resolução de problemas e amplia a segurança operacional em projetos complexos. Segundo Andréa, o equilíbrio entre juventude e experiência é o que permite à empresa inovar com consistência. “Essa complementaridade faz parte da nossa identidade e garante que cada entrega una técnica, sensibilidade e propósito.”
Experiência como diferencial competitivo

No Grupo Risotolândia, a inclusão dos 50+ nasceu de um diagnóstico interno. “Percebemos que já éramos naturalmente 50+ e decidimos tornar isso uma estratégia”, afirma Mariana Godoi, gerente de Desenvolvimento Humano e Organizacional. Hoje, 29% do quadro pertence a essa faixa etária.
Segundo Mariana, a convivência intergeracional fortalece o clima organizacional e melhora a satisfação dos clientes. “Profissionais mais experientes contribuem para um ambiente de trabalho acolhedor e colaborativo.” O grupo mantém universidade corporativa e trilhas de aprendizagem acessíveis a todos, sem distinção de idade.
Além disso, a Risotolândia tem apostado em campanhas internas que destacam histórias inspiradoras de colaboradores com mais de 50 anos. “Essas narrativas valorizam a trajetória de quem ajudou a construir a empresa e incentivam os mais jovens a enxergarem o futuro de forma mais ampla”, acrescenta Mariana. A executiva reforça que a valorização dos seniores não é apenas uma política de diversidade, mas um componente essencial da cultura de proximidade que sustenta o negócio.
Diversidade geracional como fator de inovação

Na Amil, o vice-presidente de Pessoas e Segurança, Ricardo Burgos, reforça que a diversidade geracional é fator de inovação. “A idade jamais deve se sobrepor ao valor da trajetória e da competência”, pontua.
A empresa acompanha mensalmente indicadores de faixa etária em um painel de People Analytics, orientando decisões de recrutamento e retenção.
Burgos destaca que, em funções de acolhimento e atendimento, a maturidade gera confiança e empatia. “Profissionais mais velhos trazem serenidade e escuta sensível, essenciais para o cuidado em saúde.”
Para o executivo, o aprendizado entre gerações é uma das forças da organização. “A troca entre jovens e seniores amplia o repertório das equipes e enriquece a cultura de cuidado que norteia a marca”, diz. Ele ressalta que as iniciativas de diversidade etária fazem parte de uma agenda contínua de inclusão. “Não tratamos o tema como projeto pontual, mas como compromisso permanente com o futuro do trabalho.”
Cultura e liderança multigeracional

Na Actionline, a diversidade etária se tornou um pilar de gestão. “Contratar 50+ não é gesto de inclusão, é decisão inteligente de negócio”, afirma Rogério Domingos, diretor executivo.
A empresa reformulou seus processos seletivos para priorizar competências e atitudes, substituindo critérios subjetivos por avaliações estruturadas. Os líderes passam por programas de gestão inclusiva, com foco em comunicação empática e reconhecimento das diferenças. “A convivência entre gerações aumenta a estabilidade das equipes e melhora o clima organizacional”, reforça Domingos.
Na Sodexo, o preparo das lideranças também é prioridade. A companhia mantém treinamentos como o “Espírito de Inclusão” e o programa global “Três Passos para a Inclusão”, que abordam vieses inconscientes e empatia na gestão. “Acreditamos que apenas líderes humanizados podem conectar propósito e performance”, destaca Lilian Rauld.
Para Lilian, a formação de lideranças inclusivas é uma das ferramentas mais eficazes para sustentar a diversidade geracional em empresas de grande porte. Ela garante que o discurso de inclusão se traduz em práticas consistentes e mensuráveis.
Medição e valorização da experiência

Para Fran Winandy, especialista em diversidade etária, o desafio agora é transformar o repertório acumulado em indicador estratégico. Em parceria com Martin Henkel, ela desenvolveu o ROEx – Retorno sobre Repertório Acumulado, métrica que mensura o valor da experiência e do conhecimento ao longo da carreira.
Segundo Fran, a ferramenta permite quantificar atributos como impacto, mentoria e maturidade, tornando tangível o que antes era visto apenas como percepção subjetiva. “Com o ROEx, o RH pode comprovar que profissionais seniores são ativos de alto retorno.”
Ela defende tratar a diversidade etária como investimento estratégico, e não como custo. “A longevidade profissional, quando bem gerida, impulsiona a produtividade e fortalece a cultura corporativa.”
O que é ROEx – Retorno sobre Repertório Acumulado Conceito: métrica criada por Fran Winandy e Martin Henkel para mensurar o valor do conhecimento e da experiência acumulados nas organizações ROEx. Fórmula: ROEx = Impacto + Mentoria + Maturidade, com notas de 1 a 10 em cada pilar. A soma gera índice de 0 a 30 pontos. Aplicação: utilizado em processos seletivos, avaliações anuais ou planos de desenvolvimento para mapear repertório profissional e identificar níveis de contribuição. Finalidade: transformar o intangível em dado concreto para RH e liderança, combatendo o etarismo e valorizando a longevidade como ativo estratégico. |