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Precisamos falar do uso saudável da conexão digital no trabalho

Brasil ainda não tem leis que regulamentem a desconexão dos colaboradores. Empresas brasileiras já usam recursos que evitam exageros no uso de telas

O áudio que chega depois do expediente, a notificação de uma mensagem em pleno fim de semana, o e-mail que aparece na madrugada e a reiterada sensação de morar no trabalho. Essa é a realidade de muitos brasileiros, independente se a atividade é remota, híbrida ou presencial. Enquanto assistimos a uma segunda onda dos programas de saúde mental nas organizações, vem a pergunta: quais são as práticas e estímulos à desconexão digital?

Na Europa, o tema ganhou contornos jurídicos. A França foi o primeiro país a garantir ao trabalhador, em 2017, o direito à desconexão digital. Anos depois, o Parlamento Europeu determinou que todos os estados-membros estabelecessem requisitos mínimos para o trabalho remoto e para os períodos de descanso. A justificativa é que o aumento dos recursos digitais usados para fins laborais resultou em uma cultura “sempre on-line” com impacto negativo na harmonia entre vida profissional e pessoal. Em Portugal a lei que prevê o direito à desconexão digital foi aprovada em 2021.

O Brasil não possui legislação específica, mas esse é um hot topic entre os profissionais de Gente & Gestão. Com a oferta estruturada de assistência em saúde mental e o amadurecimento do uso de indicadores e pesquisas internas, a tarefa da hora é reduzir estressores desnecessários. No caso, da hiperconexão digital, há algumas frentes possíveis para um uso positivo e saudável da tecnologia.

A organização deve dar o primeiro passo com o estabelecimento de um protocolo de desconexão digital. Esse tipo de documento ancora o compromisso da empresa com o bem-estar de sua equipe, regulamenta o não envio de comunicações em horário de repouso e define eventuais exceções. Cabe destacar que a rápida interrupção para leitura de uma mensagem vinda do trabalho nas horas livres pode provocar prejuízo no repouso e ainda se configurar como estressor, visto que provavelmente será uma demanda.

A expectativa de um protocolo é que se converta em comportamentos e, adiante, constitua uma cultura. O sucesso, nesse caso, está diretamente relacionado ao alinhamento da liderança. As organizações devem iniciar, com seus líderes, um programa de literacia em digital wellness, sobre o uso positivo e saudável das telas. Com sensibilização, educação e mudança pessoal, os gestores serão capazes de acelerar a mudança por toda a companhia.

Vale também lançar mão de nudges – pequenos estímulos que não restringem as escolhas individuais, mas favorecem uma boa tomada de decisão. Estudos científicos têm mostrado resultados positivos com uso de nudges para redução do consumo de telas. Quando, por exemplo, o sistema sinaliza que uma reunião on-line está sendo agendada numa “sexta-feira sem reuniões” este é o empurrãozinho que muitos precisam para adotar um novo comportamento.

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Carla Furtado

Mestre e Doutoranda em Psicologia (Universidade Católica de Brasília/UCB). Especialista em Neurociência e Comportamento (PUCRS). Docente de Pós-Graduação na PUCRS e do Instituto de Ensino e Pesquisa Hospital Albert Einstein. Autora do livro Feliciência: Felicidade e Trabalho na Era da Complexidade (Almedina). Diretora do Instituto Feliciência, com operações no Brasil e em Portugal.