De um lado, uma empresa em um setor bem conhecido do público feminino, ao abranger produtos injetáveis e equipamentos para estética. De outro, um segmento desafiador para a inclusão de mulheres, em uma indústria pesada, líder na fabricação de pás eólicas na América Latina. Os problemas e soluções na gestão de pessoas em ambos os casos são distintos, mas refletem a trajetória de líderes mulheres no RH e ações diuturnas para equiparar os gêneros na organização, entre outras ações necessárias a um RH estratégico e a adaptação aos novos modelos de trabalho.

Mariana Fonseca, Human Resources & Communication Director Latam da Merz Aesthetics, e Lucimeyre Albuquere, Gerente de Recursos Humanos da Aeris Energy contam os obstáculos setoriais, internacionais, locais e organizacionais para operar nas empresas em que atuam.

De vendas a recursos humanos e comunicação

Mariana iniciou a sua carreira na Merz em 2016, como Human Resources Coordinator no Brasil, e hoje ocupa o cargo de Human Resources & Communication Director Latam. A executiva conta com 20 anos de experiência na indústria farmacêutica e consultoria, passando pela área de vendas e tendo ocupado cargos em empresas como Bristol-Myers Squibb, STERIS e Michael Page. Mariana estudou Administração de Empresas na FAAP, em São Paulo, e concluiu cursos de extensão em Negociação e Gestão Financeira pela São Paulo Business School e em Marketing pela ESPM.

Como líder, suas realizações incluem a implementação do processo de gestão de talentos, adaptações do pacote de compensação e benefícios e implementação da página do LinkedIn, que teve um crescimento expressivo no número de seguidores e hoje tem uma das maiores taxas de engajamento em comparação com empresas concorrentes.

“Hoje a companhia já possui 70% de sua liderança distribuída entre o público feminino no Brasil”, comemora Mariana. Na América Latina, o percentual está em aproximadamente 40%, a caminho da equiparação com o público masculino. São líderes que, como a executiva, foram formados internamente, sob ações específicas da gestão de pessoas e grande sensibilização para a diversidade – o que segue a cargo de Mariana promover. O desenvolvimento do time passa também por conteúdos elaborados por Harvard, Franklin Covey, entre outras grandes marcas de educação corporativa, entre programas que são um orgulho para a equipe.

Mas não adiantam treinamentos, sem recrutamento inclusivo: “na porta de entrada, tem que selecionar todo mundo da mesma forma”, entende a executiva. Prática que ela acredita ser necessária e estratégica ao negócio e à estruturação de políticas ESG na companhia. No transcorrer da jornada de homens e mulheres, ela explica, hoje o desafio ainda é consolidar o modelo de trabalho e fortalecer o engajamento – e as soluções são regionais, em nível global são tratadas questões de base para a agilidade do RH e da empresa, processos de automação, sistemas, entre outros.

“Não achei ainda a fórmula certa. Não sei se as empresas acharam. A gente está trabalhando no modelo híbrido. E aí vem muito questionamento, porque a gente comprovou, sim, que pode ser produtivo em casa”, confessa a executiva. “Porém, o que eu acho que essa volta traz é uma aderência à cultura da empresa, porque a gente também contratou muita gente nova. E a cultura da empresa você não consegue passar cem por cento o que ela é de forma on-line”, entende Mariana. E em se tratando de cultura, é preciso considerar a diversidade como um grande valor a ser disseminado, sem barreiras.

A Merz Aesthetics é conhecida por produtos injetáveis, equipamentos e produtos para a pele líderes na categoria. Com sede nos Estados Unidos, a Merz Aesthetics possui aproximadamente 1.500 funcionários em 24 países em todo o mundo e faz parte de uma empresa familiar desde 1908. Na América Latina, as filiais estão na Argentina, Brasil, Colômbia e México e somam aproximadamente 400 colaboradores.

“Nosso desafio é regional”

Lucimeyre possui mais de 20 anos de experiência em RH em empresas nacionais e multinacionais de grande porte. A executiva tem conhecimento em áreas como desenvolvimento e formação de lideranças, performance, carreira, sucessão, transformação cultural, gestão de engajamento, formação de jovens talentos, atração, comunicação, responsabilidade social e remuneração.

Na Aeris, ajudou na liderança do projeto de transformação cultural, na estruturação de modelo de atração para processos seletivos, implantação de programas de desenvolvimento, execução em melhorias na gestão, gestão de engajamento, implantação de políticas de Diversidade e Inclusão, entre outras ações.

A companhia possui atualmente mais de 5 mil colaboradores, que atuam na sede administrativa e em duas plantas localizadas no Complexo Industrial e Portuário do Pecém, no município de Caucaia/CE. Sua localização estratégica facilita não apenas o recebimento de insumos, mas amplia a competitividade nas exportações, que em 2021 foram responsáveis por cerca de 25% de toda a receita líquida da empresa.

Com um portfólio que inclui grandes empresas multinacionais fabricantes de aerogeradores, a Aeris Energy atua sob o conceito Built-to-spec – produção voltada a atender as necessidades técnicas específicas de seus clientes, desenvolvendo o estado da arte em processos de produção. Por meio da divisão Aeris Service, a empresa também presta serviços de manutenção e reparo para todos os modelos de pás e torres eólicas no Brasil e nos Estados Unidos.

Trata-se e uma empresa que nasce sustentável, pela natureza do negócio, e que hoje conquistou o índice B3 na Bolsa de Valores, sob forte comprometimento com sua estratégia ESG (Environmental, Social, Governance – Meio Ambiente, Social e Governança, em livre tradução). O S da sigla, na companhia, contém a missão fortalecer presença da mulher desde a porta de entrada.

“Na seleção, temos um time com metas para atrair representantes femininos. Numa condição de empate técnico, a opção é sempre pela mulher”, relata Lucimeyre. “No início, chegamos a vivenciar perguntas como ‘Quem vai ficar com os filhos quando você for trabalhar?’ durante processos de recrutamento. Hoje isso não existe mais.”

A organização, como parte de seu processo de transformação cultural, vem desenvolvendo ações de sensibilização e letramento para combater a discriminação e outras para reter talentos femininos desde 2021. “Principalmente entre lideranças, que também passam por esse processo de letramento e com quem são compartilhadas claramente as metas de equidade e inclusão na companhia”, ressalta Lucimeyre.

A executiva conta sobre o programa Delas, que desenvolve futuras líderes. “Hoje construímos um banco de lideranças femininas”, ela enumera, entre outras ações que ajudam na retenção e desenvolvimento de talentos femininos, como outro programa, desta vez na área da saúde, com um centro interno de acompanhamento que assiste as colaboradoras gestantes. “É muito importante esse cuidado, principalmente pela região em que estamos, distante dos centros de saúde com uma base de colaboradores 90% operacional, vinda muitas vezes de áreas vulneráveis”.

Com esses movimentos a empresa conseguiu aumentar 30% o percentual de mulheres, comemora Lucymeire. Mas não sem desafios. Hoje, para aumentar o quadro feminino de lideranças, mesmo com as ações internas, as contratações afirmativas são ainda essenciais, assim como para aumentar a equidade entre homens e mulheres na empresa em geral.

Quando perguntada sobre os próximos passos para avançar, ela responde, descrevendo o cenário que circunda a organização: Nordeste adentro, sem grandes centros próximos de formação técnica, lugar de tradição patriarcal. “Nosso desafio é regional, não temos barreiras internas para a inclusão”, ela afirma. E convida mulheres que possívelmente tenham o perfil para a indústria em que atua e estejam dispostas a mudar de cidade para acompanhar e empresa.