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Demissão por recusa à vacina e a polêmica nas relações trabalhistas

Empregadores poderiam exigir dos colaboradores o comprovante de imunização, sob o risco de eles serem demitidos?

de Humberto Hansen e João Galvão em 15 de outubro de 2021

As relações de trabalho sofreram uma grande transformação no último ano. Certamente, a maior delas foi a implantação do modelo remoto. Aqui no Brasil, centenas de empresas aderiram ao home office de forma definitiva; outras optaram por fazer o “o caminho de volta”, mas em um modelo híbrido, com a presença intercalada no ambiente coletivo. E é justamente aí que surgem questões que precisam ser observadas, principalmente diante do momento excepcional de crise sanitária. A mais polêmica de todas, sem dúvidas, é a obrigatoriedade da vacinação contra a covid-19. Os empregadores, nesse caso, poderiam exigir dos colaboradores o comprovante de imunização, sob o risco de eles serem demitidos? Trata-se de uma questão polêmica e que vem rendendo um debate bastante intenso no meio jurídico.

O que orienta o MPT e o STF

De acordo com o guia técnico emitido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), ratificado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a orientação é para que as empresas invistam na conscientização. Também é observado nesse guia que a recusa injustificada à vacina pode acarretar sanções graves aos colaboradores, em último caso até mesmo o desligamento por justa causa, uma vez que ninguém teria a prerrogativa de colocar em risco a saúde dos demais colaboradores.

À luz da Constituição Federal, não há direito fundamental absoluto, assim, em certas situações, os direitos individuais de liberdade, vida privada e intimidade podem ser limitados em prol do bem-estar coletivo, assim como o inverso. Tudo isso deve ser analisado conforme o caso concreto.

No caso da exigência de vacinação há um nítido confronto de direitos fundamentais, pois ao mesmo tempo que existem direitos individuais da liberdade, da vida privada, da intimidade, há o direito coletivo de proteção à saúde, de solidariedade e da cooperação. Neste cenário de convívio presencial, em condições normais o direito coletivo de proteção à saúde e bem-estar da coletividade deve se sobrepor aos direitos individuais mencionados. Afinal, de nada servirão os avanços da medicina na pesquisa e o desenvolvimento de novas vacinas se não houver uma adesão da sociedade às campanhas de vacinação. Ou seja, quando um trabalhador se recusa a ser imunizado para retornar ao regime presencial, está colocando em risco todo o ambiente de trabalho. E isso é o que vem sendo entendido pela Justiça.

Direito individual x direito coletivo

Em condições normais, pelo respeito à solidariedade, o objetivo da República inscrito no artigo 3º da Carta Magna, e da proteção da saúde da coletividade, aplica-se à compulsoriedade na vacinação, sendo que a recusa injustificada poderá acarretar até mesmo em dispensa por justa causa. Os tribunais já se posicionaram neste sentido, sobretudo quando os empregadores conscientizam os colaboradores e, mesmo assim, permanece a recusa na vacinação. Importante ressaltar que as demissões devem ocorrer apenas como última alternativa, depois de reiteradas tentativas de convencimento por parte do empregador da importância da imunização e do impacto deste ato no ambiente de trabalho e da aplicação de outras sanções.

Mas há ressalvas em que o direito individual da liberdade em não vacinar prevalece, como em relação a grávidas ou portadores de doenças que impossibilitem a imunização em determinado momento. Nesses casos, o diálogo, o bom senso e a razoabilidade precisam ser levados ainda mais em conta.

Outra questão a ser levantada é em relação às empresas que permanecem no teletrabalho. Poderiam elas exigir a vacinação do colaborador? Apesar de a solução mais conservadora ser a não exigência da vacinação, por não lesar diretamente o ambiente de trabalho, a Justiça pode entender que o tomador de serviços pode sofrer danos indiretos, como, por exemplo, à sinistralidade dos planos de saúde, o pagamento dos primeiros quinze dias de afastamento do empregado e o prejuízo com sua ausência nos dias posteriores. No entanto, essa é uma questão mais complexa e ainda sem um consenso jurídico.

Por outro lado, vale destacar que o empregador, ao exigir o retorno ao trabalho presencial, também deve cumprir alguns requisitos, previstos no artigo 75 – C, §2º da CLT, como o registro de um aditivo contratual, a concessão de 15 dias para que o colaborador se adapte à nova rotina, bem como garantir que a mudança não vá lesar a sua saúde.

Vacine-se. Por você, pelos seus. Por todos.


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Humberto Hansen e João Galvão

Humberto Hansen e João Galvão são bacharéis em Direito e especialistas em Direito Trabalhista do escritório SFCB Advogados